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HRW denuncia possível cumplicidade do Peru na repressão de protestos

A "aparente passividade" do Governo peruano face aos "abusos" cometidos pelas forças policiais e militares nos recentes protestos populares antigovernamentais revelaram "negligência ou inclusive cumplicidade" das autoridades, segundo um relatório hoje divulgado pela Human Rights Watch (HRW).

HRW denuncia possível cumplicidade do Peru na repressão de protestos
Notícias ao Minuto

20:25 - 26/04/23 por Lusa

Mundo HRW

"Durante semanas, enquanto as forças de segurança matavam manifestantes e transeuntes, o Governo de [Dina] Boluarte parecia estar a olhar para outro lado", disse em comunicado César Muñoz, diretor adjunto da Divisão para as Américas desta organização não-governamental (ONG) de direitos humanos.

No seu relatório "Deterioração total. Abusos das forças de segurança e crise democrática no Peru", a HRW denuncia o "uso excessivo da força, violações processuais, abusos contra detidos e deficiências nas investigações penais", no contexto das manifestações sociais que alastraram pelo país andino entre dezembro e fevereiro passados.

O documento recorda que os confrontos entre manifestantes e agentes policiais e forças militares deixaram 49 civis mortos, oito deles menores, e 1.300 feridos, e assinala a utilização de "armas de assalto e armas curtas" pelas forças de segurança.

Em concreto, a investigação da HRW conclui que pelo menos 39 pessoas morreram por ferimentos de bala, entre outras causas. "O mais provável é que estas mortes sejam execuções extrajudiciais ou arbitrárias à luz do direito internacional dos direitos humanos, pelos quais o Estado é responsável", assegura o relatório, que recorda as "detenções em massa e assinaladas por abusos" na Universidad Nacional Mayor de San Marcos, em Lima.

Perante estas mortes, qualificadas como "homicídios", a HRW exige que as investigações preliminares abertas pelo Ministério Público contra Boluarte e vários dos seus ministros sejam "imparciais e exaustivas" e abranjam todos os responsáveis dos abusos".

Neste sentido, também exortam o Governo a convocar uma comissão independente de peritos internacionais para obterem acesso à informação governamental e aos casos de relatos de abusos para apoiarem as investigações em curso e documentarem a crise e as violações de direitos humanos.

Por outro lado, o relatório da HRW sublinha a aparente "indiferença" das autoridades governamentais face a estas "provas sólidas de abusos" e critica a atitude do Executivo de "negar com insistência que tenham ocorrido".

Acrescenta que altos funcionários do Governo afirmaram, sem provas, que as mortes foram provocadas por armas de fabrico caseiro ou armas de fogo e munições introduzidas a partir da Bolívia, "no momento em que menosprezavam e estigmatizavam repetidamente os manifestantes, insistindo que eram terroristas".

"A retórica do Governo, que parecia ignorar ou minimizar os abusos, combinada com a aparente inação das mais altas autoridades civis (...) suscita interrogações sobre uma possível negligência ou inclusive cumplicidade nos abusos", acrescenta o texto.

Sobre a resposta internacional à crise, a HRW assinala que, durante meses, os Estados Unidos e o Canadá "não condenaram as mortes e outros abusos graves" e países como a Argentina, Bolívia, Colômbia, Honduras e México "defenderam [Pedro] Castillo".

Perante este cenário, o diretor adjunto da Divisão das Américas da HRW emite um apelo internacional para uma "maior firmeza" e "pressão" para que sejam prestadas contas e iniciado um diálogo nacional genuíno.

O relatório também alerta para o facto de se registar no Perú, nos últimos anos, "uma erosão do Estado de direito e das instituições democráticas", em parte devido à corrupção generalizada e a um Congresso dominado por interesses pessoais e empenhado em eliminar os controlos ao seu poder.

Nesse sentido, recorda que os protestos foram desencadeados após o ex-presidente Pedro Castillo ter promovido "um golpe de Estado falhado", que motivou a sua destituição pelo Parlamento e a chegada ao poder, por sucessão constitucional, da sua vice-presidente, Dina Boluarte.

Os manifestantes, na sua maioria trabalhadores rurais e indígenas do sul do país, pediam eleições antecipadas, entre outras reivindicações, mas "também os motivava a frustração por não poderem garantir uma vida melhor para os seus filhos, a falta de acesso a educação e serviços de saúde de qualidade, e sentirem-se esquecidos pelos líderes políticos", ainda segundo as conclusões da HRW.

Desta forma, a ONG com sede em Nova Iorque exorta o Governo a adotar medidas concretas para recuperar a confiança pública e colaborar com o Congresso para assegurar uma reforma da polícia, "necessária desde há muito tempo, para que seja convertida numa força mais eficiente e respeitadora da lei".

Pedro Castillo cumpre 18 meses de prisão preventiva desde 16 de dezembro passado após ser indiciado por tentar promover um autogolpe de Estado em 07 de dezembro com o objetivo de dissolver o Congresso e governar por decreto até à convocação de eleições para um nova Assembleia constituinte.

Na sequência da detenção de Castillo registaram-se fortes mobilizações populares que exigiram a sua libertação, a demissão de Dina Boluarte -- sua ex-vice-presidente e que assumiu a chefia do Estado -- ou a antecipação das eleições.

A crise política que abala o Perú é também reflexo do enorme fosso entre a capital e as províncias pobres que apoiam Castillo, de origem ameríndia e que nunca foi aceite no Palácio Presidencial pela elite e a oligarquia da capital, ou pelos principais 'media' na posse de empresários milionários.

Num relatório divulgado em finais de fevereiro, a Amnistia Internacional (AI) tinha já denunciado a "violenta repressão do Estado" peruano contra os protestos antigovernamentais no país e o "uso indiscriminado de armas letais" contra manifestantes, para além de detenções arbitrárias e outras violações dos direitos humanos, incluindo alegadas execuções extrajudiciais.

Em paralelo, o Governo do Peru decidiu incluir mais 52 pessoas na lista de beneficiários do apoio económico que está a fornecer aos familiares dos mortos e feridos com gravidade durante as manifestações antigovernamentais entre dezembro e fevereiro passados.

Na quarta lista do género, o Ministério da Justiça e Direitos Humanos decidiu atribuir 25.000 soles (5.900 euros) "de forma excecional e por uma única vez".

No decurso dos protestos, pelo menos 60 pessoas foram mortas em incidentes distintos, e milhares ficaram feridas ou foram detidas.

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