Com cadeiras alinhadas, faixas, altifalantes como pano de fundo, milhares de pessoas num ambiente de euforia receberam o cortejo de autocarros, avançou a agência de notícias France-Presse (AFP) a partir de Khan Yunis, uma grande cidade no sul do território palestiniano, quase totalmente destruída pela guerra.
Nas pequenas janelas deslizantes dos veículos, homens de todas as idades, vestidos com camisolas de flanela cinzentas dos serviços prisionais israelitas, disputavam o espaço para conseguir pôr a cabeça de fora. Um homem sobiu para saudar um deles, mesmo com o veículo ainda em movimento.
Ao descerem dos autocarros, alguns cambaleiam, outros sorriem ao olhar em redor, e há quem se ajoelhe a beijar o chão, em lágrimas.
Depois, a pé, em cadeiras de rodas ou apoiados por membros do Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV), com coletes brancos, seguiram para o pátio do complexo hospitalar Nasser, em Khan Yunis.
Nesse terreno arenoso, rodeado de armazéns, centenas de pessoas esperavam desde manhã o regresso dos familiares.
Bandeiras palestinianas, mas também verdes do grupo islamita Hamas e negras das Brigadas Al-Qods, braço armado do movimento Jihad Islâmica, estavam hasteadas desde cedo, enquanto altifalantes difundiam canções de exaltação à liberdade.
As libertações aconteceram ao abrigo do cessar-fogo entre Israel e o Hamas, que entrou em vigor na sexta-feira às 09:00 TMG (10:00 em Lisboa), e fazem parte da primeira fase do plano negociado sob a égide dos Estados Unidos para instaurar um cessar-fogo duradouro.
Esta fase prevê a libertação de 250 palestinianos detidos por "razões de segurança" e de 1.700 outros presos em Gaza desde o início da guerra.
Há mais de um ano que organizações de defesa de presos denunciam maus-tratos nos centros de detenção israelitas. Vários detidos morreram atrás das grades. As autoridades israelitas afirmam cumprir a lei.
Por seu lado, o Hamas comprometeu-se a libertar os 20 reféns israelitas vivos, já entretanto chegados a Israel, bem como os corpos dos 28 que morreram, mas, para já, entregaram apenas quatro corpos.
A 07 de outubro, 251 pessoas foram sequestradas durante o ataque em Israel por comandos do grupo islamita e aliados. A maioria já tinha sido libertada.
Para esses 20 israelitas, terminou o pesadelo de 738 dias de cativeiro num território devastado por igual número de dias de guerra. Não foram divulgadas imagens em direto do momento em que os reféns foram entregues ao CICV.
Em fevereiro, durante uma libertação anterior em Deir el-Balah (centro da Faixa de Gaza), reféns pálidos e emagrecidos foram obrigados a falar perante a multidão, uma cena que provocou indignação em Israel e além-fronteiras.
Antes do amanhecer, em Deir el-Balah, filas de autocarros foram estacionadas em frente aos escritórios do CICV, de acordo com imagens difundidas pela AFPTV.
Mais tarde, a televisão do Qatar Al Jazeera mostrou veículos da Cruz Vermelha a atravessar um portão, vigiado por combatentes armados, camuflados.
Nas horas seguintes, o Fórum das Famílias partilhou vídeos e fotografias de familiares de Matan Zangauker, Nimrod Cohen, Ariel e David Cunio em chamadas telefónicas. Nos ecrãs dos telemóveis, os reféns surgiram ladeados por combatentes de rosto totalmente coberto, um deles armado.
"Estás a voltar para casa, meu amor, amo-te... Graças a Deus, estás a voltar para casa, a guerra acabou", disse Einav Zangauker ao filho Matan, num desses vídeos, antes de os meios de comunicação israelitas difundirem imagens dos reféns libertados.
Em Ramallah, na Cisjordânia ocupada, dezenas de prisioneiros palestinianos foram recebidos por uma multidão em festa.
"É um sentimento indescritível, um renascimento", descreveu à AFP Mahdi Ramadan, um prisioneiro recém-libertado, abraçado pelos pais.
Beijos, testas com testas e lágrimas de emoção marcaram reencontros há muito esperados. Para muitos, os primeiros fora da prisão em vários anos, ou mesmo décadas.
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