A Câmara de Vila do Bispo, no Algarve, quer meter ordem na circulação de autocaravanas que se instalam sem cumprir regras em parques naturais ou mesmo nos espaços urbanos, criando problemas às comunidades locais.
"Aquilo que queremos é que as coisas sejam de forma organizada, de forma legal. Porque tudo aquilo que traz um turismo que não é aquele que nós pretendemos, traz poluição, traz falta de higiene, traz até problemas de saúde pública", disse à agência Lusa a presidente da Câmara de Vila do Bispo, Rute Silva.
A proibição de estacionar nos parques naturais, a maior parte do território do município, é já uma realidade que muitas vezes não é cumprida, mas coloca outros problemas que têm de ser resolvidos.
"Posso-lhe dar um exemplo: nós temos estacionamentos das escolas que de manhã, quando os pais vão levar os meninos às escolas, estão ocupados por autocaravanas", afirmou a autarca.
A Câmara tem colocado sinalética a proibir este tipo de estacionamento, mas quer ir mais longe.
O município algarvio (distrito de Faro) vai iniciar a discussão pública de uma proposta de regulamento para que as caravanas e autocaravanas sejam proibidas de pernoitar dentro dos perímetros urbanos, como já acontece nos parques naturais, à exceção de lugares previstos para o efeito, como áreas de serviços ou parques de campismo.
"Aquilo que necessitamos é de criar mais infraestruturas, ou seja, áreas de serviços ou parques de campismo, para que as autocaravanas possam, sim, dirigir-se aos locais certos", defendeu Rute Silva.
O município já está a licenciar mais áreas de serviço para as autocaravanas, que nesta altura do ano invadem áreas ao lado das praias, em lugares por vezes pouco acessíveis.
"Nós sabemos que a Guarda Nacional Republicana e as autoridades, nomeadamente o ICNF [Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas], fazem pontualmente situações de avaliação, de fiscalização. Só que com os efetivos que existem eu também entendo que as autoridades não consigam fazer essa fiscalização mais amiúde e de forma a garantir o cumprimento da legislação, porque naquilo que a legislação diz é que a pernoita é proibida em parque natural", afirmou Rute Silva.
A responsabilidade de fiscalizar o cumprimento das regras cabe principalmente à GNR e à Polícia Marítima, que, por vezes, não têm uma tarefa fácil.
"Se bem que esta zona seja muito procurada durante o ano inteiro, [no verão] a maioria das pessoas que procuram esta zona são cidadãos estrangeiros, jovens, que vêm à procura de um contacto com a natureza, que vêm à procura do surf e que vão chegando dos vários pontos do mundo à procura destes sítios paradisíacos", disse a comandante do Destacamento Territorial de Portimão da GNR, Francisca Albergaria.
As forças de segurança tentam sensibilizar os infratores para cumprir as regras, mas em muitas situações tem de ter a mão mais pesada.
"A nossa abordagem primordial e aquilo que devemos dar primazia é à sensibilização, ou seja, informar as pessoas, transmitir-lhes as informações necessárias para que elas saibam aquilo que podem e não podem fazer. Mas chegamos a um ponto em que não podemos fechar os olhos às infrações que estão diante de nós, e então aí vamos ter que passar à fiscalização, e, se as pessoas tiverem então infração, temos que passar para a legislação e aplicar os autos de contraordenação", disse Francisca Albergaria.
Segundo dados da GNR, em 2024 foram elaborados 346 autos de contraordenação e efetuadas duas detenções por tráfico de estupefacientes e condução sem habilitação legal, em 11 ações de fiscalização planeadas, com um total de 129 militares e a participação da Polícia Marítima.
Já este ano, tiveram lugar sete ações de fiscalização com um total de 51 militares, tendo sido elaborados 171 autos de contraordenação.
"O principal problema é este tipo de turismo muitas vezes não obedecer às nossas normas ou regras nacionais, ou à legislação nacional, e com isso ter comportamentos desviantes. O principal problema foca-se aqui no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, onde recorrentemente temos algumas queixas dos locais", disse o capitão do Porto de Lagos e comandante local da Polícia Marítima, Hugo da Guia.
Atualmente há duas áreas de serviço ou parques de campismo que podem receber caravanas, em breve serão cinco, mas os empresários do setor querem, sobretudo, que haja um aumento da informação fornecida a este tipo de turistas.
"Como eu disse, aqui no nosso concelho [Vila do Bispo], 98% possivelmente serão estrangeiros, muitos deles nem sabem qual é a legislação em Portugal, muitos deles nem sabem que estão dentro de um parque natural. Porque até os senhores [jornalistas], quando vieram agora de Faro, não viram nenhuma placa a dizer bem-vindos ao parque natural. Não há, não existe", afirmou o diretor do Salema Eco Camp, Joaquim Lourenço.
O fenómeno do autocaravanismo atingiu dimensões consideráveis nos últimos anos no Algarve, desenvolvendo-se num contexto de informalidade que o torna num foco de conflitos do ponto de vista ambiental e do ordenamento do território.
Devidamente enquadrado, esta modalidade de turismo pode deixar de ser uma ameaça e transformar-se numa oportunidade com um retorno económico importante.
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