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Sánchez volta a desconcertar Espanha e promete "novo parágrafo". O enredo

O socialista Pedro Sánchez avisou na quarta-feira que ponderava demitir-se do cargo de primeiro-ministro de Espanha e hoje revelou que ia continuar à frente do Governo, mas com um "ponto e parágrafo" que não explicou.

Sánchez volta a desconcertar Espanha e promete "novo parágrafo". O enredo
Notícias ao Minuto

18:48 - 29/04/24 por Lusa

Mundo Espanha

Sánchez, de 52 anos, primeiro-ministro desde 2018 e também líder do Partido Socialista de Espanha (PSOE) deixou o país desconcertado por duas vezes nestes últimos cinco dias.

Primeiro, com o aviso de que ponderava demitir-se e que ia refletir durante cinco dias. Depois, com uma declaração hoje em que, quando tudo indicava que ia mesmo sair, acabou a dizer que afinal ficava.

"Esta decisão não é um ponto final. É um ponto e parágrafo, garanto. Por isso assumo o meu compromisso de trabalhar sem descanso, com firmeza e serenidade, pela regeneração pendente da nossa democracia e pelo avanço e a consolidação de direitos e de liberdades", afirmou, sem concretizar mais.

Na quarta-feira passada, Sánchez justificou estar a ponderar demitir-se por estar a ser há anos, ele próprio e a família, vítima de ataques pessoais, campanhas de desinformação e mentiras de setores radicais, alimentados e aproveitados pelos partidos de direita e extrema-direita (Partido Popular e Vox).

Hoje, apelou à reflexão coletiva sobre a "degradação da vida pública" em Espanha e à mobilização social "pela dignidade", contra "a política da vergonha", as "práticas tóxicas" e "o lodo" que "coloniza impunemente" a política.

Sánchez somou assim mais um episódio a uma carreira política marcada por aquilo que os espanhóis designam como "golpes de efeito" ou "mudanças no guião", decisões desconcertantes, inéditas e inesperadas com que surpreende adversários e apoiantes e com as quais tem conseguido chamar à mobilização das hostes e reposicionar o debate político e até as sondagens a seu favor.

Hoje assegurou que não houve "nenhum cálculo político" nos anúncios dos últimos dias, mas os críticos e adversários desconfiam, dado o desfecho aparentemente vazio da tensão e 'suspense' em que manteve Espanha desde quarta-feira.

Foi o que expressaram os partidos independentistas da Catalunha que lhe viabilizaram o último Governo, em novembro passado, e que hoje o acusaram de fazer uma manobra política em plena campanha para as autonómicas de 12 de maio.

Sánchez usou "de forma partidária" a "solidariedade perante ataques da extrema-direita" que lhe manifestaram vários partidos, disse o dirigente da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) e recandidato a presidente do governo regional Pere Aragonès.

A ERC foi um dos partidos que se solidarizou com Sánchez e garantiu que votaria a favor de uma moção de confiança se o primeiro-ministro avançasse com essa iniciativa. Isto em plena campanha para umas eleições em que tem nos socialistas o maior concorrente.

Mas hoje Sánchez não avançou com a demissão nem com a moção de confiança e fez aquilo que ninguém esperava: um simples anúncio de que tinha decidido continuar onde está.

"Estou perplexo", confessou o politólogo Pablo Simón, na televisão La Sexta, assim que Sánchez acabou de falar.

"Disse basicamente que esteve cinco dias a meditar sobre uma decisão pessoal, num processo de reflexão que podia ter feito sem submeter o país à tensão institucional que viveu nos últimos cinco dias", acrescentou Pablo Simón, que disse que esperava, pelo menos, o anúncio de uma moção de censura e admitiu que o primeiro-ministro pode ter ferido hoje a sua credibilidade.

Críticos e analistas lembram que Sánchez intitulou a sua autobiografia "Manual de Resistência" e é um homem com, pelo menos, fama e imagem de implacável e calculista.

Sublinham, por isso, "o ponto e parágrafo" do discurso de hoje e consideram que é preciso esperar para ver o que se segue.

Para a também politóloga Cristina Monge, que falou em diversos meios de comunicação durante a manhã, falta conhecer o "plano de regeneração da democracia" que Sánchez referiu para "dar sentido" e "entender bem" o que aconteceu em Espanha nos últimos cinco dias.

O currículo político de Sánchez é, até hoje, o de um sobrevivente, muitas vezes, contra todas as expectativas.

Nascido em Madrid, é doutorado em Economia e fez os estudos superiores na capital espanhola e em Bruxelas. Foi professor universitário e assessor no Parlamento Europeu e integrou o gabinete do alto representante das Nações Unidas na Bósnia durante a guerra no Kosovo.

É filiado no PSOE desde 1993 e tornou-se deputado pela primeira vez em 2009, depois de ter sido vereador em Madrid.

Chegou a líder do PSOE em 2014 e perdeu por duas vezes eleições, com os piores resultados que o partido teve na história da democracia espanhola instaurada em 1978.

O partido expulsou-o da liderança em 2016 e chegou a ser dado como morto politicamente, mas regressou ao cargo em maio de 2017, numa candidatura contra o aparelho e os barões do PSOE.

Em junho de 2018 tornou-se primeiro-ministro sem ir a eleições ao fazer aprovar a primeira moção de censura na história de Espanha.

Venceu duas eleições em 2019 e acabou a liderar o primeiro Governo de coligação da democracia espanhola, com a plataforma de extrema-esquerda Unidas Podemos.

O executivo foi viabilizado por partidos independentistas catalães e bascos, o que lhe vale reiteradas e duras acusações de negociar e fazer acordos com "inimigos de Espanha" só para se manter no poder.

Chegou às eleições do ano passado desgastado com estas críticas e com cinco anos de Governo que coincidiram com a pandemia de covid-19 e a guerra na Ucrânia. Não ganhou as legislativas, mas voltou a conquistar o Governo com o apoio de uma gerigonça de oito partidos de esquerda e de direita, independentistas e nacionalistas.

O preço do último Governo incluiu uma amnistia para separatistas catalães que sempre tinha rejeitado. A fatura parece prestes a chegar, mas aos adversários: as sondagens dão a vitória aos socialistas na Catalunha em 12 de maio e a possibilidade de voltarem a governar a região após 14 anos consecutivos de executivos independentistas e nacionalistas.

Leia Também: "Uma comédia". Independentistas acusam Sánchez de "manobra política"

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