As redes sociais, especialmente o TikTok, são capazes de tornar os objetos mais banais em símbolos virais. E agora, graças a uma rixa numa doca no Alabama, o mais recente símbolo da luta racial nos Estados Unidos é uma simples, básica e humilde cadeira dobrável de alumínio, que já foi convertida em várias ideias para produtos e até tatuagens.
A nova moda em torno da cadeira dobrável começou no passado dia 5 de agosto, quando um grupo de homens brancos atacaram Dameion Pickett numa doca em Montgomery, no estado conservador do Alabama. Pickett, de etnia afro-americana e ele próprio o capitão de uma embarcação, pediu ao grupo para atracar noutro ponto o seu barco, que estava num local destinado a veículos maiores, e o grupo reagiu de forma agressiva. Vendo Pickett em risco, várias testemunhas, a maioria negras, correram para ajudar a afastar o grupo agressor.
Nos vídeos que emergiram a partir da doca, foram várias as imagens que correram a internet e despertaram reações irónicas e hilariantes nas redes sociais, entre as quais um homem branco que saltou espalhafatosamente para a água para fugir. Mas a imagem que marcou o momento foi a de um dos defensores de Pickett, que agarrou numa cadeira dobrável e a usou como arma de arremesso, qual lutador num combate de ‘wrestling’.
A frase ‘Try Me’ (do inglês ‘Atreve-te’), usada durante a rixa, também ficou na mente coletiva da internet.
O TikTok fez o que sabe fazer melhor e rapidamente viralizou o momento, com várias ‘hashtags’, vídeos, piadas e ‘memes’, que chegaram às dezenas de milhões de visualizações. Em sites de criação de adesivos, autocolantes, t-shirts e canecas, a imagem da cadeira dobrável a ser arremessada contra os agressores brancos passou a ser usada em vários produtos.
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Até agora, nada de propriamente ‘anormal’ para as redes sociais, que protagonizaram mais um momento de profunda ironia. Mas as piadas sobre a cadeira dobrável acabaram por se converter em algo mais simbólico: a cadeira tornou-se num símbolo de solidariedade.
Ao New York Times, Jasmine Green, uma artista plástica de Pittsburgh que criou brincos a partir do design da cadeira de alumínio, disse que parte do dinheiro obtido com as vendas seria encaminhada para ajudar um dos ajudantes de Pickett a pagar as custas processuais.
“Parte da celebração desta cadeira é a ideia de ajuda coletiva. Mas também quero lembrar às pessoas que devem garantir que acompanham os que estiveram envolvidos na luta, se precisarem de recursos”, disse Green, que é também diretora de uma associação que ajuda comunidades afro-americanas em questões de justiça social, educação e apoios às artes.
© Black Girl Absolute
Já Uju Anya, uma professora numa universidade no estado do Filadélfia, recebeu um par de brincos da namorada e afirmou que os acessórios de bijuteria, além de serem elogiados na rua, são um sinal de “empoderamento” e de comunidade, e transpõem a ironia e a piada associada ao ‘meme’ do TikTok. “Qualquer pessoa consegue perceber um ‘meme’, mas a imagem desta cadeira é específica para nós e tem uma linguagem muito específica para as pessoas negras e a cultura afro-americana”, explicou Anya.
E Kaylen Sanders, um músico de Dallas que tatuou a imagem da cadeira no seu braço direito, mostrou-se emocionado pelo facto de a cadeira ter-se tornado num símbolo de solidariedade e, acima de tudo, de o incidente não ter sido recordado como algo trágico (algo a que a comunidade negra nos EUA está mais do que habituada).
“O facto de isto não se ter tornado em algo em que armas são apontadas, ou que alguém não tenha sido morto, foi um alívio”, reiterou Sanders, que acrescentou que a solidariedade demonstrada pelas testemunhas negras que auxiliaram Dameion Pickett “representa a união negra”.
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