Todos nós temos uma música preferida. Até podemos nem saber a letra de cor ou o artista que a canta, mas assim que a canção começa a tocar sentimos algo diferente, uma sensação de bem-estar e intensidade que nem sempre é possível explicar. Na prática, é dada uma certa importância àqueles pouco mais de três minutos de sonoridade. Mas, porque é que isso acontece?
Para encontrar uma resposta a esta questão, um grupo de cientistas do Hospital Universitário de Psiquiatria em Zurique, na Suíça, recorreu ao uso da droga LSD e a um inibidor dos seus efeitos para perceber a atuação do cérebro perante as situações e momentos a que as pessoas dão importância.
Publicado na revista Current Biology, e citado pelo site LiveScience, o estudo dividiu os 22 participantes em três grupos: no primeiro, foi dado placebo; no segundo grupo os voluntáris tomaram LSD e no terceiro foi dada uma combinação de LSD com cetanserina (droga antagonista dos recetores de serotonina – neurotransmissor responsável pelo estado de alerta). Os participantes foram ainda convidados a ouvir uma série de canções, com ou sem algum tipo de significado/importância, enquanto eram realizadas ressonâncias magnéticas aos seus cérebros.
Embora seja já do conhecimento científico que o LSD altera a atuação do cérebro, fazendo com as pessoas atribuam um maior significado às coisas e aos momentos, a investigação suíça conseguiu provar que os efeitos psicadélicos desta droga são eliminados na presença de cetanserina, que bloqueou a capacidade da droga atuar no recetor 5-HT2AR, que pertence à ‘família’ da serotonina (que tem influência no humor, nas emoções, na memória e no desejo, por exemplo).
Como se lê na publicação, os participantes sob o efeito de LSD atribuíram um significado a músicas que nada lhes diziam, contudo, o mesmo não aconteceu nos participantes que tomaram a droga e um inibidor dos recetores de serotonina. Ou seja, os participantes que tomaram LSD com cetanserina foram capazes de atribuir um significado às músicas que realmente lhes diziam algo, uma vez que a parte do cérebro responsável pelas emoções, memória e desejo mantinha-se intacta e, por isso, foi estimulada pelas músicas que lhes eram queridas. E essas músicas diziam algo por isso mesmo, porque estimulavam a parte cerebral relacionada com as emoções e com o humor (daí algumas pessoas preferirem músicas tristes).
“Verificamos que a atribuição de significado pessoal e a sua modelação pelo LSD está mediada pelos recetores e pelas estruturas da linha média cortical, que também estão envolvidas de forma crucial na experiência de um sentido”, disse Katrin Peller, um dos autores do estudo.
As ressonâncias magnéticas permitiram ainda perceber que as células e as regiões do cérebro estão envolvidas quando as pessoas olham para o ambiente como significativo e relevante. E é aqui que o LSD entra: As pessoas com problemas do foro psiquiátrico que perdem a capacidade de atribuir relevância a momentos podem ter nesta droga a oportunidade de o fazer novamente.
Para os investigadores, a forma de atuação do LSD pode mostrar-se, no futuro, importante para terapias psiquiátricas, uma vez que ajuda a compreender melhor a atuação do cérebro e o significado dado a tudo o que rodeia, uma vez que o alucinogénio aumenta a capacidade de perceber e atribuir significado, algo que se perde com o declínio cognitivo, por exemplo.