"Muitos continuam a dormir ao relento. As pessoas de algumas barracas que não foram demolidas receberam as crianças", contou Kedy Santos, deputado municipal da CDU em Loures, que acompanha a situação das cerca de 36 pessoas desalojadas de casas autoconstruídas demolidas na segunda-feira no bairro da União de Freguesias de Camarate, Unhos e Apelação.
A Câmara de Loures confirmou a demolição de 25 construções precárias no Bairro do Talude Militar, no âmbito de uma operação da política municipal de combate à ocupação ilegal do território, avançando que cinco construções não tinham qualquer ocupante e "as restantes 20 eram ocupadas por 37 adultos e nove menores".
Após serem atendidos na segunda-feira nos serviços camarários na Casa da Cultura de Sacavém, os moradores voltaram para o bairro, para "dormir ao relento", pois "a maioria trabalha nas proximidades" e com o receio de que, "se não arranjarem sítios para os miúdos, podem ser sinalizados" pelos serviços de proteção de menores, admitiu Kedy Santos.
O também ativista do movimento Vida Justa lamentou que os serviços municipais apenas estejam a "oferecer a primeira renda e a caução" a cidadãos que, "apesar de trabalharem não têm meios para recorrer ao mercado de arrendamento livre", e que a autarquia se tenha antecipado a uma providência cautelar contra as demolições, alegando não ter sido notificada oficialmente da ação.
Para o deputado municipal, "a câmara não tem uma solução" para apresentar aos moradores, quando "o número de barracas não aumentou nos últimos três meses", e "faltou diálogo".
"Deixar as pessoas ao relento e as crianças sem apontar uma solução não tem cabimento", considerou Kedy Santos, avançando que os desalojados vão contactar com a junta de freguesia para procurar identificar eventuais apoios.
O autarca salientou que as pessoas afetadas "não querem passar à frente de ninguém nas listas, só querem continuar a viver em condições mínimas até conseguirem uma solução" de acordo com os seus rendimentos, e "não são só imigrantes, mas também portuguesas, algumas devido ao aumento das rendas em bairros próximos" do Talude.
No esclarecimento escrito, a autarquia explicou que a "intervenção insere-se num esforço contínuo" para "travar o crescimento de núcleos de autoconstrução ilegal, que se têm vindo a agravar de forma preocupante nos últimos anos, muitas vezes explorando a vulnerabilidade de imigrantes em situação de fragilidade".
A câmara reiterou que não permitirá a proliferação de mais construções ilegais no concelho, "mantendo uma política de tolerância zero para situações que violem o ordenamento do território e coloquem em risco a segurança e a saúde públicas".
Fonte oficial do gabinete do presidente da câmara, Ricardo Leão (PS), disse à Lusa que, de acordo com os serviços de ação social, "das 25 construções demolidas, só compareceram no atendimento 17 agregados familiares", dos quais 12 possuem morada no concelho e cinco noutros municípios.
"Essas famílias com moradas fora do concelho foram encaminhadas para os serviços de ação social das respetivas autarquias", avançou a fonte, acrescentando que, "de 12 com morada em Loures, duas declararam já terem previamente casa arrendada", justificando pretenderem "a redução de despesas fixas mensais" e "adaptar o espaço à dimensão da família".
As restantes 10 famílias, correspondendo a 24 pessoas, incluindo quatro menores, declararam "não ter alternativa habitacional" ou "qualquer rede formal ou informal de suporte que configure uma alternativa".
A fonte oficial referiu ainda que, após análise socioeconómica, "a grande maioria" se encontra "integrada no mercado de trabalho, vários até com a situação contratual regularizada", mas com "rendimentos insuficientes para fazer face ao mercado de arrendamento livre", tendo sido "também identificadas situações de precariedade laboral".
A autarquia, assegurou, continuará a ajudar na procura de alternativa habitacional, com possibilidade do apoio económico da caução e da primeira renda, e "acompanhamento pelas equipas de emergência social".
O movimento Vida Justa criticou a política da Câmara de Loures por "não querer fazer um acompanhamento de proximidade" das pessoas afetadas pela crise da habitação e acusou a autarquia de "tentativa de substituição forçada de moradores dos bairros municipais às custas de famílias inteiras que assim se tornam em novos sem-abrigo".
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