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Caracas é uma cidade onde todos procuram sobreviver

A capital da Venezuela vai vivendo um caos constante, com vários pequenos protestos um pouco por toda a cidade de Caracas e as pessoas a procurarem soluções para uma hiperinflação que torna o dia-a-dia um inferno.

Caracas é uma cidade onde todos procuram sobreviver
Notícias ao Minuto

22:33 - 15/05/19 por Lusa

Mundo Venezuela

Percorrendo as ruas da cidade, junto à estação de Belas Artes, um pequeno grupo apresentava um pano gigante esta mensagem: "Nem fome nem guerra".

Pouco mais de uma dezena de pessoas, já com o enorme escrito recolhido, explicam que defendem um processo de unidade entre as várias forças políticas da sociedade venezuelana, no sentido da criação de uma plataforma que garanta estabilidade para o futuro.

"Defendemos uma aliança onde caibam todas as forças políticas", explica Gustavo Marquez, que se assume como defensor de um movimento da soberania do povo.

Já na zona centro da cidade, perto da Assembleia Nacional e da Praça Bolívar, largas dezenas de estudantes estão sentados no chão, junto à entrada do Ministério do Poder Popular da Educação Universitária. Reclamam do Estado o pagamento de uma dívida de mais de 1.100 milhões de bolívares à Universidade Simon Bolívar, o que está a ter consequências junto dos alunos ao nível dos transportes e da alimentação nas cantinas.

O presidente da Federação de Estudantes da Universidade Simon Bolívar, Oscar Leon, explica que esta dívida, que acontece desde janeiro, "está a gerar uma paralisação da universidade".

Oscar León denuncia que, desde hoje, a sede da universidade no litoral, em Vargas, fica sem transportes e a partir de sexta-feira é a sede central em Caracas.

"Neste momento apenas 17% dos estudantes é que conseguem deslocar-se, 83% dependem de transportes da universidade a partir de bairros", refere.

"É triste, porque isto não tem nada a ver com um tema de educação, mas é um problema político. Os estudantes procuram manter a luta em cima da mesa e vamos continuar a exigir as nossas revindicações, afirma o dirigente estudantil.

Os protestos não são de hoje. Oscar lembra que uma das vezes que se deslocaram ao Ministério da Educação Universitária foram recebidos por um grupo "violento" de apoiantes do Presidente do país, Nicolás Maduro, mas admitem continuar a subir o tom da luta "até que satisfaçam" as reivindicações dos alunos.

Já junto à Assembleia Nacional, onde estaria a começar uma sessão, com a presença de Juan Guaidó, presidente do parlamento e o autoproclamado presidente interino do país, o acesso de jornalistas estava vedado.

Algumas das ruas estavam controladas por militares, mas mantinham a passagem de peões. Já os jornalistas ficaram bem longe, um quarteirão abaixo, talvez uns 500 metros da entrada da Assembleia Nacional.

Numa pastelaria vê-se uma fila de 20 pessoas na caixa, enquanto mais de uma dezena de empregados aguardam descontraídos, no balcão que mais algum cliente apareça. A explicação é simples, embora difícil de aceitar: como não se consegue comprar nada com moeda local, os bolívares, e como os locais não têm acesso a dólares, os pagamentos são todos feitos com cartão de débito. Por isso, uma fila enorme apenas para se pagar um café.

Este é o dia-a-dia dos venezuelanos, onde o salário mínimo é de 40 mil bolívares (6,89 euros), mas uma garrafa de Coca-Cola custa 20 mil (cerca de três euros e meio). Um país onde se levanta o dinheiro em filas enormes nas caixas de multibanco, mas em que o limite de levantamento diário é de cinco mil bolívares, valor que não chega para pagar dois cafés.

Filas para os transportes são gigantescas, pois são cada vez menos, porque há falta de peças e vão ficando parados.

A dúvida é saber como é que os venezuelanos vivem neste caos. As respostas são sempre engasgadas, mas andam em torno de algumas premissas: apoio de familiares que emigraram, poupança nas necessidades básicas, como comer menos vezes por dia e em menores quantidades, exercer vários trabalhos por dia e o recurso a esquemas ilegais, como o roubo. A prostituição também é referida como atividade cada vez mais visível.

Caminhando pelas ruas da cidade veem-se situações estranhas. Um homem força a passagem numa rua vedada pelos polícias. Gesticula, grita, está indignado: "Que país é este?", pergunta.

Outro, que vende bugigangas na rua, grita para quem quer ouvir: "Somos um país único no mundo. Temos duas assembleias, mas o povo está na miséria".

Junto à entrada da Assembleia Nacional é mais comum surgirem apoiantes do regime de Maduro, atirando-se normalmente aos jornalistas com agressividade: "O que é que vêm para aqui fazer? Esses deputados não mandam nada. Quem manda é Maduro!".

À pergunta habitual, "que acha vai acontecer a este país? Como é que se pode viver assim?", a resposta é também muito comum: "Ai, senhor. Não diga nada. Este país está na miséria, isto tem de mudar com urgência".

A única palavra que coloca um sorriso neste povo resistente e lutador é "cambio", mudança.

A crise política na Venezuela agravou-se em 23 de janeiro, quando o líder do parlamento, Juan Guaidó, jurou assumir funções de presidente interino, formar um Governo de transição e organizar eleições livres, contando com apoio de mais de 50 países.

Na madrugada de 30 de abril, um grupo de militares manifestou apoio a Juan Guaidó, que pediu à população para sair à rua e exigir uma mudança de regime. Nicolás Maduro, no poder desde 2013, denunciou a iniciativa do presidente do parlamento como uma tentativa de golpe de Estado.

À crise política na Venezuela soma-se uma grave crise económica e social, que já levou mais de 2,3 milhões de pessoas a emigrarem desde 2015, segundo as Nações Unidas.

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