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Merkel caminha para quarto mandato. O que fará Schulz?

Alemanha vai hoje a votos e a vitória de Angela Merkel sem maioria parlamentar é o cenário mais provável. Martin Schulz tem em mãos a difícil tarefa de continuar ou não na sombra da CDU. Pela primeira vez desde o final da Segunda Guerra Mundial, é expectável que um partido de extrema-direita chegue ao Bundestag.

Merkel caminha para quarto mandato. O que fará Schulz?
Notícias ao Minuto

08:30 - 24/09/17 por Pedro Bastos Reis

Mundo Alemanha

Quando regressou à política alemã, depois de 20 anos nos corredores de Bruxelas, o social-democrata Martin Schulz chegou a superar a chanceler Angela Merkel no índice de popularidade, e as intenções de voto, nos primeiros meses deste ano, chegaram mesmo a colocar os dois candidatos taco a taco para disputar a vitória nas eleições legislativas que hoje se realizam.

No entanto, de há uns meses para cá, as sondagens deixaram de ser favoráveis ao Partido Social-Democrata (SPD) e hoje a vitória da União Democrata-Cristã (CDU) é praticamente dada como certa, com a última sondagem, citada pelo The Telegraph, a dar o partido de Merkel com uma vantagem na casa dos 14 pontos percentuais relativamente ao de Schulz.

No poder há 12 anos, Angela Merkel acaba agora de cumprir o seu terceiro mandato na liderança da Alemanha e um quarto aproxima-se cada vez mais. Se é notório algum desgaste da chanceler perante as sucessivas crises do euro e a pressão que lhe é colocada relativamente ao elevado número de refugiados que têm chegado ao país, com críticas dentro do próprio partido, também não deixa de ser de salientar a gestão que tem feito destes mesmos dossiers.

A juntar a isso, a estabilidade alemã é reforçada pelo crescimento económico, estimado em 1,8% para 2017 e o emprego em máximos históricos (a taxa de desemprego é de 4,3% no país). Os 12 anos de governação de Merkel cimentaram ainda a liderança alemã na União Europeia, onde é o país com maior população e maior poderio económico. Se a nível externo a política de Berlim tem sido alvo de críticas, nomeadamente dos países do Sul da Europa, os mais afetados pelas duras medidas de austeridade, internamente parece existir um consenso relativamente ao caminho seguido até agora.

Aliás, não será por acaso que tanto Merkel como Schulz abram a porta a um consenso numa futura coligação. O líder do SPD deixou mesmo o convite a Merkel para que esta seja a sua vice-chanceler. Contudo, tendo em conta que a vitória dos sociais-democratas parece algo improvável, uma das grandes questões após a noite eleitoral será perceber até que ponto Schulz estará disposto a juntar-se a Merkel para governar. Atualmente, recorde-se, SPD e CDU governam a Alemanha numa “grande coligação”.

Várias coligações no horizonte

No boletim de voto, o eleitorado alemão vai encontrar seis partidos. Além da CDU e do SPD, lutam ainda pelo poder a Alternativa para a Alemanha (AfD), o Die Linke, o Partido Liberal (FDP) e os Verdes, precisamente por esta ordem segundo as sondagens.

Hoje, o Bundestag (parlamento federal) é composto por quatro partidos: CDU, SPD, Verdes e Die Linke. Depois de um resultado desastroso em 2013, o FDP, parceiro histórico da CDU em coligações governamentais, procura regressar. Já o partido de extrema-direita AfD  quer chegar ao Bundestag pela primeira vez na sua curta história.

A vitória de Angela Merkel é mais do que provável, apesar de longe de uma maioria parlamentar. Nesse sentido, a confirmar-se a sua vitória, a chanceler terá de procurar aliados para formar uma solução governativa.

Afastados de uma futura coligação com os democratas-cristãos parecem estar, à partida, o Die Linke e o AfD. Nesse sentido, ou Merkel volta a tentar repetir a “grande coligação” com o SDP ou então tenta virar-se para os Verdes, há 12 anos fora do poder, ou para o FDP, historicamente próximo da CDU. Os resultados conquistados por estes partidos serão decisivos.

O primeiro cenário poderá ser o mais óbvio, tendo em conta que é o que atualmente está em vigor e os resultados têm sido positivos, segundo a maioria do eleitorado alemão. Contudo, a entrada em cena de Martin Schulz, que esteve cinco anos à frente do Parlamento Europeu, mudou a abordagem do SPD, que hoje procura romper com a CDU e impor a sua própria política. Por isso, em caso de derrota, Schulz fica numa posição difícil: ou assume a liderança da oposição, que saberá a pouco para quem passou tantos anos em Bruxelas e decidiu voltar agora à política alemã, ou coloca o partido novamente na sombra de Merkel. O que terá a chanceler para oferecer a Schulz? A chave poderá estar na pasta das Finanças, atualmente liderada por Wolfgang Schäuble. Tirando este ministério, pouco ou nada parece suficiente para convencer o líder do SPD a voltar a submeter-se à CDU.

