"Temos mais vantagens em jogarmos juntos do que desvantagens"

Em entrevista exclusiva concedida ao Desporto ao Minuto, Miguel Deus e Nuno Deus, que se aventuraram no padel em 2018, explicam o que os levou a trocar uma carreira no ténis por esta modalidade que está em crescendo em Portugal. Recentemente chegaram ao top50 mundial e não escondem a ambição de escalar posições.

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Rodrigo Querido
13/05/2025 07:34 ‧ há 9 horas por Rodrigo Querido

Desporto

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Miguel Deus e Nuno Deus formam a mais famosa dupla de padel portuguesa dos dias de hoje. Quando deram a entrada neste mundo, em 2018, e numa altura em que a modalidade era pouco conhecida em solo nacional, estavam longe de imaginar que iam viver uma montanha russa de experiências e conquistas no espaço de oito anos.

 

Um dos pontos altos do crescimento desta dupla teve lugar há meia dúzia de dias. Miguel e Nuno Deus tornaram-se nos primeiros jogadores de padel portugueses a integrar a lista dos 50 melhores do mundo. Na mais recente atualização publicada pela federação internacional, Nuno figura no 45º lugar e Miguel aparece na posição seguinte, a 46ª. São posições que o padel português masculino nunca tinha atingido.

Em entrevista exclusiva concedida ao Desporto ao Minuto, os irmãos Deus explicam o que os levou a deixar a carreira no ténis que começou bem cedo nas suas vidas, não escondendo o desejo de escalar mais posições no ranking mundial desta modalidade que tem ganho cada vez mais participantes em Portugal.

O desporto esteve muito por dentro das nossas vidas, sobretudo desportos de raquete

Como nasceu o gosto pelo padel?

Miguel Deus (MD) - Começou em 2018 quando ainda jogávamos ténis. O Nuno tinha terminado a carreira de jogador no final de 2017 e eu era treinador de ténis, já estava desligado da parte de ser jogador. Tive um convite de um ex-treinador de ténis, que tinha um negócio de padel, e convidou-me para dar uns treinos. Na altura o padel já estava a crescer e, sou sincero, foi por motivos financeiros. No ténis trabalhava 35 horas por semana. No padel, por esse mesmo número de horas por semana, ofereciam-me o dobro do dinheiro. Senti que precisava de um desafio novo e aceitei-o

Entretanto, e em março de 2018, o Nuno começou a dar uns treinos de padel também numa vertente mais financeira. E depois começámos ao fim de semana, recreativamente, a participar num ou noutro torneio, só para manter ali o bichinho da competição. Somos muito competitivos desde sempre. Estamos ligados à alta competição desde sempre e gostávamos muito de competir ao fim de semana. O gosto pela competição e pelo padel foi surgindo assim. Ao início numa de recriação e depois, a partir de 2019/2020, começou a ficar um bocadinho mais sério.

E como é que surgiu essa ideia de desligar a ficha de jogar ténis e passar a jogar padel?

Nuno Deus (ND) - É importante dizer que jogámos ténis durante 15 anos. O desporto esteve muito por dentro das nossas vidas, sobretudo desportos de raquete. Eu estive mais anos presente. Quando terminei a minha carreira de ténis estava efetivamente muito saturado, é um desporto bastante exigente e um bocadinho mais solitário. Na altura já me estava a pesar um bocadinho, os resultados já não estavam a ser os que eu pretendia e foi por isso que terminei a carreira. Depois em 2018, quando decidi voltar a estudar e arranjar uma coisa diferente, coincidiu com esta altura que o Miguel estava a explicar de surgir o padel. Começou sem grande ambição, mas a competição está presente. O facto de nós termos tantos anos de raquete na mão ajudou muito, sem dúvida. Não nos cansamos de dizer que hoje em dia somos o que somos devido aos anos de ténis que tivemos.

E o padel joga-se em dupla, como uma das vertentes do ténis...

ND - A mim sempre me fascinou um bocadinho já no ténis. Eu joguei ténis muitos anos e a vertente de pares sempre me agradou mais. Até fui melhor jogador de pares do que de singulares. Essa questão de jogar em equipa sempre me puxou bastante. Depois fomos descobrindo este gosto. De início, acho que posso ser honesto, não tinha uma ideia inacreditável do padel. Havia até aquela piada que a malta que não tinha sucesso no ténis tinha de ir para o padel. Acho que essa ideia tem vindo a mudar hoje em dia. É um desporto que já ganhou o respeito de todos os praticantes, mesmo de ténis.

Fomos descobrindo esse gosto e fomos percebendo que fazemos uma boa equipa. Já tínhamos jogado ténis juntos, em dupla, também algumas vezes. Nunca levámos os pares muito a sério. Eu joguei com outros parceiros e o meu irmão também. Já tínhamos jogado uma outra vez e descobrimos que no padel efetivamente funcionava, tínhamos ali características boas para este desporto e foi correndo bem. Aos poucos e poucos a vontade de competir voltou a surgir e fomos descobrindo um desporto que nos agrada muito. Acho que até agora tem corrido bem. Desde que começámos em 2018, já vamos para o oitavo ano a jogar juntos e nunca nos separámos. Acho que isso também é uma das razões principais para agora estarmos onde estamos.

