Encenador Tónan Quito apresenta 'Oresteia' no CCB no sábado
Trabalhar o indivíduo, no contexto da sociedade, foi o que mais interessou ao encenador Tónan Quito, na construção de "Oresteia", de Ésquilo, que se estreia no sábado, no Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa.
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Cultura Teatro
"O que me interessava mais trabalhar era como o indivíduo se revela no contexto da sociedade e não enquanto indivíduo", trabalhar "a questão do incontrolável", explicou hoje à agência Lusa Tónan Quito, no final de um ensaio de imprensa da peça.
Daí, o trabalho em conjunto, com o coro, nesta encenação que conta com música original dos Dead Combo. "A questão do incontrolável é mais fácil de trabalhar com um coro, dado que, mesmo que alguém se engane, a máquina não para", referiu Tónan Quito, sublinhando que também o dramaturgo da Grécia Antiga, autor da trilogia que compõe a 'Oresteia', se interessou mais pelo coro do que, propriamente, por cada personagem.
Num cenário despojado e delimitado por grandes cortinas brancas transparentes, que permitem ver os atores a vestirem-se e a despirem-se ao fundo do palco, as personagens vão cantando em coro as falas da tragédia, ao mesmo tempo que vão discorrendo sobre temas da Grécia Antiga que continuam atuais.
'Oresteia' é uma peça política, como admitiu Tónan Quito, que levanta questões como a construção da democracia, a justiça e o relacionamento entre os homens e entre estes e os deuses.
O facto de Atena não ter conseguido julgar o caso de um mortal, colocando-os a todos a julgarem-se uns aos outros, e instituindo assim o primeiro tribunal, foi uma das partes da tragédia que fascinou o diretor do espetáculo, como o próprio admitiu.
Sublinhou que mais do que contar a história de Efigénia ou de Agamémnon, o que Ésquilo pretendeu com esta trilogia foi questionar a sociedade grega, que se encontrava em transformação, e a própria democracia que começava a ser desenhada.
Outro dos pontos desta tragédia que interessou a Tónan Quito trabalhar foi o facto de as Erinas se transformarem em Euménides, na tragédia -- "o grande sim da peça", como lhe chama --, e que mostra como é possível ter "um querer", "uma vontade".
"Nós não queremos mais ser as maldições [Erinas], queremos sim que o povo de Atenas nos sirva e nós servimos o povo de Atenas", exemplifica o diretor do espetáculo, considerando que esta transformação é " muito importante", sobretudo porque se passa de uma coisa negativa para uma positiva.
Uma qeustão que, para Tónan Quito, é muito importante na sociedade atual já que "os homens passam a vida a dizer que não, que não querem as coisas que se passam, mas que poucas vezes fazem alguma coisa para mudar o rumo dos acontecimentos", referiu.
É a questão dos "homens-marionetas, que têm vontades, mas ainda não têm vontade", frisou, acrescentando que esta ausência de vontade tem muito a ver com a noção de destino.
"Nesta peça os humanos questionam muito a questão do destino. Sabem que têm de fazer determinadas coisas, mas questionam-se sobre o porquê de ter de as fazer", frisou.
Assim, o coro é o ponto fulcral desta peça e é precisamente dos cinco elementos que compõem o coro, que cada ator vai depois saindo para desempenhar a sua personagem. Um coro que é uma voz e que está em constante questionamento em constante mutação.
A contrastar com o branco do cenário, existe apenas o vermelho das romãs, que vão sendo partidas e trituradas ao longo do espetáculo, simbolizando sangue.
Uma das especificidades da peça - que dura duas horas e quarenta minutos -- reside no facto de todos os atores usarem uma espécie de máscara de maquilhagem, que lhes tapa o rosto, precisamente para anular o valor individual da cada um e para que o espetador veja a história e não a forma como os atores desempenham as personagens.
"Oresteia" tem música ao vivo dos Dead Combo, que foram convidados para o projeto e que, apesar de já terem feito música para teatro, se estreiam, agora no género tragédia.
Pedro Gonçalves disse que a "grande dificuldade" de compor para 'Oresteia' residiu em perceber "o que é uma tragédia em termos de música".
"Tentar arranjar um espaço, uma cor ou uma coisa qualquer que encaixasse" nos versos de Ésquilo foi o grande desafio para o duo, acrescentou Pedro Gonçalves.
Tó Trips explicou à Lusa que estiveram ambos, durante duas semanas, em dezembro, a ler a peça, "a pesquisar, a descascar o texto, que é super difícil".
À partida, ainda tentaram colocar a música à parte, mas depois viram que não funcionava, acrescentou Pedro Gonçalves. O que fez com que estivessem no projeto desde o início, o que foi uma experiência nova para os músicos, segundo Tó Trips.
"Uma experiência enriquecedora e gratificante", disseram ambos à Lusa.
Com versão e dramaturgia de Miguel Castro Caldas, a partir da tradução de Manuel de Oliveira Pulquério e de José Pedro Moreira - e consultadas as traduções e versões de Robert Fagle, Ted Hughs, Tony Harrison e Pier Paolo Pasolini -, 'Oresteia' tem interpretação de Cláudia Gaiolas, Francisco Carracho, Isabel Abreu, Miguel Borges, Tónan Quito e Vera Mantero.
A cenografia é de F.Ribeiro e o figurino, de José António Tenente. A peça é uma coprodução do CCB com a HomemBala.
'Oresteia' vai ter sete récitas, a partir de sábado: todos os dias, de 17 a 24 de fevereiro, às 21:30, exceto no domingo, dia 18, com início da sessão às 16:00.
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