Dias depois de a Proteção Civil ter anunciado que o apagão de segunda-feira, 28 de abril, provocou "zero vítimas" em Portugal e de o primeiro-ministro, Luís Montenegro, reiterar esta informação, no debate para as eleições legislativas, na quarta-feira, a RTP revelou o caso de uma mulher, de 77 anos, que terá morrido devido à falta de energia, no Cacém, distrito de Lisboa.
Ao canal de televisão público, o filho, ainda emocionado, contou o que aconteceu, garantindo que, "se não houvesse apagão", a mãe ainda estaria viva.
A mulher dependia de um ventilador mecânico, ao qual estava ligada 24 horas por dia. António ainda ligou para o INEM a pedir ajuda, mas quando os operacionais chegaram já não havia nada a fazer. O aparelho tinha ficado sem bateria e a idosa morrido.
"Quando liguei para o INEM [a bateria] estava a 50%. A bateria gastou, meti o oxigénio e eles não apareceram. Disseram que já vinham, demoraram. Quando chegaram a minha mãe estava morta a olhar para mim", recordou.
INEM culpa trânsito "muito condicionado" pela demora
Contactado pela estação pública, o Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) confirmou que recebeu a chamada às 15h52 e acionou a Viatura Médica de Emergência e Reanimação (VMER) às 15h57. A equipa chegou ao local às 16h28, quando a idosa estava "já em paragem cardiorrespiratória".
De acordo com a equipa da VMER, o tempo de deslocação deveu-se ao trânsito, que se encontrava "muito condicionado", lê-se no comunicado do INEM citado pela RTP.
"Pareciam baratas tontas"
O filho da vítima contou que, antes do INEM, chegaram os bombeiros, que "pareciam baratas tontas porque o SIRESP não funcionava".
"O médico declarou o óbito e teve de ir à esquadra comunicar à polícia porque não havia comunicações do SIRESP. A minha mãe morreu a olhar para mim, a pedir ajuda. Senti-me impotente. Se não houvesse apagão a minha mãe estava viva", acredita o filho.
Para já, a família ainda não tem o resultado da autópsia nem sabe quando será o funeral.
Ministério da Saúde diz que ordenou averiguações
O Ministério da Saúde anunciou, entretanto, na quinta-feira que ordenou uma averiguação às circunstâncias da morte.
"Tendo tido o Ministério da Saúde conhecimento, esta quinta-feira, dia 01 de maio, de uma eventual vítima causada pelo corte de energia no passado dia 28 de abril, a ministra da Saúde decidiu pedir uma auditoria à Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) para o esclarecimento cabal deste caso", referiu o ministério, numa breve nota enviada às redações.
Numa outra nota, o ministério indicou que de acordo com informações prestadas ao gabinete da ministra da Saúde pelo INEM, a vítima é uma mulher de 77 anos, "com várias comorbilidades e que se encontrava no seu domicílio".
Em declarações à Rádio Renascença, o presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar lamenta a morte desta mulher e considera que é preciso perceber o que falhou.
"Não é aceitável num país desenvolvido"
Rui Lázaro diz que falharam os cuidados de saúde primários, ao não acautelarem uma bateria de reserva, e considera também inaceitável uma espera de 36 minutos pelo INEM.
"Depois da vítima ter ligado 112, claramente 36 minutos para uma emergência médica grave, em claro risco de vida, é excessivo em qualquer circunstância, não é aceitável num país desenvolvido e numa das grandes cidades do país", afirmou o presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar, que volta a pedir mais meios para o INEM.
Portanto, ainda há muitas perguntas sem resposta quanto a este caso. Espera-se agora que o resultado da autópsia e a investigação da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) ajudem a esclarecer se a morte da mãe de António Casimiro está ou não relacionada com o INEM.
Recorde-se que um corte generalizado no abastecimento elétrico afetou na segunda-feira, desde as 11h30, Portugal e Espanha.
Aeroportos fechados, congestionamento nos transportes e no trânsito nas grandes cidades e falta de combustíveis foram algumas das consequências do apagão.
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