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Segredo de estabilidade chilena é "controlo social pela força"

O escritor e ex-constituinte chileno, Jorge Baradit, considera que o Chile não fará a transição à democracia se mantiver a Constituição de Pinochet, mas que a nova proposta constitucional mantém o enfoque individualista da sociedade.

Segredo de estabilidade chilena é "controlo social pela força"
Notícias ao Minuto

11:17 - 16/12/23 por Lusa

Cultura Jorge Baradit

"Enquanto a Constituição de Pinochet estiver vigente, o Chile não terminará a sua transição à democracia porque a Constituição de Pinochet não foi votada por ninguém. O grande debate no país é um confronto entre uma visão coletiva de sociedade e oura visão individualista, estabelecida na Constituição", aponta Jorge Baradit em entrevista à Lusa a propósito do referendo constitucional de domingo.

Autor de dez livros, o escritor acaba de lançar 'O Lado Escuro', o quarto da série 'História Secreta do Chile' com a qual Baradit procura desvendar a dinâmica de domínio da elite chilena. O livro descreve o modelo económico chileno como um laboratório neoliberal frequentemente exaltado no exterior, mas baseado na desigualdade social, razão de um latente conflito interno.

"O grande segredo da estabilidade chilena, que tanta propaganda tem na América Latina, não é nada mais do que o controlo social através da força. Existe uma dinâmica por trás do poder sócio-político e económico do Chile que consiste em manter a estabilidade produtiva do país, se necessário através das Forças Armadas, apesar das necessidades do povo. O poder económico deste país sempre teve como aliado o poder militar para assegurar a estabilidade necessária para a produção", explica Jorge Baradit.

Foi o que levou o general Augusto Pinochet (1973-1990) ao golpe de Estado há 50 anos. Em 1980, o ditador impôs a atual Constituição, considerada a matriz da desigualdade social do país.

A atual Constituição define o Estado como subsidiário do setor privado, que assume o papel de vender Educação, Saúde, Habitação e pensões como um serviço. Até mesmo a água é um bem privatizado.

"No Chile, não há mecanismos para gerar ações solidárias. O neoliberalismo faz com que todos os serviços sejam administrados por privados, que, obviamente, são prestam serviço onde houver lucro. Há uma alta valorização do que é privado e do esforço individual, destruindo o tecido social coletivo", descreve.

Em outubro de 2019, uma insurreição popular forçou o início de um processo constituinte que apontava para um novo modelo. Porém, em setembro de 2022, 61,8% dos chilenos rejeitaram a proposta de uma nova Constituição, redigida por uma maioria de esquerda durante uma Assembleia Constituinte.

Essa Assembleia incluiu a eleição popular de pessoas independentes, sem trajetória partidária. Jorge Baradit foi um desses constituintes.

"O que pude perceber é que não se procurava um país mais justo. O que cada um procurava era um pedaço da torta, era participar do lucro. Quando apareceram mecanismos ou propostas para socializar a Saúde, a Habitação, a Habitação e a Educação, as pessoas não estavam dispostas a financiar um modelo público. O Chile é individualista", lamenta Baradit.

Em maio passado, os chilenos provocaram uma reviravolta no processo ao elegerem uma maioria de extrema-direita para redigir uma segunda proposta constitucional. Essa extrema-direita pertence ao Partido Republicano, liderado por José Antonio Kast, um admirador confesso de Pinochet e da sua Constituição de 1980. O resultado é um novo texto, semelhante ao atual, que mantém a essência do modelo do ditador.

"Tenho a sensação de que o país também vai rejeitar agora a nova proposta de Constituição porque foi capturada por um grupo de ultradireita, minoria no país. A extrema-direita pretendia participar do processo para bloqueá-lo por dentro, mas, de repente se viu em maioria. A nova proposta é exatamente o contrário daquilo pelo qual se lutou em 2019.", avalia.

"O melhor que poderia acontecer agora é que a nova proposta seja rejeitada. Assim, o processo constituinte continuará aberto porque nada foi resolvido. Vamos ter de continuar com a Constituição de Pinochet, mas essa é mais fácil de ser combatida depois", conclui Jorge Baradit.

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