Sistema fiscal português "beneficia os mais ricos e prejudica os pobres"
A antiga ministra das Finanças Manuela Ferreira Leite defendeu hoje que o sistema fiscal em Portugal deve ser simplificado, uma vez que a sua complexidade "beneficia os mais ricos e prejudica os pobres".
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Economia Ferreira Leite
"O grande problema que se nos vai por é a questão fiscal. Vai ser premente em termos de discussão política e europeia", disse a economista na 5.ª Edição do Fórum das Políticas Públicas realizado no ISCTE -- IUL, em Lisboa, lembrando que o sistema fiscal português "é altamente complexo" e que "grande parte dos países que fazem reformas fiscais é para simplificar o sistema".
E prosseguiu: "A complexidade do sistema fiscal é cada vez maior e o aumento do número de conflitos significa uma máquina fiscal que não funciona, que não permite maior redistribuição, equidade e melhor eficiência".
"Os sistemas fiscais mais complexos beneficiam os mais ricos e prejudicam os pobres", advertiu a economista, lembrando também que a questão da harmonização fiscal na União Europeia em relação ao IRC, "não existe e é um grande problema de concorrência".
Manuela Ferreira Leite considerou que "é injusto e inaceitável" que parte dos rendimentos das empresas "não sejam tributados no país onde são gerados", dando como exemplo o Luxemburgo.
Para a antiga ministra isso cria "uma distorção na concorrência, que é verdadeiramente inaceitável", lembrando que aqueles países que "são muito rígidos", e por isso menos abertos à harmonização fiscal, "são os que mais beneficiam".
Já Bagão Félix, antigo ministro da Segurança Social, ao falar sobre equidade fiscal, manifestou a sua preocupação com "a redistribuição geracional".
"Estamos perante uma questão de orçamentação geracional que se coloca em termos gerais, mas também ao nível das funções sociais do Estado", afirmou.
O economista defendeu que para haver equidade fiscal a legislação portuguesa terá de ser "mais simples de entender e aplicar", posição partilhada pela economista Manuela Ferreira Leite.
"Isto é meio caminho andado para que haja equidade fiscal", acrescentou Bagão Felix.
Além disso, considerou que a questão da estabilidade do sistema fiscal "é crucial", adiantando que é mesmo "uma questão patrimonial" do sistema fiscal português.
Bagão Félix, manifestou-se, no entanto, contra a adoção de políticas adjacentes, isto é, que "não são do sistema tributário", pois não se cingem ao núcleo das despesas fiscais "inerentes à vida", nomeadamente as de saúde e habitação.
"Há imensas coisas que estão na despesa fiscal e não deveriam estar lá", frisa o economista.
Tanto Manuela Ferreira Leite como Bagão Félix manifestaram também a discordância em relação a uma reforma fiscal em Portugal feita com "remendos e ajustamentos fiscais", numa alusão à introdução dos escalões no IRS (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares).
A economista adverte para o facto de este ajustamento fiscal "dar um ar que beneficia as populações, mas [ressalva] os mais prejudicados são aqueles que têm menos rendimentos".
Manuela Ferreira Leite não só se mostrou contra o atual "sistema fiscal [complexo]" como entende que todo o sistema de deduções "é extremamente difícil de alterar".
"Não há passagem automática do pior sistema fiscal para o melhor sistema fiscal", alerta, lembrando que é necessário haver tempo.
O economista Francisco Louçã, que participou também no Fórum das Políticas Públicas, mostrou-se a favor da simplificação do sistema fiscal e alertou para o facto de ao se introduzir um só escalão no IRS poder haver "um efeito regressivo".
"Ao introduzir um só escalão é muito provável que o feito produtivo seja regressivo", disse o professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), lembrando ainda que "é uma boa razão e é mais vantajoso alterar mais que um escalão, se isto for combinado com um novo regime de deduções ou para os simplificar".
Embora os três economistas vejam com dificuldade a realização de "uma verdadeira" reforma do sistema fiscal em Portugal, com o propósito de haver mais equidade, e sem serem "[meros ajustamentos fiscais", Manuela Ferreira Leite lembrou que se falou apenas da tributação do rendimento e não da despesa.
"A tributação da despesa não cria iniquidades como à primeira vista se pensou. Aumentou a receita e teve um efeito de redistribuição sobre a atividade económica", afirmou.
"Não existe ainda a ideia de uma progressividade negativa sobre os impostos indiretos em Portugal e estamos a minimizar o problema da política fiscal", defendeu a economista.
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