Joaquim Azevedo critica "evidente desinteresse" pelos professores
O investigador Joaquim Azevedo considera que existe "um evidente desinteresse" por parte da elite dirigente com o futuro do país e com a qualidade da educação da população, referindo que os professores nunca foram alvo de políticas de valorização.
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País Educação
"Nunca houve (...) desde o 25 de Abril e ao longo do processo de democratização da educação, qualquer momento em que os professores tivessem sido alvo preferencial de políticas governamentais, com medidas articuladas e profundas de dignificação, reestruturação e valorização pública da sua atividade profissional", escreve o ex-secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário (1992-1993) num estudo hoje divulgado.
Ao comentar os resultados de um inquérito que coordenou sobre 'As Preocupações e Motivações dos Professores Portugueses', o académico chama ainda a atenção para a necessidade de rejuvenescimento do corpo docente.
"Os professores, como grupo profissional, estão envelhecidos". Apenas 1,4 por cento tem menos de 30 anos e em 10 anos (entre 2004-2005 e 2014-2015) deixaram o sistema 42.165 professores.
O fenómeno tem várias causas: diminuição da natalidade, que se sentiu especialmente no ensino básico, encerramento de escolas com menos de 25 alunos, criação de grandes agrupamentos, aumento do número de alunos por turma e aumento da idade da reforma.
Joaquim Azevedo nota também que os professores, à semelhança dos restantes trabalhadores do Estado, sofreram cortes salariais e congelamentos na carreira, passaram a trabalhar mais horas desde 2008, havendo "uma ocupação sistemática" de boa parte da chamada componente letiva do horário de trabalho com tarefas escolares.
"Com mais de um terço dos professores a querer ir-se embora da atividade letiva, com mais de um em cada três professores a dizer-se exausto e desiludido, com um em cada três a assinalar que os professores estão desmotivados para ensinar...estamos à espera de quê", questiona o especialista em Ciências da Educação.
Joaquim Azevedo, que integra o Conselho Nacional de Educação, diz que a escola precisa de tempo: "É preciso parar, contemplar".
O professor cita estudos recentes sobre a exaustão dos professor e o livro "A Sociedade do Cansaço", do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, para defender que a escola tem de aprender a travar, "se quiser ter algum impacto cultural profundo sobre os cidadãos e a sua liberdade e compromisso solidário".
"Sem contemplação não há cultura", escreve Joaquim Azevedo citando Han e acrescentando, por seu lado, que é preciso "devolver o espanto aos professores".
O investigador observa também que o tempo das aprendizagens "não é compatível" com o tempo das tecnologias "(por mais que as queiram incorporar dentro da escola)", o tempo da educação "não é o tempo da política ou da economia".
"Esta dessincronização sistémica", afirma, deve ser "desvendada e trazida para o espaço público, como estratégia de salvaguarda do papel cultural da educação, como caminho para a insubordinação educacional, face à subordinação escolar, seja ao tempo das tecnologias, seja ao tempo da economia e da política", lê-se no relatório que acompanha o estudo.
O inquérito foi desenvolvido pela Fundação Manuel Leão, responsável pelo lançamento em Portugal, há 15 anos, do "único modelo impendente de avaliação externa de escolas", o programa AVES, que contempla vários questionários aos intervenientes no processo educativo, de acordo com a nota enviada aos jornalistas.
Os questionários foram endereçados às escolas em maio, junho e julho, tendo sido consideradas 2.910 respostas válidas, num universo de 130 estabelecimentos de ensino do setor público e privado.
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