"As condições meteorológicas são cada vez mais favoráveis a incêndios de grande dimensão, mas para haver incêndios é necessário que haja ignições. De maneira que a forma de evitar estar nesta situação difícil, e que progressivamente se torna pior, é fazer um esforço muito maior para que haja um mínimo de ignições", disse o responsável à Lusa.
A propósito dos grandes incêndios dos últimos dias, questionado sobre se, com as alterações climáticas, Portugal está condenado a ter cada vez mais incêndios, Filipe Duarte Santos disse que tal só acontecerá se nada for feito, sendo que o que há a fazer é impedir as ignições.
É certo que, disse, as alterações climáticas favorecem condições meteorológicas muito propícias a incêndios rurais, com as temperaturas muito elevadas, um solo muito seco, e este ano sobretudo muita biomassa, por o último inverno ter sido muito húmido.
"Se vamos ter situações cada vez piores depende muito se formos capazes ou não de diminuir o número de ignições, que tem baixado, mas relativamente pouco. Continua a haver muitas ignições por dia, a todas as horas", durante a tarde, noite ou madrugada.
Assim, resumiu o professor universitário e presidente do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, com incêndios cada vez mais perigosos, descontrolados, ventos fortes e humidades baixas, e temperaturas elevadas, "o que seria necessário era praticamente não haver ignições", cuja maioria é de origem humana.
Filipe Duarte Santos disse que há também que resolver outra "situação singular" de Portugal, que é na União Europeia o país com a maior percentagem de área ardida em relação à área total continental.
Citando o Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais (EFFIS na sigla original) Filipe Duarte Santos salientou que em média, de 2006 a 2024, o volume de área ardida representa 1,05% da área de Portugal continental. A seguir surge a Grécia, com 0,38%, e depois o Chipre, com 0,32%.
"Uma das coisas que é necessário compreender é porque é que isto é assim".
O especialista, geofísico de formação, sugere uma explicação: "penso que isso tem a ver com o facto de a propriedade florestal, os prédios rústicos, ter uma enorme fragmentação".
No anterior governo, explicou, foi constituído um grupo de trabalho para a propriedade rústica que concluiu que no país existem 10,5 milhões de propriedades rusticas, sobretudo no centro e norte do país, no centro com uma média de 0,6 hectares de dimensão.
"Isso tira valor económico às propriedades rústicas", disse, referindo ainda que 30% das propriedades são de heranças indivisas, com proprietários espalhados por países como Brasil ou França ou Inglaterra, com muitos herdeiros, dispersos muitas vezes.
"Enquanto não dermos valor económico à propriedade rústica em Portugal, o que muito provavelmente exigirá o emparcelamento, é isto (os incêndios) que vai continuar a acontecer, porque essas parcelas com floresta, ou com mato, estão praticamente abandonadas, e uma coisa que está abandonada não tem valor", alertou.
Portugal continental está, desde domingo e até quinta-feira, em situação de alerta devido ao elevado risco de incêndio. Especialmente desde a última semana os incêndios têm consumido vastas áreas principalmente no centro e norte do país.
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