Enurese: Quando a criança faz chichi sem querer (e o impacto emocional)

Esta terça-feira, assinala-se o Dia Mundial da Enurese. O Lifestyle ao Minuto falou com a psicóloga clínica Joana Santos para saber mais sobre esta condição que afeta os mais novos e pode trazer diversas consequências emocionais e não só.

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Adriano Guerreiro
27/05/2025 09:30 ‧ ontem por Adriano Guerreiro

Lifestyle

Enurese

Urinar de forma involuntária durante a noite pode não ser apenas uma fase e estar relacionado com a altura do desfralde. Para algumas crianças, é algo que se repete durante a semana, pode estar relacionado com outro tipo de condições e até trazer consequências a curto e longo prazo.

 

Esta terça-feira, assinala-se o Dia Mundial da Enurese. O Lifestyle ao Minuto falou com Joana Santos, psicóloga da Clínica de Psicologia Filipa Maló Franco, para perceber mais sobre esta condição, do que se trata, que desafios têm os pais e os possíveis tratamentos.

"A enurese é a perda involuntária de urina, seja na cama ou na roupa, que acontece pelo menos duas vezes por semana, durante um período mínimo de três meses consecutivos, em crianças com mais de 5 anos de idade", começa por dizer Joana Santos.

Explica que é algo que pode ser confundido com o desfralde e é importante os pais estarem atentos. "Pode surgir associada a um desfralde feito demasiado cedo, sem respeitar o ritmo e sinais de prontidão da criança."

É importante ser acompanhada e tratada para evitar problemas mais tarde. "No plano emocional, pode ter impacto na autoestima, provocar sentimentos de vergonha, ansiedade e até levar ao isolamento social."

Notícias ao Minuto Joana Santos é psicóloga na Clínica de Psicologia Filipa Maló Franco© Clínica de Psicologia Filipa Maló Franco  

Como podemos definir a enurese?

A enurese é a perda involuntária de urina, seja na cama ou na roupa, que acontece pelo menos duas vezes por semana, durante um período mínimo de três meses consecutivos, em crianças com mais de 5 anos de idade. Esta situação pode ser primária, quando a criança nunca chegou a controlar o chichi, ou secundária, quando, depois de já ter conseguido, volta a ter perdas. A enurese noturna pode ainda ser monossintomática, apenas perda de urina, ou não monossintomática, quando se verifica em conjunto com outros sintomas como, por exemplo, obstipação e perdas diurnas. O tipo de enurese importa para o delinear da intervenção e para a escolha das estratégias terapêuticas.
 
É algo que só acontece durante a noite ou também pode acontecer durante o dia?

Pode acontecer durante a noite, chamada enurese noturna, ou durante o dia conhecida como enurese diurna.

Na enurese diurna, as causas mais frequentes passam por infeções urinárias recorrentes, alterações anatómicas do trato urinário ou obstipaçãoQual é a prevalência em Portugal? Quantas crianças estima-se que sejam afetadas?

Em Portugal, os estudos sobre prevalência ainda são escassos, mas os dados disponíveis acompanham as tendências internacionais variando entre os 6% e os 16%. Por exemplo, um estudo realizado em 15 hospitais portugueses indicou a prevalência global de 6,9% sendo mais frequente em rapazes (9,4%) do que em raparigas (4,3%).

Quais são as causas mais comuns?

As causas da enurese são variadas. No caso da enurese noturna, podem incluir produção excessiva de urina durante a noite, baixa produção da hormona antidiurética, capacidade reduzida da bexiga, sono muito profundo, fatores genéticos, o histórico familiar é relevante, imaturidade do sistema nervoso e fatores emocionais. Já na enurese diurna, as causas mais frequentes passam por infeções urinárias recorrentes, alterações anatómicas do trato urinário, obstipação, problemas de funcionamento da bexiga e situações de ansiedade e stress.

Leia Também: Apagão. Como é que esta adversidade mexeu com as nossas emoções?

Em que idades é mais frequente?

É mais comum a partir dos 5 anos, já que antes dessa idade a criança está ainda dentro do período normal para aprender a controlar o chichi. Com o desenvolvimento e maturação, a maioria das crianças adquire esse controlo, fazendo com que a prevalência da enurese diminua progressivamente com a idade.

Pode estar relacionado com o processo de desfralde?

