Último governador britânico diz que Portugal "baixou os braços" em Macau
O último governador britânico de Hong Kong recorda no mais recente livro de memórias o homólogo de Macau, Vasco Rocha Vieira, como alguém "profundamente decente", mas lamenta que Portugal tivesse "baixado os braços" perante a China.
© Lusa
Mundo Macau
No livro 'Diários de Hong Kong', publicado a propósito do 25.º aniversário da transferência da soberania de Hong Kong para a China, em 01 de julho de 1997, Chris Patten relata várias visitas à antiga colónia portuguesa enquanto ocupou o posto que assumiu durante cinco anos.
O livro é um registo das vivências e pensamentos na época, e inclui também reflexões sobre a história de Hong Kong, ocupada durante a Guerra do Ópio, em meados do século XIX, e sobre que aconteceu a seguir a 1997.
Vasco Rocha Vieira, o 138.º e último governador de Macau, entre 1991 e 1999, elogia Patten, era "um homem completamente decente e amigável", com quem passou alguns fins de semana em convívio com as respetivas famílias, a jogar golfe ou ténis.
"Vir a Macau é sempre como fazer uma viagem a uma parte estranha da Europa para um fim de semana divertido", indica, com alusões à arquitetura histórica colonial e gastronomia portuguesa.
O reitor da Universidade de Oxford, atualmente com 78 anos, recorda conversas francas com o português sobre a forma como ligar com as autoridades chinesas e refere a sensação de que ambos estão, de certa forma, numa situação semelhante.
Segundo Patten, Rocha Vieira já manifestava alguma "frustração" com a crescente influência chinesa na administração de Macau e não escondia a consciência de que a forma da transferência de Hong Kong iria ter impacto o processo da colónia portuguesa, dois anos mais tarde, em 1999.
O britânico entende que o governador português estava "constrangido no seu papel pelo mal-estar político generalizado de Portugal sobre se detinha de facto alguma soberania significativa sobre Macau".
"Macau é evidentemente muito diferente, muito mais pequeno, e o lado português baixou os braços em 1967 durante a Revolução Cultural, e depois voltou a baixá-los depois de lhes ter sido, de facto, sido devolvida a custódia durante uma das próprias revoluções portuguesas", escreve no livro.
Mas, acrescenta, "quaisquer que sejam as diferenças nas nossas respetivas colónias, o Partido Comunista Chinês e o comportamento continuam a ser os mesmos".
Os problemas das autoridades portuguesas para controlarem as tríades chinesas e crime organizado em Macau são referidas várias vezes como um exemplo a não seguir em Hong Kong, razão pela qual o britânico resistiu à construção de casinos na antiga colónia britânica.
Nas suas funções, Patten cruzou-se com o antigo primeiro-ministro Cavaco Silva, e o antigo Presidente da República Mário Soares, este durante a inauguração do aeroporto de Macau, em 1995.
A amizade e cumplicidade entre Chris Patten e Rocha Vieira foi útil quando o português ajudou o britânico a estar entre os dignatários, o que implicou ultrapassar a guarda policial do então vice-presidente chinês Rong Yiren para chegar a tempo de o cumprimentar.
Na altura, a tensão entre Hong Kong e Pequim era evidente devido à tentativa do Reino Unido deixar um legado de democracia no território britânico, e Patten reconhece a dificuldade de negociar com os comunistas chineses, aos quais acusa de faltar à palavra e de não aceitarem compromissos.
"Veja-se os problemas que os portugueses ainda têm em Macau, mesmo depois de terem baixado os braços perante a China a cada instante. As nossas negociações mostraram que o sistema chinês é fundamentalmente instável e esta é uma das razões pelas quais é tão difícil construir uma política de envolvimento permanente com o Partido Comunista Chinês", lamentou.
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