Daniel Gorjão partiu deste texto clássico para voltar a falar do desejo, como o fizera em 2015 com "Desta carne lassa do mundo", a partir de "Romeu e Julieta", de Shakespeare, por o texto clássico ser uma "matéria prima de tal forma consolidada, que permite partir dela para comunicar outros pontos de vista que não os que os autores das peças trataram", como disse à agência Lusa.

"Refletir sobre o ser humano, o desejo bruto que atrai os seres humanos uns para os outros, o desejo febril que faz com que os humanos se percam e no qual se revelam da forma mais crua" são também outras das questões que esta peça leva ao palco, segundo o diretor artístico e plástico.

Construir uma "dramaturgia com dois atores que funcionem como espelho das pessoas que vão ver a peça" foi a preocupação central de Daniel Gorjão.

"Tirar o lado temporal do original de Strindberg, de forma a torná-lo um trabalho mais contemporâneo, não usar muitos acessórios de cena, de forma a dar o enfoque da peça ao trabalho de atores", foram, segundo David Gorjão, os seus objetivos de diretor.

Neste trabalho, Gorjão não incluiu a personagem Cristina, do original de Strindberg, abdicando dela para centrar a intensidade dramática nas pulsões de desejo entre Júlia, filha de condes, e o chefe dos criados da casa, João.

David Gorjão disse, contudo, que não centrou a ação da peça na diferença de classes sociais das personagens, mas, sobretudo, no modo como as pessoas se perdem a pensar em encontrar no outro soluções para elas.

Este trabalho surgiu igualmente por a atriz Teresa Tavares (Júlia) querer muito fazer "Menina Júlia", de Strindberg.

No entanto, o diretor artístico disse que não trabalhou o conceito da personagem, mas "o lado da exposição", já que o que pretendeu foi "levar os atores ao seu lado máximo de exposição íntima".

Questionado sobre se pretende trabalhar sobre mais textos clássicos, David Gorjão revelou que pretende "levar 'O Lago dos Cisnes' para o teatro".

"É uma vontade que tenho, o projeto está desenhado e escrito, e está a ser proposto a várias instituições", afirmou.

"Júlia" conta ainda com interpretação de João Villas-Boas e vai estar em cena na Sala Mário Viegas, até 07 de maio, com representações de quinta-feira a sábado, às 21:00, e aos domingos, às 17:30.

A peça, que a 30 de setembro subirá ao palco do Centro Cultural de Ílhavo, deverá ainda ser representada em Bragança, sem data ainda definida.

"Júlia" é uma produção conjunta do Teatro do Vão, ao qual David Gorjão pertence, com o Teatro S. Luiz e a RTP 2.