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"É difícil chegar à presidência, mas vamos atirar-nos à vereação"

A candidata do PAN - Pessoas-Animais-Natureza é a entrevistada de hoje do Vozes ao Minuto, onde revela de que forma pretende marcar a diferença no executivo municipal de Lisboa.

"É difícil chegar à presidência, mas vamos atirar-nos à vereação"
Notícias ao Minuto

25/07/17 por Andrea Pinto

Política Inês Sousa Real

Poderá ser para muitos uma cara pouco conhecida, mas a candidata do PAN à Câmara Municipal de Lisboa, já está há muito ligada às causas dos animais. Provedora dos animais até abril deste ano, Inês Sousa Real foi convidada a encabeçar a lista do Partido das Pessoas-Animais-Natureza e tentar fazer chegar à vereação um elemento que permita defender os princípios pelos quais se regem os defensores destas causas.

Esta é uma candidatura que, assume com humildade, dificilmente a levará à presidência, mas que com ambição a poderá fazer chegar a um lugar de vereação. O facto de não ser tão conhecida quanto os seus adversários não a assusta, até porque, considera, as pessoas estão “insatisfeitas com a forma tradicionalista de se fazer política”.

Como surgiu a oportunidade de se candidatar à Câmara Municipal de Lisboa ?

Foi um desafio que me foi lançado pelo PAN de Lisboa. Como é do conhecimento público eu já tinha cessado funções no início do ano enquanto Provedora dos Animais. E antes de exercer funções como provedora já era militante do PAN e, no fundo, foi uma forma de dar continuidade ao percurso e às causas não só do partido como as que já vinha defendendo. Foi nesse seguimento que surgiu este convite e que acabei por aceitar como uma forma de dar continuidade a um projeto e a valores com os quais me identifico.

Acima de tudo, queremos uma cidade para as pessoas. Mas não podemos ter um executivo de costas voltadas às restantes temáticas, como os animais ou o ambienteComo disse, foi provedora e é, portanto, uma assumida defensora dos direitos dos animais. Posto isso, quem vai estar na linha da frente das suas prioridades: as pessoas ou os animais?

Não significa de todo que sejam os animais ou as pessoas que sejam a nossa prioridade. Temos uma visão integradora e, acima de tudo, queremos uma cidade para as pessoas. Mas não podemos ter um executivo de costas voltadas às restantes temáticas, como os animais ou o ambiente. Hoje em dia é impossível não ter a consciência de que todas as políticas estão interligadas e quando pensamos em questões como a mobilidade, a habitação ou os transportes temos de pensar também no impacto que essas medidas vão ter no ambiente e até na proteção da nossa biodiversidade. Isto não quer dizer que não se deva considerar em primeiro plano uma cidade para as pessoas e trazer os lisboetas de volta à sua cidade, mas obviamente que isso não quer dizer que não se crie a preocupação que deve existir para com os animais que partilham connosco a cidade. Pretendo trazer esta visão para cima da mesa e para o debate, que é algo que também falta.

Diz que é com humildade que está na corrida pela autarquia lisboeta. Significa isso que está ciente de que uma vitória será muito difícil?

Temos que olhar para os resultados que nos antecederam. Nas últimas autárquicas, o Bloco de Esquerda ficou a poucos votos de conseguir eleger um deputado. Temos que pegar nessa experiência e nesses números para perceber a dificuldade em alcançar a presidência da Câmara. Isso não quer dizer que não ganhando a presidência que não estejamos mais do que aptos e comprometidos com esse resultado. Contudo, olhando para os resultados anteriores temos consciência da dificuldade que é conseguir se calhar a presidência, mas pelo menos vamos atirar-nos à vereação porque temos a noção que, apesar de ser difícil, é possível obtermos um lugar de vereação. E vamos lutar muito por isso porque acreditamos que podemos fazer a diferença no executivo municipal.

Irá concorrer lado a lado com nomes já bastante conhecidos do panorama político, como Fernando Medina, Assunção Cristas, Teresa Leal Coelho… Acha que parte em desvantagem?