A enurese pode surgir associada a um desfralde feito demasiado cedo, sem respeitar o ritmo e sinais de prontidão da criança. Se a criança não se sentir preparada e for pressionada, pode começar a evitar ir à casa de banho, o que aumenta o risco de infeções e de alterações no funcionamento da bexiga.

Pode haver confusão com a fase do desfralde?

É natural que, no início do desfralde, os pais se sintam inseguros ou confusos. Contudo, se este processo decorrer de forma respeitadora, atenta aos sinais de prontidão física, neurológica e emocional da criança, tende a decorrer com tranquilidade. Mesmo assim, pequenos "descuidos" fazem parte e só devem suscitar preocupação se forem persistentes ou se surgirem retrocessos acentuados.

Ainda é um tema tabu ou desvalorizado?

Infelizmente, sim. Muitas vezes encara-se como "normal" ou "uma fase". Apesar de existir uma taxa de recuperação espontânea de cerca de 15% ao ano, é fundamental sinalizar e acompanhar a situação, de forma a prevenir problemas físicos e emocionais.

Quando devem os pais procurar ajuda?

Se aos 4 anos não houver sinais de prontidão para o desfralde, é recomendável fazer uma avaliação. Aos 5 anos, se não existir controlo diurno ou noturno, torna-se importante procurar apoio especializado. Mesmo sabendo que há variações individuais, é preferível despistar eventuais causas e garantir o bem-estar da criança.

Como se faz o diagnóstico?

Deve começar pelo pediatra, que pode depois encaminhar para outras especialidades, como urologia pediátrica, fisiatria pediátrica ou fisioterapia pélvica infantil. Quando a enurese é secundária, deve também ser feita uma avaliação do lado emocional, com apoio da psicologia infantil, já que fatores psicológicos podem ter um papel relevante.

De que forma este problema pode afetar a criança?

Do ponto de vista neurológico, a enurese pode associar-se a outras situações, como diabetes, epilepsia, défice de atenção/hiperatividade ou atraso no desenvolvimento neurológico. No plano emocional, pode ter impacto na autoestima, provocar sentimentos de vergonha, ansiedade e até levar ao isolamento social, além de afetar a dinâmica familiar e a relação com os pares.

A enurese é involuntária e não resulta de birra ou preguiçaE quanto ao tratamento?

Existem situações de imaturidade neurológica que se resolvem naturalmente, mas é sempre essencial avaliar bem as causas. Quando se trata de enurese primária sem outros sintomas associados, o uso de alarme noturno costuma ser a primeira opção, sendo frequentemente eficaz. Estes dispositivos emitem um sinal sonoro ao detetar humidade, ajudando a criança a associar a vontade de urinar ao acordar. Em alguns casos, sobretudo quando há produção excessiva de urina durante a noite ou quando o alarme noturno não resulta, pode recorrer-se a medicação, nomeadamente à desmopressina. A medicação deve ser sempre utilizada sob orientação médica e, idealmente, integrada numa abordagem global. O mais importante é que a decisão sobre o tratamento, seja ele comportamental, farmacológico ou combinado, seja partilhada entre a família e a equipa de saúde, tendo em conta as necessidades e características de cada criança.

O que podem os pais fazer em casa?

Acima de tudo, nunca devem punir, comparar ou pressionar a criança. A enurese é involuntária e não resulta de birra ou preguiça. É essencial oferecer compreensão, tranquilidade e apoio, evitando atitudes que possam aumentar a ansiedade ou afetar a autoestima da criança.

Deve ser partilhado com a escola ou creche?

Sim, sem dúvida. Um ambiente de abertura e colaboração facilita muito a gestão destas situações. Além disso, é importante que os educadores saibam que a criança não consegue "aguentar mais cinco minutos" se tiver vontade de urinar, para que possam ser sensíveis e colaborativos.

Existe alguma forma de prevenir?

Embora algumas causas sejam de origem orgânica ou genética e, por isso, inevitáveis, há cuidados preventivos que podem ajudar. Respeitar o ritmo da criança no desfralde, garantir boa ingestão de água ao longo do dia, evitar alimentos e bebidas irritáveis, como chocolates ou refrigerantes, promover bons hábitos miccionais, ir regularmente à casa de banho e não reter o chichi, e estar atento a situações emocionais exigentes, como o nascimento de um irmão ou a mudança de casa ou de escola, são estratégias importantes para minimizar o risco de enurese ou prevenir o seu agravamento.

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