"A estabilidade política é um ativo precioso nos tempos que correm", afirmou o governador na apresentação do Relatório de Estabilidade Financeira, em conferência de imprensa, em Lisboa.
Mário Centeno considerou que deve haver "um quadro muito claro de previsibilidade e estabilidade" em Portugal e criticou enquadramentos políticos "em que se tomam decisões num dia e depois voltam para trás" no outro.
Ainda assim, alertou para o observado "no outro lado do Atlântico".
Neste cenário, o governador do Banco de Portugal apontou que apesar de o BdP e ele próprio usarem "a palavra incerteza poucas vezes", neste momento "é difícil não a utilizar".
"A palavra incerteza é uma palavra que os decisores de política económica devem usar com muita parcimónia, porque quando dizemos que enfrentamos um mundo incerto, temos que saber como é que isto ressoa, como é que isto se traduz naqueles que na verdade são o objeto último das nossas decisões", acrescentou.
A opinião é replicada no relatório hoje apresentado, que refere que os riscos para a estabilidade financeira se acentuaram, refletindo "os desenvolvimentos adversos na atividade económica global associados a maior imprevisibilidade de políticas económicas dos Estados Unidos da América (EUA), que se junta a um contexto de elevada incerteza geopolítica".
A imprevisibilidade decorrente das políticas relacionadas com as tarifas de Washington soma-se aos conflitos militares na Ucrânia e no Médio Oriente.
Nesse sentido, aponta que o aumento da despesa com defesa na Europa poderá estimular a atividade económica mas, ao mesmo tempo, acentuar as pressões inflacionistas, "podendo constituir um desafio adicional para a política monetária".
Em Portugal, o alerta segue para os efeitos de uma conjuntura adversa na procura e nos preços no mercado imobiliário, que deverão ser limitados no curto e no médio prazo.
"A forte subida de preços no segmento residencial tem sido sustentada pela subida do rendimento disponível, pela procura de estrangeiros residentes e não residentes, pelo aumento dos custos de construção e por um ajustamento lento da oferta", aponta o relatório.
Admitindo que o impacto direto em Portugal da alteração da política comercial dos EUA deverá ser "limitado e circunscrito em termos setoriais" e impactar, sobretudo, os setores mais orientados para exportação -- nomeadamente indústria e, em menor escala, o comércio, o banco central foca-se nos efeitos indiretos.
"Os efeitos indiretos, decorrentes do aumento da incerteza que condiciona decisões de investimento e consumo, poderão piorar a atividade económica e as condições de financiamento", registam.
O BdP considera ainda que é "fundamental manter a trajetória da redução do rácio" da dívida pública portuguesa, respeitando os critérios de sustentabilidade e as normas orçamentais da União Europeia (UE) , apesar da consolidação das contas públicas na última década.
No setor financeiro não bancário os riscos "permanecem limitados", estando exposto, "sobretudo, a desenvolvimentos nos mercados financeiros internacionais", enquanto no setor segurador a resiliência é apoiada por níveis de solvência "materialmente acima dos requisitos regulamentares".
Dentro do setor bancário, à elevada rendibilidade e boa qualidade dos ativos contrapõem-se os riscos associados à exposição a títulos de dívida pública (19%) e ativos imobiliários -- com destaque para empréstimos com garantia hipotecária (25%).
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