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"Os turistas em Lisboa vão cansar-se de olhar uns para os outros"

Cristina Lobo Antunes está na corrida à presidência da Junta de Freguesia de Ourique, na lista do PSD.

"Os turistas em Lisboa vão cansar-se de olhar uns para os outros"
Notícias ao Minuto

08:32 - 23/09/17 por Patrícia Martins Carvalho

Política Campo de Ourique

Depois de anos e anos no jornalismo, Cristina Lobo Antunes decidiu arrumar a Cristina Ferreira de Almeida na gaveta e iniciar um novo capítulo na sua vida, desta vez na política, usando para isso o apelido do marido.

Por ter nascido e crescido em Campo de Ourique, Cristina Lobo Antunes quer ser a próxima presidente da Junta para colocar a “aldeia que está no meio da cidade” ao nível de outras freguesias lisboetas mais conhecidas e mediatizadas.

E para isso, bate o pé, é preciso que o Metro chegue a Campo de Ourique até porque, critica, a oferta de autocarros da Carris é quase nula.

Se o mandato de Fernando Medina não escapa a críticas, o “crescimento” que Teresa Leal Coelho “tem tido” na campanha não escapa a elogios.

E se perder a corrida à Junta? “O mundo não acaba”. 

Como é que uma jornalista decide candidatar-se à presidência de uma Junta de Freguesia?

Candidatar-me era um desejo antigo meu, enquanto estava ainda nas redações. Acho que as razões por que eu fui para o jornalismo são semelhantes às razões pelas quais tirei uma licenciatura em Sociologia e também são semelhantes às razões que me levam para a política local.

E que razões são essas?

Por um lado é a vontade de perceber o que se passa à minha volta e, por outro, é ter algum envolvimento e alguma utilidade para a comunidade em que vivo.

E no jornalismo não era possível esse envolvimento e essa utilidade?

Quando se está em lugares de chefia, como era o meu caso, vamo-nos distanciando um pouco da realidade, porque deixamos de estar no terreno. E isso cria uma distância enorme em relação às razões pelas quais se escolhe esta profissão, o que, a partir de dada altura começa a deixar uma certa insatisfação.

Já estava há muitos anos em cargos de chefia e isso estava a causar-me alguma insatisfação. E depois tinha este apelo do trabalho da comunidadeEstava insatisfeita com o jornalismo?

Estava insatisfeita em relação àquilo que era a minha vontade em estar mais próxima das pessoas e de estar mais no terreno. Já estava há muitos anos em cargos de chefia e isso estava a causar-me alguma insatisfação. E depois tinha este apelo do trabalho da comunidade, do que é viver na rua, porque eu nasci e vivi em Campo de Ourique e é um bairro que tem muito esta característica. Já os meus pais faziam muito vida de bairro. São raras as memórias dentro de casa que tenho da minha infância, a maior parte é na rua, nos jardins, no café, com os vizinhos…

Campo de Ourique parece uma pequena aldeia dentro da cidade…

Sim, é uma pequena aldeia. Acho que herdei isso da educação que os meus pais me deram e, é evidente, fica qualquer coisa cá dentro. Cheguei a um ponto em que pensei ‘como é que posso conjugar estas experiências que já tive na vida, os conhecimentos que adquiri e fazer um trabalho que me dê prazer e que possa ser a síntese disto tudo?’. E foi assim que surgiu esta vontade de me candidatar.

Pensou muito antes de tomar esta decisão?

Há imenso tempo que andava a pensar nisto. Ponderei pedir uma licença sem vencimento, mas é uma situação muito complicada ser jornalista e candidata ao mesmo tempo, cria problemas para a redação e para o próprio jornalista. A opção acabou por ser suspender temporariamente o jornalismo e dedicar-me em exclusividade a esta campanha e em perseguir este sonho.

E vai ter saudades do jornalismo?

Não, porque vou continuar a ler jornais.

Mas lê-los não é o mesmo que fazê-los…

Não… mas eu lei-os com a perspetiva de quem já os fez. Por um lado sou mais crítica, mas por outro lado até tenho um nível de tolerância maior do que a maioria das pessoas, porque compreendo as dificuldades e sei que o que está por trás não são más intenções como as pessoas pensam.

E o que é?

