O pai de uma das crianças que foram referidadas no vídeo partilhado por Rita Matias nas redes sociais, onde surge a citar os nomes de crianças que constavam na "lista de alunos de uma escola", afirmou que tem "intenção" de apresentar queixa contra a deputada do Chega.
"Eu vou falar com um advogado para me informar sobre que leis foram quebradas, mas a minha intenção é prestar uma queixa contra a deputada Rita Matias”, referiu o pai da criança, uma menina de quatro anos, em entrevista ao Diário de Notícias.
Ao mesmo meio, o pai da menina contou que está em Portugal desde 2019 e que viu com preocupação o nome da filha surgir na lista divulgada. Acrescentou também que a criança ainda não é aluna da escola, mas sim candidata a frequentar o estabelecimento de ensino.
“Senti-me muito triste e com medo, principalmente pela segurança da minha filha”, revelou, notando ainda que leu em diversas notícias que os nomes estariam a circular "em grupos de extrema direita".
De notar também que o pai da menina de quatro anos falou com o diretor da escola onde a filha foi matriculada, que garantiu não haver preferências por alunos imigrantes, contrariando as afirmações do partido Chega.
“Nunca imaginei que isso poderia acontecer com a minha filha. Somos imigrantes e sei que somos um alvo, que podemos sofrer xenofobia, mas nunca imaginei que iria atingir-nos tão diretamente”, afirmou.
Recorde o que aconteceu
Na sexta-feira passada, dia 4 de julho, a deputada do Chega, Rita Matias, partilhou na rede social X (antigo Twitter) um vídeo onde enumerou nomes de várias crianças que constavam numa "lista de alunos de uma escola portuguesa". No entanto, este episódio acabou por tomar outras proporções quando o presidente do partido, André Ventura, citou os nomes durante uma ação parlamentar, levando ao repúdio por parte das bancadas de Esquerda.
"Estes senhores são zero portugueses e são culpa vossa que hoje as escolas sejam isto", atirou, na altura.
Já na segunda-feira, André Ventura, reforçou que em Portugal se debate com um problema de inversão demográfica, tendo alegado não ser possível encontrar "um André, um João, uma Maria" entre as listas de alunos de uma escola
"Quando olhamos para os nomes numa escola e não conseguimos encontrar um André, um João, uma Maria, uma Joana, um Pedro, há um problema. Significa que está a haver uma inversão demográfica", disse André Ventura, na sua intervenção na apresentação dos candidatos autárquicos do Chega ao distrito de Coimbra.
As reações ao sucedido na Assembleia da República não tardaram a surgir. Por exemplo, o candidato à Câmara do Porto pelo PSD e ex-ministro dos Assuntos Parlamentares, confessou ter ficado "chocado com a falta de empatia" demonstrada pelos deputados do Chega e caracterizou a situação como “muito grave”.
Também a candidata à Câmara de Lisboa pelo PS, Alexandra Leitão, apontou que o episódio ultrapassou "o que é aceitável numa democracia".
Já a deputada socialista Isabel Moreira criticou o Chega, tendo defendido que “todas as crianças que tenham os nomes invocados estão mais inseguras”.
O Livre rejeitou aceitar “divisões” e argumentou que “um nome não é um rótulo”. “É o que nos aproxima uns dos outros, e nunca pode servir para o discurso de ódio. Portugal é de todas as pessoas. Com todos os nomes”, escreveu, no X.
Por sua vez, o PAN denunciou que “seja em casa, nas ruas ou nas escolas, nem as crianças fogem ao preconceito e discurso de ódio do Chega”. Já a coordenadora do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, considerou também que “atacar quem veio para Portugal trabalhar é oportunismo, mas atacar as crianças é um ato de desumanização, que ataca a nossa Constituição e os seus valores”.
De recordar que as propostas de lei do Governo de alteração aos diplomas da nacionalidade e da imigração baixaram na sexta-feira à fase de especialidade sem serem votadas na generalidade, bem como projetos-lei do Chega sobre as mesmas matérias.
Os requerimentos apresentados pelo Governo e pelo partido Chega foram incluídos no guião de votações substituído, disponibilizado a meio da manhã - não constando da primeira versão de quinta-feira - e foram aprovados em plenário com votos contra do BE e do PCP.
A proposta de lei do Governo de alteração ao diploma da nacionalidade, que será agora discutida em comissão, quer aumentar o período de permanência em Portugal exigido para a obtenção da cidadania (de cinco para sete ou 10 anos, consoante se trate de cidadãos lusófonos ou não lusófonos).
O Governo prevê, ainda, a possibilidade da perda da nacionalidade para os naturalizados há menos de 10 anos e sejam condenados a pena de prisão efetiva igual ou superior a 5 anos pela prática de crimes graves. Quanto à atribuição de nacionalidade originária a descendentes de estrangeiros residentes em Portugal, passa a exigir-se a residência legal durante o período de três anos.
O projeto-lei do Chega, que também passou à especialidade, propõe "a perda da nacionalidade adquirida por naturalização ou quando tenham dupla nacionalidade, nos casos em que o indivíduo pratique atos que atentem gravemente contra a soberania, a segurança nacional ou os princípios essenciais do Estado de Direito".
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