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Zeca: O português que se tornou deus grego e já é rei na Dinamarca

A recente conquista pelo Copenhaga, o orgulho de representar a Grécia e as tristezas motivadas pela falta de reconhecimento no nosso país são os principais temas de uma entrevista emotiva, sincera e direta de um jogador que aos 30 anos ainda tem vários sonhos por concretizar.

Zeca: O português que se tornou deus grego e já é rei na Dinamarca
Notícias ao Minuto

08:06 - 11/05/19 por Fábio Aguiar

Desporto Exclusivo

Depois de seis temporadas no Panathinaikos, onde se tornou uma das grandes figuras, Zeca rendeu-se à ambição e aceitou o convite do Copenhaga. Para trás, o jogador português, formado no Casa Pia - representou ainda o V. Setúbal, em 2010/11, antes de rumar a solo helénico - deixou mais do que um clube. 

A forte relação que criou com a Grécia desde o primeiro momento levou o médio a naturalizar-se. Daí até à chamada à seleção foi um passo, quase tão rápido como aquele que deu logo que chegou à Dinamarca e assumiu a braçadeira de capitão. 

Hoje, menos de uma semana depois de se sagrar pela primeira vez campeão ao serviço dos nórdicos, Zeca deixa os sentimentos falar mais alto.

A recente conquista, o orgulho de representar a elite do futebol grego e as tristezas motivadas pela falta de reconhecimento no nosso país são os principais temas de uma entrevista emotiva, sincera e direta de um jogador que aos 30 anos ainda tem vários sonhos por concretizar. É um exclusivo Desporto ao Minuto

Notícias ao MinutoZeca cumpre a segunda temporada ao serviço do Copenhaga e já se assumiu como capitão de equipa. A festa do título deixou o jogador português rendido.© Facebook FC Copenhaga

Ainda se vive em ambiente de festa em Copenhaga?

Sim, foi uma grande festa, até mesmo pela própria emoção do jogo. Começámos a perder, demos a volta para 2-1, eles empataram e nós conseguimos fazer o 3-2 final. Depois, foi fantástico, uma festa única com toda a equipa, as nossas famílias, os adeptos, o staff... Agora ainda temos a festa do troféu, que será no último jogo do campeonato e espero que seja ainda maior. Sinceramente, já tinha imaginado como seria, mas superou as minhas expetativas.

Nota-se que foi especial...

Foi muito especial por ser o meu primeiro título de campeão desde que sou profissional. Por isso, foi um sentimento que não consigo explicar, pois era um objetivo que já tinha há muito tempo. Infelizmente, não o consegui na Grécia e foi também por isto que decidi aceitar o convite do Copenhaga, pois sabia que se trata de um clube que luta sempre para vencer o campeonato.

Só prova que a escolha foi bem feita...

Sem dúvida! Na altura manifestaram muito interesse em mim e agora sei que foi uma mudança muito positiva para a minha carreira. Acho que foi a melhor coisa que me podia ter acontecido.

Foi fácil a adaptação ao futebol dinamarquês?

Sim, até porque os meus colegas adaptaram-me muito e eu também tenho alguma facilidade em fazer amigos e em dar-me bem com as pessoas. O mais complicado foi a adaptação ao clima, pois não estava habituado a tanto frio. Além disso, a língua também foi difícil. Claro que todos falamos inglês, mas por vezes falavam dinamarquês e aí era mais difícil.

Notícias ao MinutoMédio celebrou a conquista do primeiro título de campeão da sua carreira.© Facebook FC Copenhaga

Como surgiu a oportunidade de ser capitão logo após a chegada?

(risos) Sim, fui capitão logo no segundo jogo pelo clube... O nosso capitão e o sub não iam jogar e nessa semana, dois dias antes do jogo, o mister chamou-me ao balneário e perguntou-me como me sentiria se fosse capitão. E eu disse: 'Mister, há outros jogadores que estão aqui há muito mais tempo e não sei como é que eles podem encarar isso.' E ele só me perguntou: 'Tu sentes-te bem com essa situação?' E eu disse que sim, até porque já o tinha sido durante quatro anos no Panathinaikos. No entanto, era diferente, pois nem conhecia bem os meus companheiros, sabia apenas os nomes. Contudo, aceitei o desafio e foi assim que tudo começou. 

E aceitaram bem?

Alguns ficaram meio chocados quando o mister disse que eu seria o capitão, mas ninguém olhou para mim de forma diferente ou ficou chateado com essa situação. Respeitaram, ajudaram-me... Contudo, ficaram surpreendidos. 

Daí para cá como é que tudo evoluiu?