Às vezes há circunstâncias que têm a ver com as limitações ao trabalho dos jornalistas, que são cada vez maiores, porque as redações são cada vez mais pequenas e os orçamentos para as redações também são cada vez mais curtos e isso cria muitas limitações.

Todos estes anos de jornalismo deram-me alguma capacidade de compreender os problemas das pessoas O facto de ser jornalista pode ser uma mais-valia ou ser prejudicial?

Acho que é uma mais-valia. Todos estes anos de profissão deram-me alguma capacidade de compreender os problemas das pessoas e de conseguir formular diagnósticos, conseguir perceber qual é o enquadramento daquele problema, a quem é que ele tem de ser dirigido, quem é o responsável… só vejo o jornalismo como uma vantagem.

E do ponto de vista do eleitor? O eleitor vai ter confiança em votar numa jornalista?

Não sei. Nunca pensei nisso, confesso. Sempre achei que o jornalismo era uma profissão muito digna, sempre tive orgulho em ser jornalista e custa-me compreender alguns ataques, mas acho que esses ataques têm muito a ver com uma pequena classe, com um tipo de grupos sociais a quem não dá jeito o trabalho que os jornalistas fazem.

Está preparada para estar do outro lado da barricada?

Sinto-me preparadíssima. Antes de me atirar para isto pensei bem. Fiz uma análise desapaixonada e sincera ao que tem sido o meu percurso e tentei perceber se haveria algum ponto em que eu pudesse um dia ter de vir a dar explicações e, sinceramente, tenho a consciência tranquila.

Houve alguém que a tivesse desencorajado?

Não. Familiares, amigos, conhecidos, desconhecidos, pessoas com quem não falava há anos e agora encontro têm uma simpatia muito grande em relação à ideia de querer ser presidente da Junta. A certa altura sinto quase que estou a fazer qualquer coisa por um clube de futebol [risos]. A Junta de Freguesia não tem a carga negativa que a política a outros níveis tem. Tem mais a ideia do serviço da comunidade, das relações de vizinhança… e as pessoas sabem que no dia seguinte à tomada de qualquer decisão vou andar na rua e vou sofrer as consequências dos meus atos.

Porquê Lobo Antunes e não Ferreira de Almeida?

São os meus apelidos. O Ferreira de Almeida estava muito ligado ao meu percurso profissional enquanto jornalista e o nome no jornalismo é uma coisa que marca muito. Virando esta página na minha vida e dedicando-me a outra função completamente diferente achei que poderia mudar de nome, que seria positivo para mim para começar um novo capítulo.

Que tipo de presidente de Junta quer ser?

Quero ser uma presidente próxima das pessoas, andar muito na rua e não estar fechada no edifício da Junta. Quero fazer uma presidência descentralizada e aberta. Quero ser uma presidente criativa, porque há soluções que é preciso conceber e pôr em prática e, às vezes, os instrumentos tradicionais de uma junta de freguesia não são suficientes e, então, é preciso ter alguma criatividade. No fundo quero ser próxima, criativa e eficaz. Quero chegar ao fim do mandato e ter orgulho ao ver que consegui fazer as coisas a que me propus fazer.

Já sabe em que áreas é mais urgente intervir?

Dividi o meu programa em três grandes áreas. A primeira é a mobilidade, que envolve os transportes e o estacionamento, que são problemas muito graves em Campo de Ourique onde só há dois autocarros e com horários muito curtos e onde o estacionamento é um problema gravíssimo. Outra grande área é a ação social e a educação e tem a ver com o apoio escolar às crianças durante o período de interrupção escolar, bem como o apoio aos idosos. A terceira área tem a ver com a valorização da requalificação do espaço público: ruas, jardins, espaços para os cães, tudo isto está um bocadinho desmazelado.

Há pouco falou em "sonho". Qual é o seu sonho para Campo de Ourique?

O meu sonho é fazer da freguesia uma freguesia única em Lisboa, no sentido de uma consciência de comunidade, de uma consciência ecológica e de uma forma de estar que aproveite as qualidades da aldeia, que a freguesia já tem atualmente, e que transforme isso em qualidades de alto nível em Lisboa.

E o turismo?

O turismo é importantíssimo, embora neste momento não seja ainda muito importante para Campo de Ourique porque não há transportes e a freguesia não está no centro dos roteiros turísticos.

Mas tem potencial?