Pelo contrário. Acho que é uma vantagem porque as pessoas estão muito insatisfeitas com a forma tradicionalista de se fazer política. Apesar de não ser conhecida como os restantes concorrentes, acho que as pessoas, cada vez mais, se aproximam de novas forças políticas como o PAN porque se revêm nesta visão mais integradora e na possibilidade de mostrar o que somos e o que defendemos e de não nos conotarmos nem com os velhos paradigmas de Esquerda e de Direita, nem com os velhos debates políticos, mas com uma nova forma de colaborar em prol da construção da cidade. Existem aspetos negativos, que é o de se calhar não ser tão conhecida, mas há outros bastante positivos que é no fundo estarmos aqui a trilhar um caminho novo que é a nossa perspetiva do que queremos trazer à cidade. Temos que encarar isso como um desafio e não como uma dificuldade.

É muito importante haver uma perspetiva de vitória para o Partido Socialista em que não lhe seja dada uma maioria absolutaEstando ciente de que não vencerá a presidência, e analisando os seus adversários, quem é que acha que segue na frente desta corrida?

Acho que existe toda uma conjuntura na leitura política. É difícil que atuais executivos não ganhem numa segunda volta quando se candidatam novamente às autárquicas e se calhar, por causa disso, acredito que vai ser o Partido Socialista que vai recuperar a Câmara Municipal e dar continuidade ao seu trabalho. No entanto, é muito importante aqui haver uma perspetiva de vitória para o Partido Socialista em que não lhe seja dada uma maioria absoluta. A gestão absolutista de outros executivos tem-nos demonstrado um forte distanciamento e capacidade de integrar outras visões para a cidade, de cooperar, ou permitir, através de outras forças políticas, que se traga para o debate preocupações de outros cidadãos, apesar de serem de outros quadrantes políticos. Apesar de poderem vir a ganhar esperamos que não seja com maioria absoluta para poder colaborar e trabalhar com os outros partidos, que também têm um papel muito ativo e também querem colaborar para a nossa sociedade.

O PAN tem estado a crescer em termos de representação. Acha que isso está relacionado com o facto de as pessoas realmente se reverem nos vossos princípios ou porque estão cansadas das políticas dos restantes partidos portugueses?

Acho que é uma combinação de ambos os fatores. As pessoas identificam-se efetivamente com esta visão integradora do PAN, que inclui as três vertentes das pessoas, animais e natureza, mas também estão bastante cansadas destas políticas que são bastante opacas, não são transparentes. Existe uma grande dificuldade de integração das pessoas com a política porque veem uma grande dificuldade de acesso à informação que muita vezes não é compreendida e aqui, deixe-me fazer um paralelismo com uma das nossas iniciativas, porque queremos mais transparência e participação nos órgãos municipais e inclusive junto das Juntas de Freguesia ou nas empresas municipalizadas. As pessoas não compreendem determinadas políticas que são postas em prática, e ao não compreenderem é normal que não se identifiquem. No PAN defendemos esta abertura. Somos um partido de causas e valores e não tanto de orientação política como os demais e é normal que as pessoas sintam uma maior empatia e proximidade porque no fundo acabamos por estar mais próximos das pessoas.

Quando fala da falta de acesso a informações, a que tipo de informações se refere?

Desde logo aos contratos públicos que são formulados. Recentemente saiu até uma notícia que falava da falta de opacidade e de transparência dos contratos celebrados pela própria Câmara Municipal e a Associação de Turismo de Lisboa, nomeadamente do próprio património que era transferido de uma entidade para a outra. Portanto, na gestão do dia a dia da Câmara Municipal e das Juntas de Freguesia há muita informação que não está disponível, seja as informações que vão às reuniões de Câmara ou das Juntas de Freguesia, a possibilidade dos munícipes participarem nas assembleias das juntas . Em todo o processo decisório acaba por não haver informação à disponibilidade dos cidadãos. Nós estamos a propor-nos a ser trabalhadores para os cidadãos e portanto temos que ter a informação, de forma amigável, colocada quer nos sites dos diferentes órgãos municipais para acima de tudo também descentralizar e criar grupos de trabalho a nível mais local nas freguesias e permitir que as pessoas participam e percebam todo o processo decisivo.

Qual o objetivo do executivo ao não disponibilizar essa informação?

Seria precipitado dizer qual é o objetivo, mas acho que tem a ver com uma máquina burocrática que muitas vezes é bastante pesada e acaba por não facilitar ou não ser mais amigável para com o cidadão. Desconheço qual o objetivo, mas acredito que não há muitas vezes aqui o rasgo de pensar de forma diferente e ver como é que nos podemos aproximar novamente ou reaproximar dos munícipes. Portanto, isso terá que ser o próprio executivo a responder à pergunta mas essencialmente temos que nos perguntar como é que nós podemos colaborar para combater esses fenómenos.