Por seu lado, a coligação com o FDP, caso o partido tenha votos suficientes, será, provavelmente, o cenário ideal para a CDU. Caso os dois partidos, juntos, não consigam a maioria absoluta, os Verdes poderão entrar em cena, no que seria considerada a ‘coligação Jamaica’, uma vez que as cores dos partidos são as mesmas da bandeira jamaicana. Esta solução parece tentadora, mas seria muito complicado conciliar os interesses dos liberais e dos ecologistas. Já uma coligação CDU/Verdes também é uma hipótese. Apesar de nunca ter sido testada a nível nacional, já deu provas a nível regional.

Pouco provável, mas ainda assim a merecer reflexão, será uma ‘geringonça’ alemã. Ideologicamente, o SPD situa-se no Centro-Esquerda, mais ou menos na linha dos Verdes, o que pode ser visto como uma aliança natural. Já o Die Linke, de Esquerda radical, parece um bocado mais distante destes dois partidos, mas um acordo não seria impossível. Ao invés do Die Linke, poderá ainda entrar na equação o FDP, apesar de improvável.

Extrema-direita pode chegar ao Bundestag e ser terceira força política

Se fez as contas ao número de partidos referidos nos cenários acima descritos, certamente terá dado conta de que há um que ficou de fora. Trata-se do AfD, de extrema-direita. As sondagens dão como certa a sua entrada no Bundestag – as intenções de voto no partido estão na casa dos 10%.

Não é difícil perceber o motivo pelo qual o AfD está afastado de qualquer solução governativa. O seu discurso, que tem como alvos principais os refugiados, o Islão e a oposição ao projeto europeu, não condiz com o dos restantes cinco partidos e o seu crescimento exponencial tem gerado enorme preocupação na política alemã.

Apesar de estar excluído do poder, tudo indica que esta será a primeira vez que o AfD terá representação no Bundestag (para lá chegar, os partidos necessitam de pelo menos 5% dos votos). Para lá disso, será a primeira vez, desde o final da Segunda Guerra Mundial e respetiva derrota nazi, que um partido de extrema-direita consegue entrar no parlamento federal.

A juntar a isto, há um um outro fator importante a ter em conta na chegada do AfD ao Bundestag. Sendo ainda incerto que solução governativa será encontrada depois das eleições deste domingo, se o SPD de Martin Schulz for chamado a formar Governo, há fortes possibilidades de o partido de extrema-direita se tornar na principal força da oposição. O impacto é incerto, mas poderá dar muita força ao partido liderado por Alice Weidel e Alexander Gauland.

Formado em 2013 por professores e intelectuais, o AfD insurgiu-se, inicialmente, contra a política europeia. No entanto, com a crise de refugiados, que teve o seu auge em 2015, o partido começou a assumir um discurso cada vez mais nacionalista e a atacar a política acolhedora de Angela Merkel. A proximidade do AfD ao Pegida (Patriotas contra a Islamização da Alemanha) e a grupos neonazis faz temer o pior.

As mensagens de ódio dirigidas, particularmente, ao Islão, têm sido proferidas, essencialmente, por Alexander Gauland, que, contudo, rejeita o rótulo que o liga a grupos nazis. No entanto, defende que as fronteiras da Alemanha devem ser fechadas e considera que o país deve ter orgulho dos seus feitos nas duas grandes guerras, declarações que geraram imensa polémica.

No entanto, não desvalorizando o crescimento da extrema-direita alemã, a política alemã parece estável e, ao que tudo indica, Angela Merkel deverá dar continuidade ao que tem sido feito nos últimos 12 anos. Contudo, desvalorizar o crescimento da extrema-direita é perigoso numa Europa que viu este fenómeno a ter resultados preocupantes em França ou na Holanda. A Economist escreve que, “por agora, a Alemanha continuará como um farol de estabilidade” apesar de “estar a surgir uma nova e diferente era política”.

Hoje, a vitória não deve fugir à CDU, mas o SPD irá assumir um papel fundamental naquilo que será o futuro da Alemanha. Não esquecendo este embate, é de especial importância olhar para os resultados dos pequenos partidos, uma vez que soluções governativas podem advir daí. Segundo as sondagens, o Bundestag deverá ficar composto por seis partidos, pelo que as próximas semanas serão de negociações.

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