Claro que tem. Uma parte final do percurso do elétrico 28 atravessa o bairro e muitos turistas que saem no final da linha ficam um pouco perdidos. É preciso agarrar nestas pessoas e pô-las a conhecer o bairro que é muito tradicional e ainda muito habitacional, com comércio local, que é coisa que já não encontram em muitos dos bairros mais turísticos da cidade.

Campo de Ourique vai ter de ter Metro. É de elementar justiçaQue planos tem para os transportes?

Campo de Ourique vai ter de ter Metro. É a freguesia que deve ser prioritária para a extensão da linha do Metro e essa expansão deve ser feita pela linha vermelha, fazendo o percurso Campolide, Campo de Ourique e Santos. É de elementar justiça. Tem de ser feito um alargamento para o lado ocidental da cidade que está completamente desprotegido.

Mas essa é uma questão que não passa diretamente pela Junta de Freguesia.

Eu sei que é uma coisa que não está na minha mão e que não será para amanhã. Quanto aos autocarros é preciso falar com a Câmara e com a Carris e é preciso bater o pé e mostrar que esta é uma freguesia muito povoada que não está nas prioridades da Carris e que tem de estar.

Como vê a atuação de Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa?

Fernando Medina tem como primeira prioridade a atividade económica que, neste caso, se pode resumir ao turismo, o que não pode levar a que a população de Lisboa seja esquecida.

Pode resumir-se esta atuação à preocupação com os turistas?

A ideia que eu tenho é que, de repente, houve uma concentração de tudo o que é investimento e prioridades apenas em facilitar a vida ao turista, em tornar a cidade mais atraente para o turista. Mas seguindo essa lógica os turistas também se vão cansar de olhar uns para os outros. A cidade tem de ter um crescimento homogéneo. Antes havia duas zonas da cidade que estavam muito esquecidas: a oriental e a ocidental. A primeira foi desenvolvida, mas a segunda continua abandonada à sua sorte.

O abandono da parte ocidental da cidade é a principal crítica que faz ao mandato de Fernando Medina?

Essa é uma questão que me atinge especialmente, porque Campo de Ourique, infelizmente, foi englobado nesse lote de freguesias esquecidas. Mas a principal crítica que faço à gestão de Medina é que se concentrou demasiado no florescimento económico da cidade em detrimento da valorização da qualidade de vida das pessoas. É evidente que é muito bom haver tanto turismo em Lisboa, mas não se pode abandonar o resto da cidade.

Corremos o risco de ter uma cidade só para 'as Madonnas'?

Sim, é como disse a Teresa Leal Coelho: não podemos estar a deixar a cidade só para a Madonna e para as pessoas com o poder de compra como o dela. A cidade também tem de ser para as outras pessoas que nela querem viver e que não têm esse poder de compra, senão ficamos com um cenário só de turistas.

Acho que se continuar a crescer como tem crescido nesta campanha eleitoral, Teresa Leal Coelho pode ser uma surpresaTeresa Leal Coelho parece-lhe uma boa aposta do PSD?

Sim, acho que é uma boa aposta. É uma pessoa com uma visão estratégica para Lisboa interessante, que tem em conta o capital humano da cidade, é corajosa e tem muito carisma e as pessoas gostam dela. Acho que se continuar a crescer como tem crescido nesta campanha eleitoral pode ser uma surpresa para as pessoas que estão a partir do princípio de que vai correr mal. Eu acho que vai correr muito bem, sinceramente. Pode ser uma surpresa interessante.

E a Cristina? Está preparada para uma surpresa desagradável?

Evidentemente, estou preparada para ganhar e para perder. Estou convencida de que consigo ganhar esta Junta de Freguesia. Se perder, perdi, o mundo não acaba e essa é a beleza da democracia, não há resultados garantidos à partida.

Se perder volta ao jornalismo?

Não sei… vou pensar a seguir o que vou fazer. Há várias coisas que eu gostava de experimentar na vida, isto é uma delas. Se me correr bem vou dedicar-me a esta e vou concentrar-me nisto, se não correr bem há outros projetos que tenho congelados e que vou tirar do congelador.

Pode levantar o véu a esses projetos congelados?

Não. O importante agora é ganhar Campo de Ourique, formar o melhor executivo de uma Junta de Freguesia de Lisboa e pôr aquela freguesia num ‘brinquinho’.

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