Referiu-se à necessidade de acabar com “os sucessivos governos de maioria absoluta”. Que críticas tem a apontar ao Governo PS que liderou nos últimos anos a autarquia lisboeta?

Desde logo esta ausência de possibilidade de colaboração entre as forças político-partidárias e a integração das suas visões. Temos inúmeras recomendações da própria Assembleia Municipal que acabam por não ser acolhidas pelo executivo. Temos inúmeras decisões que acabam por ser decididas exclusivamente pela força do PS, e isso nota-se quer nas deliberações da Câmara como da Assembleia Municipal. Acho que hoje em dia tem de haver uma cooperação a nível da decisão, aceitar a diferença e tentar integrá-la para melhor corresponder às necessidades reais dos cidadãos. E aí há esta critica que tem de ser apontada.

Recentemente, com os grandes problemas de mobilidade que assistimos na cidade de Lisboa e que foi uma decisão deste governo socialista e que foi um bocadinho como começar a casa pelo telhado: começámos por mexer nas obras da cidade sem primeiro acautelar que havia transportes públicos para chegar até às pessoas. Isto foi uma decisão exclusivamente deste executivo. Se tivesse em consideração os alertas, o posicionamento dos outros partidos políticos, isto não teria acontecido e não estaríamos hoje a deteriorar a qualidade de vida dos lisboetas e até a retirá-los da cidade de Lisboa. Obviamente que há aspetos positivos nas obras que foram feitas, como em todas as gestões seja qual for o executivo, há sempre ponto positivos a apontar. Mas também temos que ter a capacidade de identificar os aspetos que nos permitam melhorar a nossa cidade.

Não nos podemos deixar deslumbrar por este boom turístico permitindo que se afaste os lisboetas de LisboaConcorda então com as queixas feitas por muitos moradores da cidade que consideram que a autarquia está a privilegiar os turistas e a levar os moradores a sair da cidade?

Essa é de facto uma critica a apontar a este executivo. Obviamente que é importante o turismo do ponto de vista económico e da recuperação e reabilitação da própria cidade, mas não nos podemos deixar deslumbrar por este boom turístico permitindo que se afaste os lisboetas de Lisboa. A cidade é antes de mais das suas pessoas e tem que ser repensado como é que podemos abrandar este fluxo turístico. Existem várias medidas que podem possibilitar essa situação, através por exemplo dos voos permitidos para a cidade ou diminuindo o fluxo turístico nos portos. Tem que se repensar numa nova estratégia que não afaste os lisboetas da nossa cidade seja ao nível da habitação, dos transportes…todo o turismo tem condicionantes. Hoje temos filas de espera para os autocarros, para os elétricos ou para o metro. É inconcebível uma cidade intransitável ou que não pode sequer ser vivida pelas suas pessoas. Temos que devolver Lisboa aos lisboetas.

Parte dessa governação foi liderada por António Costa que entretanto passou a ser primeiro-ministro. Como avalia a governação do mesmo neste novo cargo?

Parece-me que a Geringonça é um exercício feliz da democracia. E essa é a crítica que apontamos em termos do executivo municipal, que é a capacidade de integrar novas forças políticas e ouvir outros parceiros que não estão na coligação, como o PAN, que também tem sido ouvido em termos da Assembleia da República e têm sido acolhidas algumas medidas que temos proposto a este Governo. Esse é um exercício de democracia que é bastante interessante e que poderá resultar em alguns aspetos positivos. Não se quer dizer que se concorde com tudo, obviamente. Mas tem sido de salutar esse exercício. Há também outros aspetos que não queremos descurar e episódios recentes como Tancos ou Pedrógão Grande lembram-nos disso. Temos que permanecer vigilantes e ativos a nível de aspetos que ainda há a melhorar a nível nacional. E esse exercício seria também interessante e curioso de aplicar às Câmaras Municipais porque todas as forças políticas devem trabalhar em conjunto e não em oposição, daí que se tenha que mudar o paradigma político em que vivemos hoje.

Em entrevista ao Notícias ao Minuto, o André Silva, líder do partido, afirmou que uma coligação com os partidos de Direita ou Esquerda era algo praticamente impensável porque o PAN “tem ideias muito próprias, uma forma de fazer política diferente”. Essa ideia continua a prevalecer?

