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Senegal falha no combate a abusos e exploração de crianças "talibé"

O Senegal está a falhar na proteção de milhares de crianças vítimas de abusos nas escolas corânicas do país, segundo um relatório divulgado hoje e que propõe um roteiro para acabar com a exploração a que são sujeitas.

Senegal falha no combate a abusos e exploração de crianças "talibé"
Notícias ao Minuto

10:25 - 16/12/19 por Lusa

Mundo Senegal

O relatório "Estas crianças não pertencem às ruas: roteiro para acabar com o abuso e exploração dos 'talibé' no Senegal" defende que o Governo do Senegal não foi "suficientemente longe no combate aos abusos crónicos e generalizados, à exploração e à negligência" que afeta milhares de crianças que vivem em escolas corânicas (daaras) em todo o país.

O documento da organização Human Rights Watch e da Plataforma senegalesa para a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos (PPDH) tem por base um outro, divulgado em junho, e que concluiu que mais de 100 mil rapazes entre os 05 e os 15 anos continuam sujeitos à mendicidade forçada, castigos físicos, abusos sexuais e negligência no Senegal.

O novo relatório, de 84 páginas, analisa a política do Governo senegalês, os programas e os esforços judiciais feitos entre 2017 e 2019 para acabar com esses abusos.

"As crianças 'talibé' têm sido aberta e tragicamente negligenciadas, exploradas e abusadas e o Governo simplesmente não fez o suficiente para impedi-lo", disse Corinne Dufka, diretora adjunta da Human Rights Watch para África.

Durante a investigação, que decorreu em 2018 e 2019, a Human Rights Watch e a PPDH estiveram em quatro regiões do Senegal, visitaram 22 'daaras' e 13 abrigos para crianças e entrevistaram mais de 150 pessoas, incluindo crianças 'talibé', professores do Alcorão, assistentes sociais, especialistas em proteção infantil, polícias, funcionários judiciais, do Governo e das Nações Unidas.

Em novembro, circularam nas redes sociais várias fotografias de crianças acorrentadas na região de Louga, suscitando a condenação generalizada de ativistas de direitos das crianças, que sublinharam a urgência de o Governo agir para acabar com estes abusos.

"Este é apenas o mais recente de muitos casos de tratamento desumano de crianças 'talibé' nos últimos anos", disse Mamadou Wane, presidente da PPDH.

"O Estado precisa cumprir a sua responsabilidade de proteger essas crianças, regular as 'daaras' e acabar com esses abusos inconscientes", acrescentou.

O roteiro agora proposto pelas organizações ao Governo estabelece como prioritário o reforço dos programas de combate à mendicidade infantil, a regulamentação e apoio às 'daaras', o alargamento da proteção a crianças com poucos recursos, a repressão do tráfico de crianças por professores do Alcorão e a atuação prioritária da justiça para estes casos.

A HRW lembrou que há mais de uma década vem documentando os abusos contra crianças nas escolas corânicas, lamentando "a lentidão" dos progressos.

Ainda assim reconhece que existe uma "tendência positiva" no sentido do cumprimento da legislação nacional em casos envolvendo professores do Alcorão, outrora considerados "intocáveis" devido à sua grande influência social.

Pelo menos 29 professores ou assistentes foram acusados por abusos contra crianças, entre 2017 e 2019, resultando em pelo menos 25 condenações, incluindo oito por tráfico de pessoas.

No entanto, este número é considerado pequeno pela HRW tendo em conta a natureza generalizada dos abusos.

Falta de denúncia por parte da polícia ou das assistentes sociais e de queixa das famílias, acesso limitado a assistência jurídica e pressão pública para a retirada das acusações contra os professores foram alguns dos obstáculos identificados no combate a estes abusos.

Segundo as duas organizações, o programa do Governo para retirar as crianças da mendicidade foi aplicado apenas em Dacar e não teve qualquer impacto duradouro, enquanto a reestruturação e modernização das escolas corânicas continua muito limitada.

Documentada foi igualmente a "falta crítica" de recursos nos serviços de proteção às crianças, responsáveis por lidar com centenas de casos de fugitivos e vítimas de abuso a cada ano.

"Para abordar as muitas questões que impedem as crianças 'talibé" de aceder à educação, cuidados de saúde e proteção contra abuso, negligência e exploração, o Governo senegalês precisa se comprometer com uma estratégia abrangente e multifacetada", defenderam

O relatório divulgado em junho reportava a 2017 e 2018 e denunciava "níveis alarmantes" de maus tratos físicos, abusos sexuais, negligência e mendicidade forçada, tendo sido documentada a morte de 16 crianças.

A situação das crianças "talibé" no Senegal tinha já sido denunciada pela HRW num outro relatório, em 2010, em que a organização instava o Governo a regulamentar as 'daaras', mas volvidos estes anos a situação pouco ou nada se alterou.

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