Na altura, nem fiquei no lote de capitães, foi só mesmo para aquele jogo, até porque o terceiro era o Santander, que entretanto se transferiu para o Bolonha. Depois, no início desta época, durante a pré-temporada, o mister chamou-me e disse-me que eu iria ser o capitão. Eu até nem estava à espera, pois já tínhamos feito dois jogos de preparação e o capitão tinha sido o nosso lateral-esquerdo, o Boilesen. Então eu perguntei: 'Mister, então e o Boilesen?'. E ele disse-me: 'Não te preocupes que eu vou falar com ele. Fica tudo resolvido. Tu é que vais ser o capitão!'. E eu disse: 'Ok, o mister é que manda, o mister é que decide. Eu aceito.'. E assim foi. Ele aceitou muito bem a decisão, disse que estava ali para me ajudar e se eu precisasse de alguma coisa que era só dizer. Foi tranquilo...

É um reconhecimento dos grandes...

Sim, é, claro! É um reconhecimento do meu trabalho e talvez até da minha personalidade de líder. Acho que ele viu qualidades em mim para isso e para mim é uma alegria enorme ser capitão de um grande clube. Estou super feliz! 

Quais foram as principais características do futebol dinamarquês que mais dificultaram no início?

É um futebol mais físico do que o grego, tem equipas a jogar melhor do que na Grécia, que tentam mesmo impor o seu jogo e isso complica, pois não é fácil defrontar adversários que também gostem de ter bola. Aqui estão sempre a correr, não param, não desistem... 

Notícias ao MinutoJogador português representou o Panathinaikos durante seis temporadas e tornou-se uma figura do clube.© Reuters

Foi mais difícil deixar a Grécia e toda a vida num país que tanto lhe deu do que propriamente a mudança de clube?

Quando eu estava para assinar pelo Copenhaga tive dúvidas se o deveria mesmo fazer. Estive na Grécia muitos anos, afeiçoei-me bastante ao país, ao clube e às pessoas e era difícil ver-me longe de tudo isso. No entanto, há coisas que são maiores, como a carreira, a vontade de conquistar outras coisas e o próprio desafio. Já estava há vários anos no Panathinaikos, tinha dado muito ao clube, tal como o clube a mim, e precisava de algo novo. Apareceu o Copenhaga, aceitei, mas fui com o coração apertado. 

Até porque para trás ficou também o 'seu' país, aquele que representa sempre que veste a camisola da Seleção... 

Sim, é especial! Tudo começou numa conversa com o presidente do Panathinaikos, que gostava imenso de mim, dizia que eu ia ficar lá a viver, que ia ficar muitos anos no clube e a verdade é que essa chegou a ser a minha intenção. E perguntou-me por que é que não me tornava grego, por que é que não tirava o passaporte. E eu respondi-lhe: 'Presidente, se me ajudar, eu tiro!'. Entretanto, ele começou logo a tratar das coisas, sem me dizer nada sobre a possibilidade de representar a Seleção. Um certo dia, o selecionador, que era o Michael Skibbe, ligou-me e perguntou se eu conseguisse tirar o passaporte, se estaria disponível para jogar pela Grécia. Eu disse prontamente que sim e convidou-me para tomar um café. Ele disse que me queria ajudar a obter o passaporte para ser chamado o mais depressa possível e assim foi. Foi fácil, até porque a Federação e o Panathinaikos ajudaram. 

Outro enorme reconhecimento...

É verdade! É uma satisfação enorme e um orgulho. Ver que as pessoas do país querem que represente a sua seleção mesmo não sendo grego, é um sentimento único. 

Sentiu algum tipo de divisão entre os gregos?

Há sempre quem não aceite e quem não veja com bons olhos uma naturalização. No meu caso, para ser sincero, senti muito pouco. Claro que ouvi algumas pessoas a falar sobre isso, mas foram muito mais aquelas que apoiaram e que concordaram. O que pensei nesse momento foi que só me cabia a mim provar àquelas pessoas que não concordavam que estavam erradas, que eu seria uma mais valia e que os iria defender sempre. 

Notícias ao MinutoSem oportunidades de jogar por Portugal, Zeca naturalizou-se grego e passou a representar a seleção helénica.© Reuters

Como foi a emoção da estreia?

Eu sabia que não ia jogar de início frente à Bélgica, jogo que acabámos por empatar, e entrei a sete minutos do fim. Mas esse dia foi muito importante para mim. Cantar o hino junto dos meus companheiros e sentir que fazia parte daquele grupo foi ótimo, porque todos me acolheram como um grego desde o início.

Como se explica esse sentimento de ser português e representar outra seleção? O sentimento é o mesmo?

