"Nasci, cresci, fui educado e comecei a envelhecer neste país ainda antes do 25 de Abril. Meu pai, por informação da PIDE, não foi autorizado a concorrer a professor da Faculdade de Medicina de Lisboa", disse.

Por isso, continuou o mestre Cutileiro, "este doutoramento tem um sabor de ajuste de contas".

"Esta formatação molda as pessoas e fá-las, fez-nos, faz-nos ter reações estranhas", acrescentou.

João Cutileiro discursava na Universidade de Évora (UÉ), na cerimónia em que lhe foi outorgado o doutoramento Honoris Causa e após receber as insígnias doutorais.

O mestre, de 76 anos, lembrou que o seu pai e irmão nasceram em Évora, cidade onde ele próprio reside e trabalha, apesar de ser natural de Lisboa.

"O que mais me levou a aceitar esta homenagem foi a longa lista de pessoas que eu tanto admiro e gosto e em cuja companhia vou estar", justificou, aludindo às personalidades que já são Honoris Causa pela UÉ.

Mário Soares, Graça Machel, Túlio Espanca, José Saramago, Malangatana, Sebastião Salgado, Mia Couto, Rui Nabeiro e Cláudio Torres foram os "colegas" doutores que enumerou.

Em declarações aos jornalistas, à margem da cerimónia, o escultor disse não atribuir qualquer significado especial a esta distinção, pois, a sua "carreira nunca foi académica e não vai passar a ser".

"Nunca fui professor, não tenho o sétimo ano dos liceus, não vejo razão" para este doutoramento, afirmou.

A outorga do Honoris Causa, frisou Cutileiro, artista reconhecido nacional e internacionalmente, só teve o condão de o reunir com vários amigos: "É giro ver os amigos. Gosto muito de ver os amigos todos".

A academia alentejana justificou a decisão de conferir o doutoramento a João Cutileiro devido à "importância da sua obra ao nível da escultura".

O seu trabalho artístico "exerceu influência na evolução das linguagens artísticas contemporâneas", acrescentou a UÉ.

João Cutileiro nasceu em Lisboa, em 1937, mas vive e trabalha em Évora, onde está exposta uma parte da sua obra, desde 1985.

Frequentou a Escola Superior de Belas Artes de Lisboa e, mais tarde, foi para a Slade School of Art, em Londres (Inglaterra).

Reconhecido nacional e internacionalmente, o mestre Cutileiro já foi galardoado com vários prémios e as suas obras estão expostas em todo o mundo.