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Apoio queniano a famílias carenciadas caracterizou-se por "favoritismo"

Apenas uma "pequena fração" de famílias vulneráveis em Nairobi beneficiou de um programa de apoio do Governo queniano, destinado às famílias mais carenciadas durante a pandemia, mas que se "caracterizou pelo favoritismo absoluto", denunciou a Human Rights Watch (HRW).

Apoio queniano a famílias carenciadas caracterizou-se por "favoritismo"
Notícias ao Minuto

07:06 - 20/07/21 por Lusa

Mundo HRW

Um relatório hoje divulgado pela organização não-governamental (ONG) de defesa dos direitos humanos constatou que "apenas uma pequena fração de famílias vulneráveis em Nairobi beneficiou do programa, que se caracterizou pela falta de transparência, compadrio, nepotismo e favoritismo absoluto".

"É dececionante que uma iniciativa tão nobre possa ser tão fortemente prejudicada por negligência e supervisão inadequada por parte das autoridades", afirmou Otsieno Namwaya, diretor da HRW para a África Oriental, citado no documento.

"Altos funcionários governamentais, incluindo o Presidente [Uhuru] Kenyatta, deveriam demonstrar o seu empenho em prestar apoio crucial às famílias vulneráveis, denunciando publicamente a má gestão do programa de transferência de dinheiro e assegurando investigações credíveis", acrescentou Namwaya.

O relatório "Somos Todos Vulneráveis Aqui", sobre irregularidades na transferência de dinheiro no programa de apoio às consequências da pandemia no Quénia, apoia-se em entrevistas a 136 pessoas entre julho de 2020 e fevereiro de 2021, na sua maioria funcionários do Governo e residentes de bairros informais em Nairobi.

Ainda que o relatório se tenha baseado em testemunhos recolhidos em bairros informais do condado de Nairobi, funcionários quenianos alegam ter efetuado transferências monetárias em 21 das 47 regiões administrativas do Quénia.

O Presidente Kenyatta anunciou em 23 de maio de 2020 a atribuição de 10 mil milhões de xelins quenianos (776 milhões de euros) para mitigar o impacto económico da pandemia de covid-19 nas famílias vulneráveis.

A Human Rights Watch constatou, porém, que as autoridades quenianas não apenas foram lentas na resposta às necessidades das famílias vulneráveis, como, quando criaram o programa, que era suposto prolongar-se por oito meses, este "era inadequado e de curta duração, como também carecia de transparência básica".

"Não forneceu informações claras sobre a elegibilidade", assim como "foram excluídos milhares de agregados familiares que cumpriam os critérios aprovados", aponta o relatório.

O secretário do Gabinete do Tesouro e Planeamento, Ukur Yatani, explicou à HRW que o programa foi operacionalizado por anciãos de aldeia, assistidos por voluntários das comunidades e líderes juvenis, e supervisionados por funcionários do Governo.

Mas os investigadores da HRW descobriram que os funcionários governamentais ignoraram os critérios e "registaram os seus amigos e familiares, muitos dos quais nem sequer viviam em Nairobi".

"Pelo menos 25.000 das cerca de 40.000 famílias da minha área precisavam seriamente de apoio", disse um ancião, citado pela HRW, que acrescentou: "Mas só me foram atribuídas 350 vagas. Não sei como é que os nossos seniores [funcionários] chegaram a esse número porque não nos consultaram. Mesmo assim, apenas cerca de 100 casas receberam o dinheiro. Não sabemos como eles decidiram".

De acordo com a Sidnet ('Slum Dwellers International'), os oito assentamentos ou bairros informais estimados em Nairobi têm mais de 600.000 lares, todos com uma necessidade extrema de apoio, por força do encerramento de empresas e da erosão do emprego provocada pela pandemia.

O número de famílias apoiadas pelo programa governamental em Nairobi ascende a aproximadamente 4,8% dos agregados familiares em assentamentos informais.

"A análise da Human Rights Watch dos dados e informações governamentais disponíveis fornecidos por funcionários governamentais indica que o programa de transferência de dinheiro no âmbito da covid-19 prestou apoio a menos de 5% das famílias socioeconomicamente vulneráveis em Nairobi, e a uma percentagem ainda menor em todo o país, o que significa que o Governo não conseguiu garantir o direito a um nível de vida adequado a mais de 95% das famílias vulneráveis", acusa a ONG.

O Quénia é uma economia de rendimento médio inferior, com uma população de 47,5 milhões em 2020, caracterizada por disparidades económicas alarmantes, tanto entre como dentro das oito regiões do país.

Pelo menos 36,1% da população - 17,1 milhões de quenianos - vivem abaixo do limiar internacional de pobreza, com menos de 1,90 dólares por dia, segundo o Kenya National Bureau of Statistics, enquanto 66,2% vivem com menos de 3,20 dólares por dia, e 86,5% com menos de 5,50 dólares, de acordo com o Banco Mundial.

As taxas de pobreza são especialmente elevadas - acima dos 70% - nas zonas remotas, áridas e escassamente povoadas do nordeste do Quénia. Algumas grandes cidades têm também elevadas taxas de pobreza, por exemplo, 44% dos residentes de Mombaça são classificados como pobres, número que compara com 42% das pessoas na capital, Nairobi.

O relatório da HRW recomenda ao Presidente Uhuru Kenyatta e ao Governo queniano que deem instruções "aos departamentos governamentais relevantes" para que "implementem o programa de transferência de dinheiro", publicando "toda a informação sobre os critérios de atribuição e distribuição de fundos de proteção social destinados a mitigar o impacto socioeconómico da pandemia de covid-19".

A ONG apela ainda para que a Comissão de Ética e Anticorrupção investigue "pronta e completamente as alegações de irregularidades ou desvio de dinheiro destinado ao programa de transferência de dinheiro e submeta os [respetivos] processos ao Ministério Público para [posterior] acusação".

Finalmente, a HRW advoga que o programa de emergência de transferência de dinheiro seja reforçado e reiniciado "a curto prazo", "assegurando que todas as famílias vulneráveis, incluindo as dos assentamentos informais de Nairobi, disponham de meios para pagar a alimentação, rendas de casa, e outras despesas fundamentais para os direitos humanos".

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