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Tiananmen: China pediu identificação de alunos à Universidade de Lisboa

A embaixada da China pediu à Universidade de Lisboa a identificação dos alunos chineses que frequentavam a instituição, em 1989, na sequência dos acontecimentos de Tiananmen, o que foi recusado pelo reitor, disse o próprio à agência Lusa.

Tiananmen: China pediu identificação de alunos à Universidade de Lisboa
Notícias ao Minuto

10:38 - 01/06/19 por Lusa

Mundo Massacre de Tiananmen

"Estava numa reunião com muita gente e fui interrompido a meio, quando vieram dizer-me que estava um senhor da embaixada chinesa a pedir a identificação dos estudantes", recordou o então reitor, Virgílio Meira Soares, por ocasião do 30.º aniversário do massacre de Tiananmen, que se assinala a 4 de junho.

Meira Soares não esperava a solicitação, mas não teve dúvidas: "Obviamente que aquilo cheirava a perseguição ou pelo menos a uma tentativa de encontrar indivíduos para perseguir".

A funcionária que questionou o reitor já tinha intenção de não fornecer os nomes dos alunos, mas não tinha poder de decisão. "Obviamente que a resposta foi - Não se dá absolutamente nada!", confirmou Meira Soares.

Na época, apenas algumas dezenas de estudantes chineses frequentavam a Universidade de Lisboa. Meira Soares não voltou a ser questionado sobre a identidade dos alunos e desconhece se foram feitos pedidos semelhantes a outras instituições de ensino.

"Possivelmente... agora não sei se fizeram a mesma coisa para outras áreas ou se foi só na universidade. Normalmente também é o sítio onde as ideias ditas subversivas se desenvolvem mais", admitiu. "Se assim foi na Universidade de Lisboa, não me admirava nada que tivessem feito o mesmo em outras áreas".

O governo chinês culpava os pensadores ocidentais pela sublevação dos estudantes que exigiam reformas democráticas no país de partido único.

Meira Soares confessou que não esperava que o governo chinês se atrevesse a "meter-se com uma instituição pública portuguesa" para pedir a identificação de pessoas.

"Isso não cabe na cabeça de ninguém. Só cabe na cabeça de uma ditadura como aquela que existia na altura, agora não sei como aquilo está", afirmou.

Não deu nomes à China, "como não daria aos EUA, à Alemanha ou ao Estado português, a menos que houvesse uma ordem judicial", frisou.

"Era como se agora um dos ditadores que andam por aí - a gente sabe quem são, não vale a pena dizer nomes -- viesse aqui fazer o mesmo pedido em relação aos cidadãos do seu país", indignou-se.

"E olhe que houve momentos difíceis, por exemplo em Angola, e nunca a embaixada angolana se atreveu sequer a pedir qualquer informação sobre alunos angolanos. E aí sim, tínhamos cá muitos", declarou, sublinhando a guerra civil vivida no país africano após a Independência (1975 -- 2002).

A posição da China na época, defendeu, só é explicável por "algum desespero antidemocrático" e anti direitos humanos. "Realmente foi um atropelar de direitos humanos em condições desnecessárias", lamentou.

Meira Soares estava na altura embrenhado na adaptação dos estatutos da universidade à lei da autonomia das universidades, que havia saído no ano anterior.

As memórias que guarda são de uma reunião do Senado em que estaria a trabalhar nesse processo quando foi surpreendido pela requisição da China. Não havia nada escrito, apenas um recado.

Se fosse hoje, tomaria a mesma decisão: "Não daria sequer à nossa polícia. Há uma espécie de contrato de confidencialidade entre a instituição e o aluno".

Nunca foi possível apurar o número exato de vítimas da intervenção militar contra os estudantes e outros civis concentrados na Praça da Paz Celestial (Tiananmen) a 4 de junho de 1989. Os manifestantes falaram em 7.000 mortes, a Cruz Vermelha chinesa em 2.600.

As mesmas dúvidas permaneceram face ao número de feridos e desaparecidos, igualmente na ordem dos milhares.

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