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"Estamos aqui para tentar acelerar o equilíbrio da balança de género"

Portugal está no 21º lugar (de 28) no que diz respeito à igualdade de género na União Europeia. Discriminação salarial e violência doméstica são alguns dos flagelos que o país tem de combater com urgência. É nesse sentido que surge o movimento internacional HeForShe, que pretende "quebrar estereótipos e preconceitos criados pela sociedade".

"Estamos aqui para tentar acelerar o equilíbrio da balança de género"
Notícias ao Minuto

08:42 - 05/11/17 por Pedro Bastos Reis

País HeForShe

Quando olhamos para os números da igualdade de género em Portugal, percebemos que ainda há um longo caminho a percorrer. Esta problemática vai surgindo no espaço público no país, mas há muito por fazer.

Um dos casos mediáticos que abalou a sociedade nos últimos tempos foi o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, assinado pelo juiz relator Neto de Moura pela juíza desembargadora Maria Luísa Arantes. No acórdão em questão, recorde-se, Neto de Moura invoca a Bíblia, o Código Penal de 1886 e civilizações que punem o adultério com pena de morte como forma de desvalorizar a violência contra as "mulheres adúlteras". A mulher em causa foi agredida por dois homens com uma moca com pregos. Os agressores ficaram com pena suspensa na primeira instância.

Este é um dos problemas identificados no que diz respeito à discriminação de género, a violência sobre as mulheres. Segundo os números da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), em 2016, por dia, houve 14 mulheres alvo de violência, quase 100 por semana. No mesmo ano, no que diz respeito à violência doméstica, houve um aumento de 2% relativamente a 2015, registando-se, segundo o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), mais de 27 mil casos de violência doméstica. Destes casos, 84,3% foram cometidos por homens, e das vítimas, 79,9% foram mulheres.

A questão da violência contra mulheres é uma das três áreas mais críticas, juntamente com a desigualdade no trabalho e na política, para a HeForShe (ElePorEla), um movimento internacional que chegou este ano ao nosso país.

Fundado e liderado pela atriz Emma Watson, o HeForShe faz parte dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), e tem como objetivo “acelerar a promoção da igualdade de género, diminuindo o gap que existe entre homens e mulheres a vários níveis”. Nesse sentido, o movimento atua em seis áreas – saúde, educação, política, identidade, trabalho e violência – com o objetivo de “quebrar estereótipos e preconceitos criados pela sociedade”.

A embaixadora do movimento em Portugal é Carolina Pereira, que antes fundou a ONG My Destiny. “Nunca me tinha associado a nenhum movimento feminista, pois ainda não tinha encontrado um com que me identificasse o suficiente para dar esse passo”, começa por dizer ao Notícias ao Minuto. É então que surge o HeForShe, a “abordagem mais inclusiva e holística que tanto procurava”.

O movimento pretende a “inclusão de homens e rapazes na discussão”, uma vez que “é preciso fazer entender que uma sociedade mais justa e igualitária será também uma sociedade mais equilibrada e competitiva”.

Por isso, Pedro Júlio, estagiário na Direção de Controlo de Gestão da The Navigator Company e estudante de mestrado no ISCTE-IUL, decidiu aderir ao HeForShe. Por, nas suas palavras, querer “fazer parte da mudança de paradigma, ainda para mais quando Portugal apresenta níveis de desigualdade de género bastante preocupantes no que toca, por exemplo, à violência doméstica e à desigualdade salarial”. Apresentando-se como “homem e defensor da igualdade de género”, encara o “empoderamento de mulheres como vital para o progresso económico, social e cultural de cada país e do mundo”.

Foi precisamente Pedro Júlio quem convidou Mónica Canário, assistente de investigação no Centro de Estudos Internacionais (CEI-IUL) e aluna de doutoramento na mesma universidade, para entrar no HeForShe.

“Ele já sabia do meu interesse pela temática da igualdade de género - na altura, tinha acabado de defender a minha tese de mestrado sobre o mesmo tema - e não hesitei por um segundo quando me propôs fazer parte do movimento no nosso país”, explica Mónica Canário ao Notícias ao Minuto.

Portugal no fundo da tabela da UE na igualdade de género

Como Pedro Júlio refere, a violência doméstica e a desigualdade salarial são dois dos principais problemas no diz respeito à desigualdade entre géneros.

No que diz respeito aos números da discriminação no posto de trabalho, os dados são reveladores. Apesar de serem mais do que os homens e terem mais habilitações - em cada 100 pessoas com ensino superior completo, cerca de 60 são mulheres -, em Portugal, as mulheres recebem menos do que os homens, trabalham mais sem receberem por isso e têm menor representação nos órgãos de decisão.

Segundo a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), em 2015, uma mulher ganhava, em média, 824,99 euros por mês, ao passo que um homem ganhava 990,05 euros, ou seja, uma diferença de 16,7% entre sexos. Para além disso, são as mulheres que dedicam mais tempo às tarefas domésticas e de cuidado: trabalham em casa mais uma hora e 45 minutos diariamente do que os homens e, para além disso, trabalham uma hora e 13 minutos a mais por dia do que os homens.

O Governo português está ciente deste problema e promete resolvê-lo “muito brevemente” e aprovar, nesse sentido, uma proposta de lei para promover a igualdade salarial nas empresas.

A desigualdade de género não é um fenómeno exclusivamente português, mas, na tabela dos 28 países da União Europeia, Portugal aparece no 21º posto no ‘ranking’ de igualdade de género, tendo atrás de si apenas a República Checa, Grécia, Croácia, Chipe, Luxemburgo, Roménia e Eslováquia.

Nesse sentido, Carolina, Pedro e Mónica, que falam em nome do HeForShe, consideram que “a solução para a igualdade de género está na educação”. “É preciso começar desde cedo a quebrar estereótipos e preconceitos criados pela sociedade, dado que a partir dos 6/7 anos as crianças começam a praticar e promover a dicotomia que existe entre homens e mulheres. É nesse sentido que acreditamos ser urgente formar educadores e professores que tenham atenção à linguagem utilizada e aos micro-machismos que estão enraizados no nosso quotidiano”, concretizam.

Atuar nas universidades. Mas não só

Por ser um movimento internacional, o HeForShe segue determinadas diretrizes, apesar de “todos os países terem liberdade total na aplicação de uma estratégia”. “Somos versáteis e flexíveis, e o nosso objetivo é sermos orgânicos, ou seja, que o movimento ‘ganhe asas’ por si só, sendo que todas as equipas HeForShe em Portugal podem sempre contar com o nosso apoio e ajuda”, garantem. "Estamos aqui para tentar acelerar o equilíbrio da balança de género".

Como ainda está em crescimento, o HeForShe tem atuado sobretudo nas universidades. Para além disso, o seu trabalho passa muito pelas redes sociais, nomeadamente pelo Facebook, por campanhas de sensibilização ou pela organização de conferências.

A próxima é já no próximo dia 9 de novembro, no Auditório J. J. Laginha do ISCTE-IUL, onde irá decorrer a segunda edição da conferêcia ‘Women´s Rights are Human Rights’. No painel, serão apresentadas algumas das investigações sobre a igualdade de género que estão a ser desenvolvidos, e contará ainda com a presença de investigadores e jornalistas.

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