Top50? Ficámos muito contentes e é tempo agora de redefinir objetivos

Vocês são os primeiros portugueses dentro dos 50 melhores do mundo. O que representa isto?

MD - Representa o trabalho dos últimos anos. Este ano começámos bem a época, fizemos os nossos melhores resultados nos torneios internacionais. De certa forma, foram esses resultados que nos permitiram agora rapidamente subir. Eu comecei no número 80, o Nuno a 90 e agora já estamos no top50. Decidimos profissionalizarmo-nos mais a sério ali em 2021, pós-Covid. Isto representa muito porque trabalhamos bastante também. Temos uma equipa técnica muito forte connosco e a quem agradecemos diariamente. O nosso treinador João Barros, o nosso preparador físico Paulo Caldeira e o nosso fisioterapeuta Luís Ribeiro. Temos uma equipa muito boa connosco. Chegar ao top50 era o objetivo do ano. Tínhamos definida essa meta para este ano e acaba por acontecer agora em abril. Ficámos muito contentes e é tempo agora de redefinir objetivos.

Representa também a evolução do padel português no panorama internacional. O padel é dominado pelos espanhóis e pelos argentinos desde que há memória. Acaba por ser uma evolução natural do desporto a nível mundial aparecerem mais países. Nós aqui vamos levando a bandeira de Portugal connosco e sentimos muito orgulho com isso.

Chegar ao top50 era, como estavam a dizer, o objetivo para este ano. Mas alcançaram-no com meses de antecedência. É altamente motivador?

ND - Sem dúvida, mas também gostamos de manter os pés assentes na terra e sabemos que isto é um desporto em que muitas vezes temos uma semana boa ou temos um par de semanas boas. Depois podem acontecer torneios um bocadinho piores e os outros jogadores passam-nos no ranking. Atingimos a meta, é bom, mas também queremos manter o nível, ficar aqui neste patamar do ranking e não queremos descer. Temos de continuar aqui com os pés bem assentes na terra. Ou subir mais, quem sabe. Atingimos o top-50, mas não quer dizer que no fim do ano estejamos por lá. O objetivo era o top50 no fim do ano, não quer dizer que no fim do ano possamos estar ou mais para a frente ou mais para trás. Há de continuar o trabalho até o fim do ano.

O Miguel estava a referir há pouco que agora era tempo de redefinir objetivos. Qual o novo objetivo para o resto da época?

ND - Se nós só fizermos asneira até o fim do ano, estamos fora do top50 de certeza. Pelo menos temos de manter o nível, conseguir subir mais nos patamares melhores, talvez o top40, top30, ou o que seja.

MD - Agora entrando no top50, temos de olhar para cima. Nos torneios há 16 duplas de cabeças de série. Ser cabeça de série nos torneios é bom porque evitamos jogar contra as melhores duplas do mundo nas primeiras rondas. Agora podemos ambicionar ao top16 de duplas, o que implica ali um ranking por volta dos 32, 33, 35. Nos próximos torneios somos a dupla 21. Temos de escalar ainda um bocadinho para chegar até a dupla 16.

O que mais contribuiu para chegar a este patamar tão cedo no ano?

ND - É o conjunto de um trabalho de há muitos anos. Não nos cansamos de dizer que jogamos juntos há 8 anos e insistimos muito na questão do projeto de dupla, de trabalhar a equipa, de não desistir logo ao primeiro entrave que haja. Infelizmente isto ainda acontece muito com algumas duplas no mundo. É continuar a lutar, continuar a tentar melhorar as coisinhas que não correm tão bem, trabalhar sobre a equipa. Isto é a recompensa desse trabalho. Felizmente aconteceu um bocadinho mais cedo e tivemos bons resultados no início do ano. Estamos confiantes, sabemos que podemos chegar longe e que as coisas estão correr bem.

Sinto que cada vez nos acompanham mais, nos apoiam mais, nos reconhecem mais vezes

E o que muda com esta entrada no top50 para vocês?

ND - Para mim não muda muito. Tanto que não subiu muito à cabeça e continuo a fazer as mesmas coisinhas. Agora, há uma coisa em que noto diferença que é o apoio que temos tido de todas as pessoas, do portugueses sobretudo. Sinto que cada vez nos acompanham mais, nos apoiam mais, nos reconhecem mais vezes. Tem sido muito bom, tem sido gratificante saber que temos esse carinho de todos e que nos apoiam e nos tentam levar a mais longe. É tentar não ficar muito cheio com isto e seguir a trabalhar no nosso caminho.

E é possível viver apenas do facto de serem atletas profissionais?

ND - Acho que hoje em dia é. Obviamente nem todos conseguem. No início, quando dávamos treinos, dávamos aulas para receber dinheiro e continuar a jogar. Foi a partir de 2020/2021 que tomámos a decisão de deixar de dar aulas para viver só do padel. Começámos a reduzir a partir de 2021 até chegarmos ao ponto em que pudemos mesmo deixar de dar aulas. Também temos alguns patrocínios que nos permitem investir na nossa carreira e ganhar dinheiro suficiente para viver do padel.

