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Revolução no Líbano começou há um ano e consequências ainda se sentem

Os protestos populares inéditos no Líbano começaram a 17 de outubro, faz sábado um ano, e os seus efeitos, que incluíram a queda de dois governos, continuam a fazer-se sentir, apesar de praticamente terem desaparecido das ruas.

Revolução no Líbano começou há um ano e consequências ainda se sentem
Notícias ao Minuto

11:59 - 16/10/20 por Lusa

Mundo Líbano

A 17 de outubro de 2019 muitos foram para as ruas protestar após o governo libanês anunciar uma taxa sobre as chamadas através da aplicação WhatsApp em plena crise económica.

O executivo renunciou rapidamente ao imposto, mas nas semanas seguintes dezenas de milhares de libaneses manifestaram-se quase diariamente, alguns queimando pneus e bloqueando estradas, contra uma classe política inalterada há décadas e acusada de corrupção e de incompetência.

A mobilização inédita na história do país obrigou à demissão do governo de Saad Hariri, mas foi perdendo a força gradualmente a partir de dezembro, quando foi nomeado um novo primeiro-ministro, Hassan Diab, e as restrições ligadas à pandemia de covid-19, a repressão e o cansaço dissiparam-na quase completamente.

No entanto, os efeitos da revolta e a vontade de mudança continuam intactos, asseguram os militantes.

Por exemplo, os dirigentes políticos vaiados e perseguidos incansavelmente durante um ano, mantêm-se agora discretos ou adaptaram o seu discurso.

"Eles têm medo de enfrentar manifestantes e desapareceram" dos locais públicos, constata o politólogo Ziad Majed. "Temem que os seus nomes sejam associados à corrupção", adiantou.

Receio exacerbado com as sanções e críticas da comunidade internacional, com a França na dianteira, cujo discurso se foi gradualmente aproximando do da rua libanesa.

Após a explosão devastadora no porto de Beirute a 4 de agosto, atribuída à negligência das autoridades, o governo Diab demitiu-se e os raros responsáveis que ousaram visitar as zonas do desastre foram vaiados.

Por outro lado, muita da ajuda internacional foi encaminhada diretamente para a população, sem passar pelo poder.

Também foram quebrados tabus, como suspender por cordas efígies de líderes políticos, incluindo do chefe do poderoso movimento xiita Hezbollah, Hassan Nasrallah, em manifestações após a explosão no porto, que causou mais de 200 mortos, 6.500 feridos e centenas de desalojados ao destruir bairros inteiros da capital libanesa.

A mudança afetou ainda as eleições sindicais e estudantis frequentemente bloqueadas pelos partidos políticos: Melhem Khalaf, próximo do movimento de contestação, foi eleito bastonário dos advogados de Beirute e candidatos independentes venceram eleições de estudantes.

"Mégaphone", uma plataforma de comunicação social "online" criada em 2017, quer ser uma alternativa aos media maioritariamente controlados pelos partidos no poder.

Amplamente seguida, a plataforma visa retransmitir "as reivindicações da rua", explicou à agência France-Presse Jonathan Dagher, um dos seus jornalistas.

Numa tentativa de acalmar a opinião pública e de satisfazer os doadores que condicionaram a ajuda a reformas estruturais, foram aprovadas no parlamento duas leis anticorrupção, uma das quais sobre enriquecimento ilícito. O risco é que nunca saiam do papel.

Outra das consequências foi o fim do financiamento pelo Banco Mundial de um projeto contestado de construção de uma barragem hidráulica no sul do Líbano, um dos símbolos do braço de ferro entre a rua e o poder.

"O movimento popular e a pressão internacional tiveram um efeito acelerador", reconhece o ex-deputado independente Ghassan Moukheiber.

Acima de tudo, o movimento inaugurou um novo discurso pró-secular e de defesa dos direitos das mulheres e das minorias sexuais.

É "um início de mudança das mentalidades", comenta Ziad Majed.

Para a historiadora Carla Eddé, o movimento constitui "inegavelmente uma viragem histórica", mas é "prematuro falar de uma etapa fundacional".

A saída da classe dirigente e a formação de um governo independente, exigidos pelos manifestantes e pela comunidade internacional para iniciar as reformas e receber a tão necessária ajuda estrangeira, ainda não aconteceram.

Os movimentos revolucionários "geralmente levam tempo" para se concretizar, mas os que geram "mudanças duradouras" conseguiram "institucionalizar-se", sublinha Eddé, aludindo à "ausência de liderança" no caso libanês para juntar os vários grupos contestatários.

Os militantes dizem que tentam criar uma aliança de grupos da sociedade civil para enfrentar o poder.

A transição política "é um processo longo", afirma Jonathan Dagher. "Não esperamos que um regime complexo seja desmantelado da noite para o dia (...) conhecemos o tamanho do monstro", adianta.

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