Achava que seria o mesmo, sinceramente. Isto porque as pessoas deram-me a possibilidade de representar um país, a Grécia neste caso, algo que o meu não me deu. Não sinto nenhum tipo de mágoa, nem fiquei chateado, longe disso, pois dependia de mim ir à seleção portuguesa e se não fui é porque naquele momento havia um leque de jogadores melhores. Pessoalmente, senti o mesmo. O país diz-me tanto e o clube diz-me tanto que me arrepiei bastante ao cantar o hino. É uma forma de os recompensar por tudo o que me deram. Obviamente que eu adorava ter representando Portugal, sou português, mas sinto-me grego. Na minha cabeça, neste momento, acho que é exatamente igual.

Pode dizer-se que se sente mais valorizado fora de Portugal?

Senti isso, tanto na Grécia, como agora na Dinamarca. Aliás, em Portugal, há poucas notícias que saem sobre mim, não sei se foi por me naturalizar grego. Não é que isso tenha que acontecer, mas os meus feitos passam um pouco ao lado. É verdade que jogo pela seleção grega, porém nasci em Portugal e sou português. Acho que isso deveria ser um motivo de orgulho para os portugueses.

É verdade, sem dúvida!

Curiosamente, ainda hoje estava a ver uma fotografia nas redes sociais, num artigo sobre os portugueses que foram campeões fora de Portugal e havia comentários de pessoas a questionar as razões para eu estar incluído nesse lote. Um deles dizia que eu já tinha saído há muito de Portugal, que jogava pela seleção grega e que, por isso, já nem português era. Outro dizia que eu devia ser um motivo de vergonha tanto para os portugueses como para os gregos. 

Incrível...

Eu respeito cada opinião, mas isto para explicar que há pessoas que não conseguem perceber que eu não tive oportunidades em Portugal. Eu não me sinto triste, contudo, confesso que me toca um pouco por serem portugueses a dizer isso. Se fossem gregos, eu até percebia porque sou um estrangeiro a jogar pela seleção deles. Assim é mais complicado... Tenho pena. 

Notícias ao MinutoInternacional grego pretende continuar no Copenhaga, mas não fecha as portas a nenhuma possibilidade de mudança.© Facebook FC Copenhaga

 Apesar disso, voltar ao nosso país está nos planos?

Eu não digo não a nada, deixo sempre todas as portas abertas, mas estando eu no maior clube da Dinamarca, que ganha campeonatos e que joga regularmente as competições europeias, acho que, para voltar a Portugal, teria que ir para um clube que me oferecesse o mesmo. E isso, sinceramente, penso que não seria possível neste momento, até pela idade que tenho (30 anos). Se fosse para ser, já tinha acontecido. No entanto, no futebol nunca se sabe...  

Numa breve passagem pelo futebol português, como vê a atual corrida pelo título?

Penso que o FC Porto ainda pode sonhar. Acho que o Benfica tem mais possibilidades de conquistar o título, até pelo calendário que tem. Contudo, o FC Porto ainda deve acreditar, pois da mesma forma que teve deslizes esta época, o Benfica também os pode ter e de um momento para o outro tudo muda. 

Recentemente surgiram rumores de um suposto interesse do FC Porto em Robert Skov, que é seu companheiro de equipa no Copenhaga. O que nos pode dizer sobre este avançado de 22 anos?

É um jogador rápido, bom tecnicamente e com um remate fantástico, como poucos que já vi. Em livres e remates de fora da área é fortíssimo, incrível mesmo. É, no entanto, muito jovem, jogava numa equipa que até desceu de divisão e só esta temporada é que se conseguiu mostrar. Penso que precisaria de tempo para se adaptar a uma realidade como a do FC Porto. 

Mas é jogador com qualidade para vingar na Invicta?

Sim, acho que as pessoas teriam que ter muita paciência com ele, ajudá-lo, pois se isso se confirmar será a primeira vez que ele irá jogar fora do país. Terá que se adaptar, ganhar confiança e demonstrar o seu valor. Se lhe derem essa margem, acredito que será um jogador importante. 

Notícias ao MinutoMédio sonha ainda voltar ao Panathinaikos para acabar a carreira, num clube que tem um lugar especial no seu coração.© Reuters

E quanto ao seu futuro, passa pelo Copenhaga?

Eu tenho mais dois anos de contrato. De momento, o meu futuro passa por aqui, não falei com ninguém sobre possibilidades de sair, o meu empresário não me apresentou nada e a verdade é que eu estou muito feliz aqui. No entanto, como já disse, não fecho as portas a nada. 

Quais são os seus principais sonhos nesta altura?

Eu gostaria de jogar um Campeonato da Europa com a Grécia e - não sei se deveria dizer isto -, talvez, um dia mais tarde, voltar ao Panathinaikos e acabar lá a minha carreira. 

E depois do futebol, daqui a 10 anos, por exemplo, onde se vê?

Bem, possivelmente, vejo-me a trabalhar como agente, com a minha própria empresa. É uma área que gosto e poder ajudar outros jogadores a fazer carreira, fascina-me. Vamos ver...

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