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Longos protestos contra o colapso económico que juntam inimigos políticos

Na manhã de quinta-feira, rodeados por numeroso dispositivo da polícia de intervenção, algumas centenas de pessoas regressaram à Praça Maidan, centro de Kiev, em protesto contra a situação económica e o aumento dos impostos.

Longos protestos contra o colapso económico que juntam inimigos políticos
Notícias ao Minuto

11:09 - 18/02/22 por Lusa

Mundo Ucrânia

Num dia com um tímido sol a despontar, quatro graus positivos e vento persistente que depois trouxe chuva, a pequena multidão, com bandeiras brancas e a frase "Salvem a Ucrânia", lema do movimento, foi forçada a dispersar por dezenas de polícias de intervenção equipados a rigor. Momentos de tensão, num país em tensão permanente desde o início da guerra no leste, na região do Donbass.

A concentração, que interrompeu o trânsito na avenida Khreschatyk, voltou a ser apoiada por forças irreconciliáveis entre si, mas unidas na oposição ao Presidente Volodymyr Zelenski.

"Não foi uma manifestação política, foi de pequenos empresários que protestam contra diversas medidas do Governo e exigem a redução da pressão dos impostos e dos decretos administrativos dirigidos ao pequeno comércio", disse à Lusa Volodymyr Ariev, deputado do Solidariedade Europeia (YeS), o antigo bloco de Petro Poroshenko que nas legislativas de outubro de 2014 garantiu 132 dos 423 lugares na Rada.

Este partido de centro-direita, nacionalista e pró-europeu, foi derrotado em 2019 pela formação do atual Presidente, que também se impôs por larga margem ao rival Poroshenko nas presidenciais que decorreram em simultâneo.

"Protestam há mais de ano e meio, e por vezes fazem grandes manifestações, como agora sucedeu", acrescenta Ariev.

Mas este protesto também obteve o apoio da Plataforma da Oposição - Pela Vida (OPZZh), um partido definido como pró-russo que contesta a aproximação à União Europeia, dirigido pelo oligarca Viktor Medvedchuk e que se afirma solidário com os pequenos empresários em protesto pelas recentes medidas sobre transações bancárias aconselhadas por Bruxelas e que consideram fatais para o seu negócio, onde imperava o 'dinheiro vivo'.

Progressivamente, a frase que ecoou por toda a praça, com a ajuda de um megafone, acabou por se dissipar, também abafada pelo ruído dos automóveis que retomaram a circulação, e tudo voltou ao normal.

Mas a situação económica da Ucrânia, um país com quase 40 milhões de habitantes, muito dependente de empréstimos e doações das grandes instituições financeiras internacionais, é grave. O PIB 'per capita' coloca-o no 119º lugar à escala global e o desemprego e a pobreza parecem desafiar todas as estatísticas oficiais.

Anton Naychuk, 31 anos, doutorado em Ciências Políticas e um dos diretores da Fundação Diplomacia Civil, um instituto próximo do atual Governo, reconhece o momento crucial que o seu país atravessa. "Devido à permanente pressão internacional, os investidores estrangeiros estão a tentar retirar o seu dinheiro da Ucrânia, e isso está a provocar muitos problemas. O Presidente, o Governo, a sociedade civil, entendem que o risco de uma agressão russa está presente, mas tentamos manter a calma e explicar aos nossos parceiros internacionais que este contexto pode ser ultrapassado", afirma.

"Já perdemos cerca de seis mil milhões de dólares [5,3 mil milhões de euros] em investimentos desde o início desta crise [em 2014 com a anexação da Crimeia pela Rússia e o início da guerra no Donbass], e o desemprego é outro grande problema. Muitos investidores não querem trabalhar com a Ucrânia, apesar de tentarmos transmitir garantias", prossegue o responsável da Fundação e mandatado para delinear o processo político e a preparação de um roteiro para investimentos estrangeiros na Ucrânia.

"É muito difícil garantir novas oportunidades, novos negócios, porque os investidores não vêm para aqui, e há muitos que tentam mesmo fechar os seus negócios", acentua Naychuk.

Neste contexto, os contínuos alertas ocidentais sobre uma "invasão iminente" estão a motivar um grande incómodo na liderança de Kiev, incluindo no Presidente Volodymyr Zelensky.

A cumplicidade com o atual poder instalado no palácio Mariinsky leva Anton Naychuk a interrogar-se se a concentração na praça Maidan foi um "protesto" ou antes uma "iniciativa política que pretende extrair benefícios", e quando o Governo, assegura, mantém "contacto direto com os empresários" ucranianos e tenta encontrar compromissos.

O combate à corrupção e ao poder da oligarquia financeira também associada ao político e empresário milionário Poroshenko -- acusado em dezembro de 2021 pelas autoridades ucranianas de alta traição num caso relacionado com a alegada compra de carvão em territórios das repúblicas separatistas pró-russas de Donetsk e Lugansk e a aguardar o julgamento em liberdade -- foi anunciada como uma das prioridades dos novos dirigentes, mas os resultados escasseiam.

"A corrupção é um problema para todos os países, mas na Ucrânia talvez tenha sido um pouco mais problemática porque não foram tomadas medidas suficientes para resolver a situação. Houve uma reforma do sistema judicial que não obteve bons resultados após um conflito entre diversas instituições do Estado", diz Naychuk.

A presença dos "grupos de influência", dos oligarcas, permanece muito visível, apesar da íntima colaboração entre o chefe de Estado e o parlamento, dominado pelo partido presidencial, na elaboração de projetos-lei para contrariar essa influência e impedir que muitos deputados permaneçam controlados por grupos financeiros.

"A nossa prioridade é o reforço dos laços económicos com a União Europeia, mas em simultâneo, em particular nas regiões do leste, muitos negócios continuam a ser orientados pela Rússia, onde continuam a existir fábricas, produção", indica Naychuk.

"Apesar de dizermos que a Rússia é a agressora, tentamos construir uma política de vizinhança, existem riscos militares dos dois lados, mas em simultâneo é necessário construir a nossa política regional tendo em conta os nossos interesses nacionais", adianta.

A guerra no leste implicou que a Ucrânia perdesse importantes unidades industriais, agora sob controlo das administrações pró-russas das autoproclamadas "repúblicas populares" de Donetsk e Lugansk, e com centenas de milhares de passaportes russos distribuídos pela sua população, perto dos quatro milhões.

"Todos estes factores têm um reflexo negativo na nossa situação económica, e explicam como a nossa economia não está tão bem como desejávamos. O covid-19 também teve um impacto muito negativo, e o principal objetivo do nosso Governo é encontrar uma solução para estes problemas", concluiu.

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