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A "singularidade" francesa entre o amor e a rejeição à Europa

Apenas 23% dos franceses se dizem europeus, um dos números mais baixos entre os 27 Estados-membros da União Europeia, havendo no país fundador do bloco um euroceticismo "singular", com sentimentos ambivalentes em relação a Bruxelas.

A "singularidade" francesa entre o amor e a rejeição à Europa
Notícias ao Minuto

09:30 - 08/01/22 por Lusa

Mundo União Europeia

A bandeira europeia gigante sob o Arco do Triunfo na passagem do ano gerou a primeira polémica política em França em 2022. Normalmente, em alturas emblemáticas, é uma bandeira francesa que se agita no topo dos Campos Elísios, mas para assinalar o início da presidência francesa do Conselho da União Europeia, as autoridades entenderam colocar o símbolo europeu.

Marine Le Pen, líder do partido de extrema-direita União Nacional, disse sentir-se "ultrajada", considerando este ato "uma ofensa" por a bandeira flutuar por cima da campa do Soldado Desconhecido.

A seguir foi Valérie Pécresse, líder do maior partido da direita francesa e candidata às presidenciais, a mostrar o seu desagrado, assim como Jean-Luc Mélenchon, também candidato à chefia do Estado e líder da extrema-esquerda.

No dia 02 de janeiro, a bandeira já tinha desaparecido. Um calendário "previsto" segundo o Governo, que alega não ter retirado a bandeira por pressão política.

"Há claro o risco de esta presidência francesa ser uma oportunidade perdida devido a esta concomitância com as eleições presidenciais [que se realizam em abril]. A polémica sobre a bandeira é algo muito pouco interessante e nem sequer serviu para falar sobre a importância desta bandeira e o seu significado", afirmou Emmanuel Rivière, presidente do Centro Kantar sobre o Futuro da Europa, em declarações à agência Lusa.

Emmanuel Rivière, também o diretor internacional de estudos políticos da Kantar, empresa que leva a cabo estudos de opinião, é um dos autores do relatório "Um eurocepticismo à francesa", lançado em cooperação com a universidade Sciences Po e o Instituto Jacques Delors.

"Em muitos indicadores [sobre a identificação e confiança na União Europeia], a França está nos níveis mais baixos em relação aos outros países europeus e isso é algo que sabemos. A história política do país foi fortemente marcada pelo referendo de 2005 e a rejeição do Tratado Constitucional, no entanto, seria falso dizer que os franceses são na sua maioria antieuropeus", declarou.

No Eurobarómetro de novembro de 2021, os franceses são dos europeus que menos se identificam como tal, mas, ao mesmo tempo, seis em cada dez franceses dizem estar de acordo com os valores promovidos pela União Europeia.

Esta desconfiança face à Europa, segundo Emmanuel Rivière, tem duas fontes principais, a economia e a política, tornando a desconfiança francesa uma "singularidade" na Europa.

A França continua a ser um dos países mais reticentes face à economia liberal e também um dos mais desconfiados perante o comércio livre, promovido nos acordos comerciais celebrados pela União Europeia com dezenas de países fora do continente. A nível político, o sistema francês faz com que a necessidade de compromisso seja estranha aos gauleses.

"A cultura política francesa, com uma maioria que se constrói à volta de um único vencedor, o Presidente, não corresponde muito a outros países onde os sistemas políticos conduzem a maiorias compostas por diferentes partidos e onde há necessidade de compromisso, como acontece no Parlamento Europeu", indicou Emmanuel Rivière.

Esta desconfiança em relação à Europa tem alimentado o discurso de partidos de extrema-direita e extrema-esquerda em França, com a União Nacional de Marine Le Pen a ser uma das vozes mais destacadas contra o projeto europeu.

No entanto, na segunda volta das eleições presidenciais de 2017 e face ao europeísta assumido Emmanuel Macron, os argumentos de Marine Le Pen, como a saída do euro, não convenceram os franceses.

"Nas últimas eleições presidenciais, a Europa esteve muito presente nos debates e a Europa foi uma das razões do fracasso de Marine Le Pen. Ou seja, o seu próprio eleitorado não estava de acordo com a saída do euro e ela não estava à vontade para falar sobre temas europeus", explicou Emmanuel Rivière.

Para o investigador, a coincidência em 2022 das eleições presidenciais com a presidência da União Europeia deve servir para que também este ano se fale mais de Europa e para "amadurecer" a vida política em França.

"A oportunidade é que esta concomitância traga mais Europa à campanha presidencial e isso é importante porque precisamos de mais maturidade na vida política francesa no sentido de termos de perceber que o Presidente que vamos eleger não é sucessor do general De Gaulle, mas um chefe de estado que tem de se inscrever num coletivo", concluiu.

Na sexta-feira, no âmbito da tradicional visita do colégio da Comissão à capital que assume a liderança semestral do Conselho da UE, Emmanuel Macron e Ursula von der Leyen prestaram homenagem no Panteão a Jean Monnet e Simone Veil, dois pilares da construção europeia.

Jean Monnet foi um dos pais fundadores do bloco europeu e Simone Veil presidiu ao Parlamento da União, sediado numa cidade francesa.

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