Com o Brexit "estamos a lidar com um mau resultado, seja ele qual for"
Joseph Weiler, académico norte-americano especializado em assuntos europeus, considera que qualquer dos resultados possíveis do Brexit vai ser negativo porque vai deixar insatisfeitos tanto os que querem sair como os que querem ficar.
© European University Institute
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Weiler critica por outro lado a União Europeia, que descartou alternativas e manteve uma postura de dureza para desencorajar outros Estados membros de seguir o exemplo do Reino Unido, a qual, embora tenha tido êxito, corresponde quase a uma "política do medo".
"Estamos a lidar com um mau resultado, seja ele qual for", disse Weiler, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Nova Iorque e ex-diretor do Instituto Europeu de Florença, em entrevista à Lusa em Lisboa.
"Há uma possibilidade considerável de o Reino Unido sair sem acordo, um resultado muito mau. Há a possibilidade de Theresa May conseguir a maioria no parlamento, mas será com um parlamento muito insatisfeito com o acordo, tanto os que defendem a permanência como os que defendem a saída. E a perspetiva de, afinal, ficarem [na UE] é provavelmente a melhor de todas as más opções, mas também não é boa", explicou.
Joseph Weiler falava do atual impasse no processo de saída do Reino Unido da UE, depois de a primeira-ministra britânica ter adiado para meados de janeiro a votação do acordo de saída negociado com Bruxelas, dado o risco de ser chumbado por ampla margem na Câmara dos Comuns, o que abriu um conjunto de cenários que vão da saída desordenada a um segundo referendo ao Brexit ou mesmo a anulação da saída.
"Parece improvável que o acordo negociado seja aceite pelo parlamento, embora seja muito difícil imaginar um acordo substancialmente melhor, porque sair da UE é isto", considerou.
"E há imensa pressão no Reino Unido para fazer um novo referendo, partindo do pressuposto de que a saída seria revogada, o que não sabemos. Mas, mesmo que haja uma maioria, também é um resultado muito pobre, porque a maioria para permanecer não será enorme, e haverá enorme frustração, porque ainda há um grande número de pessoas no Reino Unido para quem o voto no referendo [de 2016] deve ser vinculativo", explicou.
Também por isso, se a opção fosse a de reverter o Brexit e permanecer na UE, haveria muitas pessoas inconformadas, além de que, para a União, o Reino Unido "continuaria a ser um cliente muito difícil", numa altura em "que a UE precisa de mudanças muito importantes" e se torna "muito difícil imaginar que o Reino Unido concordasse com qualquer nova integração substancial".
Para Weiler, a situação chegou a este ponto porque a decisão de fazer um referendo sobre o Brexit em 2016 foi "um expediente político de enorme irresponsabilidade", uma vez que visava resolver um problema interno do Partido Conservador e não foi acompanhada de qualquer trabalho técnico.
"A decisão original de David Cameron de realizar o referendo sobre o Brexit foi a maior catástrofe da política externa britânica em 100 anos", afirmou.
"De alguma forma, ele acreditava que tiraria vantagens políticas do referendo, mas que o [resultado do] referendo seria pela permanência. E quando foi pela saída, o que começou como uma tragédia tornou-se uma farsa", considerou, acrescentando que o Governo britânico "não tinha um plano negocial", "não tinha um objetivo a atingir" e "era claro que não tinha pensado a sério as várias alternativas".
O académico critica também a estratégia seguida pela UE face ao Brexit, assente numa "postura negocial" que se pode traduzir como "temos de ser duros porque não queremos que outros países sigam o exemplo do Reino Unido" e "vamos mostrar que esta é uma maneira muito cara de resolver os problemas".
Porque havia, na opinião de Weiler, uma alternativa.
"Temos um país que não está satisfeito com o progresso da integração europeia, o Reino Unido. Porque não ser generoso, oferecer-lhe um estatuto de membro associado, em que não faz parte do mercado único no sentido pleno?", questionou.
Essa "generosidade" levaria "dois ou três outros países" a fazer o mesmo, "talvez a Polónia, talvez a Hungria", "porque é um processo respeitável", e o resultado seria a permanência como membros de pleno direito de "países que ficam então muito mais comprometidos com o projeto de integração europeia".
"Mas essa opção foi descartada. Então agora, de certa maneira, a UE teve êxito - não é atraente sair da UE -, mas de certa forma é a política do medo. É como um homem ou uma mulher que permanecem casados não porque querem continuar casados, mas porque o divórcio parece ainda pior".
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