"Boleia paga" já salvou até grávidas na capital moçambicana

Estacionados em alguns pontos da cidade de Maputo, as "boleias pagas" surgiram no período da pandemia da covid-19, durante as restrições, e ficaram.

REPORTAGEM: "Boleia paga" já salvou até grávidas na capital moçambicana

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Lusa
07/07/2025 09:37 ‧ há 4 horas por Lusa

Mundo

Moçambique

A cidade de Maputo regista nos últimos cinco anos um fenómeno de alargamento de meios alternativos de transporte público, como o "boleias pagas", que já socorreram de executivos a mulheres grávidas na capital moçambicana.

 

Estacionados em alguns pontos da cidade de Maputo, as "boleias pagas" surgiram no período da pandemia da covid-19, durante as restrições, e ficaram.

"Esta iniciativa faz muita diferença, visto que já tivemos capítulos aqui em que até socorremos mulheres grávidas (...) já levamos daqui pessoas para o hospital, não tinha cá um transporte. Já levamos entidades [executivos], não posso cá dizer o nome, que estavam atrasados e fizemos eles chegarem em pouco tempo aos seus serviços", conta à Lusa Eugénio Mathe, um dos condutores.

Mathe está na "praça" há cinco anos, com cerca de 50 colegas, e usa uma Toyota Sienta, uma mini-van de sete lugares, que oferece vantagem pelo número de passageiros que carrega.

De 41 anos, Mathe decidiu abraçar as "boleias pagas" devido ao desemprego, para sustentar a filha e esposa, transportando pessoas entre a Praça dos Combatentes e a Praça do Destacamento Feminino, uma distância de pouco mais de quatro quilómetros, cobrando 15 meticais (0,20 euros).

O preço aplicado por Mathe e seus companheiros é o mais baixo, pois privilegiam os estudantes da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), a mais antiga instituição pública, enquanto noutras paragens aplica-se 20 meticais (0,27 euros).

E porque o negócio está a crescer, está em criação uma associação, mas a relação com as autoridades municipais não tem sido "amigável", por causa da região onde trabalham: a avenida Julius Nyerere, próximo à Presidência moçambicana.

"Eles sempre vieram atras de nós, alegando que isto é uma via protocolar, (...) não estamos aqui a fazer barulho nenhum: estacionamos os carros, as pessoas vêm, entram", disse, acrescentando que o objetivo do grupo é legalizar a atividade.

Enquanto aguardam por isso, os motoristas de "boleias pagas" tiveram, na terça-feira, os seus carros bloqueados e rebocados pela polícia municipal que, segundo os motoristas, proibia o estacionamento ao longo da avenida Julius Nyerere e o exercício da atividade.

Em protesto, recusaram-se a retirar os carros e, de seguida, um contingente policial chegou ao local e disparou gás lacrimogéneo para dispersar os condutores.

Na mesma praça de Eugénio Mathe opera também Dércio Uamusse, 34 anos, que perdeu emprego na pandemia.

Embora a cidade de Maputo registe problema crónico de transporte público, surgiram, nos últimos tempos, os táxis por aplicativo e até moto-táxis, mas, mesmo assim, Uamusse considera que se "sente bem" no negócio que abraçou.

"Não digo que ganhemos muito em relação a outros que fazem outras atividades. Mas digamos que é o costume. Então, sinto-me bem aqui", disse, acrescentando que os trabalhadores hoteleiros nas redondezas são beneficiários do seu transporte.

Uamusse sonha que a "atividade seja licenciada", embora a manutenção das viaturas seja um "calcanhar de Aquiles".

"A manutenção da viatura (...) é um calcanhar de Aquiles. O carro, por si só, não foi feito para desempenhar esta atividade. Mas temos conseguido. E sim, os carros estão em ótimas condições", relatou.

Entre os beneficiários destas "boleias pagas" esta Adélia Tinga, estudante finalista do curso de Planeamento e Ordenamento Territorial na Universidade Pedagógica (UP), localizada na avenida de Moçambique, que vê neste um meio para fugir da escassez de transportes. 

"Essas boleias públicas ajudam-nos muito, pois nessa via não existem chapas, e é muito rápido também", afirmou a estudante, instantes antes embarcar em mais uma viagem até a sua instituição de ensino.

Utente diária destes meios, Adélia reconhece a eficácia das "boleias pagas" e critica a decisão da retirada destes transportes pela polícia municipal, apelando para ideias "inovadoras" para solucionar a escassez de transportes naquela "praça". 

Tal como Adélia, Marnélio Machaieie, jovem de 25 anos, utiliza diariamente as "boleias pagas" para chegar ao seu local de trabalho.

Cozinheiro, Marnélio tem neste transporte a solução para nunca chegar atrasado ao trabalho, num dos restaurantes localizados na avenida Julius Nyerere. 

"Nunca chego tarde ao trabalho, sempre tenho o transporte pronto à minha espera", disse à Lusa Machaieie, explicando que, antes da circulação das "boleias pagas", eram necessários múltiplos transportes para chegar ao destino, acarretando mais custos e exigindo longas caminhadas.

"Tínhamos que pegar a outra rota. E eu tinha que usar esta via de Compone [paragem de autocarros] e tinha ainda que descer na esquina e caminhar para o serviço", explicou.

Para ele, enquanto Maputo se debate com a falta de transportes, a retirada deste meio seria sinónimo de dificuldade para todos os que veem nele uma forma de locomover-se com facilidade e comodidade.

O setor de transportes em Moçambique é um dos mais deficitários ao nível dos serviços públicos, principalmente o transporte rodoviário.

A crise de meios desencadeou o recurso a veículos de caixa aberta privados, popularmente conhecidos por 'My Love', dada a proximidade física com que os passageiros viajam na caixa de carga de mercadorias e a necessidade de, por vezes, se abraçarem para não caírem à estrada.

Leia Também: Norte de Moçambique regista crise humanitária "cada vez mais profunda"

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