Retomado primeiro julgamento do caso dos "bebés roubados" no franquismo
O primeiro julgamento do caso dos "bebés roubados" no franquismo foi retomado hoje em Madrid, em Espanha, décadas depois das primeiras revelações sobre o tráfico de recém-nascidos confiados a famílias adotivas sob a ditadura de Franco.
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Mundo Espanha
Esse julgamento sem precedentes começou em 26 de junho, mas teve de ser adiado no dia seguinte, com o arguido Eduardo Vela a ser sendo internado de urgência: "Esperamos que seja o último dia da audiência antes da sentença", disse Inês Madrigal, que denunciou o médico.
O Ex obstetra de 85 anos, que durante 20 anos dirigiu a Clínica San Ramon, em Madrid, foi um dos principais atores do caso de tráfico de recém-nascidos que envolveu milhares bebés desde a ditadura de Franco (1939-1975).
Muitas vezes, com a cumplicidade da Igreja Católica, as crianças eram retiradas aos seus pais após o parto, declaradas mortas sem provas e adotadas por casais estéreis, preferencialmente próximos do regime "nacional-católico".
Neste julgamento, Eduardo Vela é acusada por Inês Madrigal, uma funcionária da ferrovia de 49 anos, de a ter separado da sua mãe biológica, Inès Perez, e de falsificar a sua certidão de nascimento, em junho de 1969. O Ministério Público pede 11 anos de prisão.
Desde que o escândalo foi denunciado pela primeira vez na imprensa, em 1982, Eduardo Vela, há muito denunciado por associações de vítimas, é o primeiro a sentar-se no banco dos réus, graças ao testemunho da mãe adotiva de Inès Madrigal, que entretanto faleceu.
Madrigal, que não podia ter filhos, disse que o médico lhe ofereceu um bebé antes de lhe pedir para simular uma gravidez e declarar-se como mãe biológica do recém-nascido.
Durante o julgamento, Eduardo Vela admitiu ter assinado "sem olhar" o dossiê médico que relatava que tinha assistido ao parto, mas retratou-se na primeira audiência, alegando não reconhecer a sua assinatura.
Seis testemunhas estão agendadas para hoje, incluindo uma jornalista do canal de televisão francês France 2 que gravou com uma câmara escondida a confissão de Vela sobre o bebé oferecido como "presente". Segundo uma fonte judicial, a jornalista será entrevistada por videoconferência.
"Este dia pode ser histórico porque pode levar a um julgamento que consideraria os fatos como provados. Até ao momento temos apenas acusações", disse o advogado de Inès Madrigal, Guillermo Peña. Segundo disse, os três juízes do tribunal poderão ditar a sentença dentro de um mês.
Para o advogado Enrique Vila Torres, um dos especialistas no assunto, este julgamento "pode ajudar moralmente" as vítimas e incentivá-las a levar os seus casos à justiça. "Há dezenas de médicos e freiras culpados em toda a Espanha" ainda vivos, afirma.
Mas apesar da amplitude do escândalo, nenhuma das mais de 2.000 reclamações apresentadas por associações resultou, muitas vezes por causa da prescrição dos factos.
A prática de "roubar bebés" nasceu durante a repressão que se seguiu à guerra civil (1936-1939). As crianças foram retiradas das suas famílias, geralmente opositores acusados de transmitir o "gene" do marxismo.
A partir da década de 1950, as crianças nascidas fora do casamento, ou em famílias pobres ou muito grandes, foram alvos preferenciais deste esquema. O tráfico continuou na democracia, pelo menos até 1987, funcionando como uma forma de ganhar dinheiro.
O mesmo fenómeno foi repetido na Argentina durante a ditadura militar (1976-1983), quando cerca de 500 recém-nascidos foram retirados aos detidos e confiados para adoção a famílias que apoiavam o regime.
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