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"Fantasmas" do narcotráfico na Galiza visitam políticos no ativo

O jornalista espanhol Nacho Carretero, autor do livro 'Farinha', sobre o tráfico de droga na Galiza disse à Lusa que "fantasmas" do passado podem afetar intenções de Alberto Nuñes Feijóo para a eventual liderança do Partido Popular.

"Fantasmas" do narcotráfico na Galiza visitam políticos no ativo
Notícias ao Minuto

08:33 - 12/06/18 por Lusa

Mundo Nacho Carretero

"Feijóo tinha quase conseguido esconder esse 'morto'. O assunto 'Farinha' que foi quase um fenómeno cultural há uns anos na Galiza voltou a aparecer-lhe em frente e de uma forma muito clara", disse à Lusa Nacho Carretero, referindo-se à eventual candidatura do presidente da Xunta da Galiza à liderança do Partido Popular espanhol, depois da saída de Mariano Rajoy.

Ao longo do livro 'Farinha' (termo utilizado pelos traficantes de droga para designar cocaína) são abordadas as relações entre os contrabandistas e traficantes com os políticos locais desde o período do contrabando de tabaco até ao caso tornado público em 2013 das fotografias (datadas de 1995) do atual presidente da Xunta da Galiza, Alberto Nuñes Feijóo, do Partido Popular com Marcial Dorado, conhecido contrabandista galego.

"Se Feijóo pensa em voos mais altos como parece que pretende, no mínimo, vai ter de enfrentar a oposição com o assunto - o que já está a acontecer - e questiono-me se vai ser possível esconder esse 'cadáver' que tem atrás dele", sublinha o autor do livro e jornalista do El País acrescentando que, em concreto, pode ser "complicado" explicar as amizades do passado.

"Vejo que (Feijóo) está numa situação muito difícil porque alguém que pretende ser líder de um partido de poder na União Europeia vai ter de explicar porque era amigo de um 'capo' do contrabando e do narcotráfico da Galiza e essa explicação é muito difícil", afirma Carretero.

Mesmo assim, o autor do livro que foi apresentado na segunda-feira em Lisboa recorda que quando as fotografias foram tornadas públicas, Feijóo voltou a ganhar as eleições regionais e com maioria absoluta. O que pode indicar que, pelo menos, na Galiza pode ainda haver uma certa tolerância.

Para o jornalista espanhol que recorda que o noroeste da Península Ibérica foi nos anos 1980 o maior ponto de entrada da cocaína colombiana na Europa, as atividades criminosas relacionadas com o tráfico de droga contaram durante muito tempo com a "convivência" não só da sociedade, mas também do poder político.

"Sem a permissividade do poder, o fenómeno criminal não tem êxito, tal como vemos em Itália. Na Galiza, a política não deu importância ao fenómeno e por isso beneficiou desta atividade que no limite é uma atividade económica gigantesca. Portanto, o assunto é político, a responsabilidade é política e é justo que Feijóo tenha de dar explicações porque pertence a uma classe política e a uma geração política que esteve demasiado perto dessa realidade e que a encarou com normalidade", frisa.

No passado mês de fevereiro, um tribunal de Madrid ordenou a retirada do livro "Farinha" das livrarias espanholas na sequência de um processo interposto por Jose Allfredo Bea Gondar, ex-presidente da Câmara de O Govre (Pontevedra) referido pelo autor como tendo estado envolvido num desembarque de cocaína na Galiza.

O autor refere que a proibição da venda do livro foi "desproporcionada" e ocorreu na mesma altura em que era exibida a série de televisão "Farinha" baseada na investigação que chegou a esgotar dez edições.

"Muitas pessoas ainda não veem a real dimensão do assunto", lamenta Nacho Carretero que elogia o papel dos jornalistas da Galiza durante os anos "mais duros" do narcotráfico ao contrário de outros "protagonistas" da sociedade galega.

"O que mais me chamou a atenção foi o poder que os narcotraficantes alcançaram na Galiza. Um poder 'mafioso'. Chegaram a estar dentro das instituições. Houve autarcas narcotraficantes, políticos muito ligados às atividades de contrabando e narcotráfico e esse poder foi travado como num jogo de futebol: no último minuto com a Operação Nécora, desencadeada no dia 12 de junho de 1990 pelo juiz Baltazar Garzón, e que impediu a Galiza de chegar aos níveis que se vivem ainda hoje na Sicília. Seria muito duro voltar a recuperar as instituições", afirma o jornalista, de origem galega.

No livro, o autor cita fontes jornalísticas, policiais e judiciais para fazer o historial do tráfico ilegal de cocaína e haxixe, uma atividade ilegal -- "que ainda se mantém ativa" - e que teve como origem o contrabando de tabaco desde meados do século XX e de todo o tipo de produtos que caracterizaram as várias fases das redes de contrabando com o norte de Portugal.

'Farinha', de Nacho Carretero (Edições Desassossego, 303 páginas) inclui mapas, uma lista com as biografias dos principais narcotraficantes galegos e infografias sobre as lanchas rápidas utilizadas no transporte da droga entre os navios em alto mar e a costa galega.

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