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'Operação Condor' continua ativa e "é necessário cortar-lhe as asas"

O ativista dos direitos humanos no Paraguai, Martín Almada, disse em entrevista à Lusa que a América Latina permanece sob a ameaça da 'Operação Condor', o plano desencadeado nos anos 1970 e 1980 para silenciar as oposições às ditaduras.

'Operação Condor' continua ativa e "é necessário cortar-lhe as asas"
Notícias ao Minuto

10:50 - 18/12/15 por Lusa

Mundo Paraguai

"Ainda não há consciência sobre o que se passou e o que está a acontecer hoje. Por exemplo, o derrube do presidente Fernando Lugo no Paraguai, [em 2012], foi um Condor com cheiro a dólares. E nas Honduras, [o derrube do presidente Manuel Zelaya, em 2009] foi um típico Condor, uma intervenção norte-americana, como tinha sucedido no Chile", referiu numa entrevista telefónica a partir de Assunção, a capital paraguaia.

Martín Almada, 78 anos, doutorado em Pedagogia e advogado, recebeu em 2002 o 'prémio Nobel Alternativo da Paz' atribuído pela fundação Right Livelihood pelas suas investigações em torno da designada Operação Condor.

Hoje, no Museu das Memórias em Assunção decorre uma celebração que recorda o 40.º aniversário da oficialização deste "pacto", firmado no Chile em 25 de novembro de 1975 entre ditaduras latino-americanas, e o 23.º aniversário da descoberta do "Arquivo do Terror", a união do esquema repressivo entre Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia.

A iniciativa é organizada pela Fundação Celestina Pérez de Almada, em homenagem à sua mulher, que faleceu de um enfarte em 1974 quando escutava por telefone as torturas a que o seu marido estava a ser sujeito.

O ativista e ex-preso político continua atualmente a alertar sobre a vigência atual deste "pacto" entre diversos setores da elite sul-americana, incluindo o setor militar.

"A Operação Condor era destinada a calar toda a voz que contestasse a imposição do modelo neoliberal, de concentração da riqueza. Isso foi a operação Condor, que passou por várias etapas. Designo a primeira etapa por 'pré-Condor', em 1964, quando o Presidente João Goulart foi derrubado no Brasil [por um golpe militar]. Aí começaram os assassinatos, mas foi uma delação eminentemente bilateral, um Condor bilateral, Brasil-Argentina, Brasil-Bolívia, Brasil-Chile", assinala.

A segunda "etapa" é já definida como "multilateral", na sequência do acordo estabelecido em 25 de novembro de 1975 em Santiago do Chile, durante a ditadura do general Pinochet, e que envolveu ainda os regimes da Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai e Bolívia, e esporadicamente Peru, Colômbia, Venezuela e Equador, com a participação dos Estados Unidos.

"Mas atualmente o Condor é global, funciona através da conferência dos exércitos das américas. Assim, passou três etapas, bilateral, multilateral, e hoje global".

E especifica: "É global no sentido em que envolve a maioria dos países da América Latina, à exceção de Cuba, Venezuela, Bolívia, Argentina e Nicarágua".

Martín Almada diz que o atual plano Condor foi descoberto através de um documento secreto militar, no qual se solicitava em 1997 que fossem elaboradas "listas de subversivos" na América Latina.

"Agora estamos a seguir os passos do Condor, que designamos por Condor II", assinalou, sugerindo que esta operação nunca terá sido de facto interrompida.

A descoberta dos designados "Arquivos do terror" no Paraguai, em 1992, no que designa por "ninho do Condor", constituiu um passo decisivo para a denúncia destes abusos dos direitos humanos.

"Quando abrimos os documentos em Assunção, encontrámos 700.000 folhas. No total da região, entre 1975 e 1985, calculamos que foram liquidadas cerca de 100.000 pessoas, nos seis ou sete países, porque o último país que entrou oficialmente [na operação Condor] foi o Equador".

O ativista compara o balanço desta operação "por ordem de Henry Kissinger [o então secretário de Estado norte-americano] " ao "lançamento de uma bomba atómica", pelo facto de o número de vítimas ser semelhante às registadas em Hiroxima e Nagasaki.

"Os Estados Unidos lançaram uma bomba atómica no Cone Sul da América Latina, e as pessoas ainda não têm consciência, julgam que o Condor terminou com Pinochet. Não há consciência sobre o que se passou e o que está a acontecer, mas para nós o Condor continua ainda hoje a voar".

Um "voo" que, sustentou, está relacionado com os derrubes dos ex-presidentes das Honduras, em 2009, e do Paraguai, em 2012. E inclusive com os recentes desenvolvimentos na Argentina, Brasil ou Venezuela.

"Posso dizer que o século XXI é o século onde se assinaram os acordos mais importantes sobre direitos humanos, e em simultâneo o século onde mais se violam os direitos humanos", disse.

E conclui: "É necessário cortar as asas ao Condor, que voa muito alto, para que a América Latina seja um território de paz. Depende da mobilização e organização das pessoas. Depende de nós. Porque na natureza não existe nada de definitivo, absoluto, fechado, exceto a mudança".

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