MD - Em 2021 não tínhamos patrocínios, talvez só de material, de raquetes. Uma ajuda financeira ou outra, mas algo muito reduzido. O dinheiro não aparece do ar. Decidimos profissionalizarmo-nos, começar a competir mais no circuito internacional, fazer uma ou outra viagem lá fora. O dinheiro tinha de aparecer de algum lado e continuávamos a dar aulas. A partir de 2022/2023, os nossos resultados começaram a subir de nível e, a partir daí, começámos também a angariar um bocadinho mais patrocínios que nos permitiram deixar de dar aulas. Obviamente, deixar de dar aulas para o nosso corpo é melhor porque não nos cansamos tanto. Dar aulas é muito gratificante. Eu, pessoalmente, gostava muito de dar aulas. Mas confesso que quando eu treinava de manhã e, depois, ao final da tarde, tinha de dar aulas, no final do dia estava bastante cansado. Depois, a minha performance nos torneios não era a melhor. Não era compatível com a vida do jogador.

Agora, felizmente, é possível viver disto. Como o Nuno estava a dizer, ainda não é possível para todos. Mas o padel está a crescer. No ranking masculino português, talvez os jogadores do top10 já consigam viver só do padel. No top feminino, talvez cinco ou seis jogadoras consigam fazer isso. Mas a tendência é de crescimento.

A nível de prémios, é um desporto que ainda não paga tanto como outros. Os jogadores ganham mais dinheiro em patrocínios

ND - Sem dúvida que sem patrocínios é impossível. Há aqui uma fatia muito grande do rendimento dos jogadores para investir na carreira. A nível de prémios, é um desporto que ainda não paga tanto como outros. Os jogadores ganham mais dinheiro em patrocínios do que em prémios. E, tanto ao nível que estamos, um bocadinho mais abaixo, como mesmo os melhores do mundo, recebem mais dinheiro em patrocínios do que em prémios. Essa é a realidade de outros desportos não é bem assim. No ténis, por exemplo, ganham muito mais dinheiro em prize money do que em patrocínios.

NM - Apesar de serem irmãos, é fácil trabalharem em dupla? Existem algumas zangas?

ND - Isso há sempre. De vez em quando temos um arrufo ou outro. Mas temos vindo a melhorar nisso. Já houve alturas em que os resultados não eram tão bons. Trabalhámos sobre isso, não desistimos logo à primeira dificuldade e temos arranjado maneira de contornar. Temo-nos rodeados de pessoas muito profissionais, muito competentes, que nos ajudam e que facilitam muito esse trabalho também. Temos mais vantagens em jogarmos juntos do que desvantagens.

MD - Uma coisa positiva de estarmos sempre juntos é o facto de todo o planeamento da época e dos treinos ser muito mais fácil. Temos vários casos de colegas nossos que, infelizmente, não têm um projeto dupla como nós temos. Para eles chega a ser stressante planear, nem digo a médio prazo, digo mesmo a curto prazo. Temos colegas nossos que, nas próximas três/quatro semanas, ainda não fazem ideia que torneios é que vão jogar, ainda não fazem ideia com quem vão jogar. Todo esse planeamento afeta-lhes bastante mentalmente. Nós temos aqui um descanso maior porque estamos sempre juntos, jogamos sempre juntos. Todo o planeamento de viagens, de estadias, de torneios que vamos jogar, de treinos, é tudo mais fácil. Temos aí essa grande vantagem deste tal projeto dupla que é uma bandeira que nós insistimos muito e que tentamos passar também às gerações mais jovens.

Notícias ao Minuto Miguel e Nuno Deus têm dois torneios na América do Sul em maio© MDA Now  

E nunca pensaram em desfazer esta dupla em momentos de maior arrufo?

ND - Acho que foi o final do ano de 2021 que foi um bocadinho mais tenso. Na altura começamos a trabalhar um pouco mais a parte mental com o nosso preparador físico Paulo Caldeira. É o nosso performance coach, digamos. Tem-nos ajudado muito a trabalhar nesta questão da dupla, de gerir melhor a equipa, de escolher os pontos fortes e trabalhar sobre os pontos mais fracos. Acho que superámos isso.

MD - Não vou mentir. Há alguns anos houve jogos em que perdemos e que essas ideias podiam-nos passar pela cabeça mais a quente. Mas mais a frio e quando as horas passam, pensávamos que a melhor solução era ficar como está.

ND - É relativizar um bocadinho, às vezes, essa reação mais a frio porque há muito mais coisas a ganhar do que mandar logo a toalha ao chão. Acho que tem corrido bem. Felizmente, as coisas hoje em dia têm de correr muito bem e esses pensamentos não passam muito pela cabeça. Não sei se vão passar ou não, mas não quero pensar muito sobre isso.

Leia Também: "Trocava o meu irmão para fazer dupla com o Cristiano Ronaldo, mas..."

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