Penso que sim. Efetivamente prevalece pela razão de que existem eixos estruturais no nosso ideário que não existe em mais nenhum partido. Posso dar um exemplo muito claro, no caso de Lisboa, tivemos o episódio da questão dos apoios institucional da Associação de Turismo de Lisboa (ATL) à tauromaquia e fomos críticos em relação a isso. O próprio presidente Medina veio dizer que não havia apoio institucional quando havia, ou seja, não tomou qualquer medida para mudar os estatutos da ATL ou nem sequer colocou em cima da mesa a hipótese de sair do Turismo de Lisboa caso continuássemos a permitir que uma entidade que promove corridas de Touros no Campo Pequeno fizesse parte deste órgão. Isto é um exemplo do confronto do ideário do PAN que não é acompanhado pelos outros partidos. Apontámos recentemente também outra iniciativa nossa para Lisboa que é a questão do EcoParque que se distancia completamente da Feira Popular e que neste caso vai até pôr em causa um eixo verde já existente na cidade e que integra o plano de biodiversidade com a construção da Feira que já esta a ser executada. Obviamente que há divergências mas isso não quer dizer que não há cooperação. E a perspetiva do PAN é sempre colaborar mas temos as nossas próprias ideias e vamos a jogo e aceitamos o desafio de ir a jogo sozinhos.

As pessoas têm de compreender que não somos um partido de monocausas porque isso seria uma visão muito redutoraPegando na questão da tauromaquia, o Campo Pequeno é, em Lisboa, a grande sala deste tipo de espetáculos. O que é que o PAN pretende fazer em relação a isso?

As Câmaras não podem ainda proibir a realização de corridas de touros e digo, ainda, porque está em curso a descentralização de competências, portanto, tenho a certeza de que virá o dia em que podemos proibir a realização destes espetáculos e o que os munícipes podem efetivamente fazer é abster-se de prestar qualquer apoio constitucional a estas atividades. Desde logo não só porque está em causa o desrespeito pela integridade física e pelo nosso zelo pelos animais como também está em causa os nossos valores humanitários.

Como candidata, o nosso compromisso é fazer o que estiver ao nosso alcance para que deixem de existir corridas de touros no Campo Pequeno. Estamos a falar de um edifício privilegiado no centro da cidade que pode ser utilizado para outras atividades impressionistas até do ponto de vista do desenvolvimento económico e social e, portanto, não faz sentido que se perpetue os aspetos daquela atividade no coração da cidade de Lisboa em detrimento de outras atividades mais sociais e até culturais. A nossa ideia é transformá-lo num centro de congressos ou de espetáculos completamente diferentes. E é esse o nosso compromisso: achamos que as políticas têm de ser congruentes com a ética dos nossos tempos e defendemos que deixe de haver corridas de touros na capital. Não queremos tauromaquia na cidade de Lisboa de todo.

O facto de se pensar que o PAN é só 'o partido dos animais' joga contra vocês na hora de votar? De que forma pretendem mudar essa imagem?

Acho que efetivamente pode jogar no sentido em que as pessoas têm de compreender que não somos um partido de monocausas porque isso seria uma visão muito redutora que traríamos para a sociedade e não é essa a nossa visão. Temos que desmistificar essa ideia preconcebida que existe em relação ao partido. Obviamente que a nossa génese é animalesca porque surgiu numa época em que os direitos dos animais não eram considerados pelas diferentes forças políticas, nem na Assembleia da República, e na crescente preocupação da sociedade. É preciso ter uma visão integradora destas causas porque estamos todos interligados. Quando falamos de violência doméstica, muitas vezes são crimes praticados também contra animais no seio da violência, e aqui estamos a falar de pessoas e animais. E quando falamos do ambiente também falamos de pessoas e animais. E é essa mensagem que queremos transmitir porque hoje em dia é impossível não pensar no impacto que qualquer política tem, tendo uma visão integradora. Aquilo que aconteceria [antes do PAN] é que era apenas prioritário as pessoas, ou em alguns casos nem são as pessoas. Aquilo que acontece muitas vezes é que as políticas são vistas numa perspetiva economicista , tirando muitas vezes a qualidade da vida das pessoas. Temos de mudar o paradigma das políticas para serem mais integradoras e que respeitem mais a nossa causa comum.

*Pode ler a segunda parte desta entrevista aqui

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