"Quando temos a capacidade de discernir que juntos somos mais fortes, conseguimos perceber que há, à nossa volta, muito a ser feito”. Esta simples conclusão bastou para que quatro jovens de Santa Maria da Feira criassem o projeto ‘Cão ou sem Casa?’, hoje com cerca de três anos.
Atualmente, o projeto tem para adoção 30 animais, mas desde 2015 já salvou mais de 150. “Costumamos sentir a necessidade de os contabilizar, no final de cada ano, para começar o ano seguinte com a consciência de que, se quatro pessoas o fazem sozinhas, podem vir a ser atingidos números maiores. O importante é ter a capacidade de ver para além do animal irracional. É uma vida, quer salvemos um ou 50”, salienta Joana Lamoso, uma das responsáveis pelo ‘Cão ou Sem Casa?’.
A Joana, que é da área da comunicação, junta-se Ana Tavares, administrativa e Joana Rodrigues e Catarina Adão, ambas fotógrafas. Em comum, além da cidade onde moram, todas têm a vontade de dar início a uma luta que acreditam ser “de todos os que tiveram a bênção de estar neste planeta, nesta cidade, da rua onde vivem”. “Ter a consciência de que o problema do abandono animal existe foi o primeiro passo”, conta Joana ao Notícias ao Minuto, admitindo não ter sido difícil para as quatro unirem-se pela causa animal e juntarem o potencial de cada uma na área em que melhor trabalham.
Ter a consciência de que o problema do abandono animal existe foi o primeiro passoSem grande apoio e a arranjar tempo entre os horários de trabalho de cada uma, o ‘Cão ou sem Casa?’ atua através da divulgação nas redes sociais do projeto de animais que lhes chegam através de apelos de particulares ou através de mesmo associações que lhes peçam ajuda.
A cada animal resgatado é associada a sua história, informações relevantes e contacto do protetor que o acolhe temporariamente, o chamado 'FAT' (Família de Acolhimento Temporário'). “Se houver o desejo de adoção responsável, a mesma é feita diretamente com o adotante. Nós apenas fotografamos, divulgamos e fazemos a ponte entre histórias com finais felizes”, resume Joana, que não esconde os momentos mais difíceis por que passa com as muitas histórias que lhes chegam, o que obriga a uma atitude positiva que se apoia na ideia de que o retorno chega, mesmo que demore.
Passaram por nós casos de animais que por consequência de atropelamento estavam cegos e milagrosamente voltaram a ver! Ou cadelas parideiras (sim, de onde vêm os animais que compram ilegalmente!) que são expostas a condições miseráveis para produzirem, sem critério, e que hoje, apesar de todo o trauma, ainda sabem amar. A piada da vida está em vivê-la com a graça dos animais para que no final das ‘cãontas’ a pergunta seja sempre respondida positivamente: ‘Cão ou Sem Casa?’.”
O humor escrito sobre a forma de trocadilhos é por isso uma constante neste projeto, que não tira a merecida atenção ao lado mais sério da questão. Entre os casos mais difíceis, está o de Vitória, uma gatinha que ainda não foi adotada e que foi acolhida com um golpe de calor. Estava em convulsão há cinco horas quando foi resgatada por duas protetoras particulares, lembra Joana. “O estado dela era tão grave que muitas pessoas criticaram quem estava com o caso por não procederem à eutanásia. Mas as protetoras sempre se defenderam afirmando que tinham falado com a equipa médica que socorreu a gata e, embora fosse um caso difícil, havia hipóteses de recuperação. Seria improvável, seria lento, mas havia essa chance.”
Ajudar, sem pretender nada em troca, está ao alcance de todoVitória esteve em semi-coma durante 3 dias. Desde então tem recuperado os movimentos, o equilíbrio. Possivelmente, nunca recuperará por completo do ligeiro desequilíbrio motor com que ficou, resultado e sequela das 5 horas de convulsão por que passou até ser resgatada e socorrida. O facto de ser portadora do vírus da leucemia felina também dificulta a adopção, pois não poderá conviver com gatos que não tenham esta patologia e não estejam vacinados contra ela, por ser uma doença contagiosa. “Este é um exemplo das situações que mais nos completam caso a adopção se concretize. Um animal especial que precisas de uma família humana especial, capaz de abraçar estas particularidades e acolher o animal” admite Joana.
Vitória© Cão ou sem Casa
No Dia Mundial do Cão, que hoje se celebra, vale a pena aceitar a proposta de reflexão de ‘Cão ou Sem Casa?: “Os animais são o nosso lado mais humano, a lealdade e pureza trazida ao mundo, não para nos divertir, mas para nos provar muitas realidades. Abandonar, realizar dinheiro com a criação ilegal, comprá-los dessa forma, subestimar, ignorar a realidade, mata, todos os dias, a fome dos que nunca vão saber o que é o verdadeiro amor.”
Aos outros, e enquanto os animais abandonados e de rua forem uma realidade, resta continuar na missão e passar a mensagem de que “ajudar, sem pretender nada em troca, está ao alcance de qualquer um”.