Debate-se amanhã, dia 11 de julho, na Assembleia da República um projeto de lei que propõe a revogação da legislação aprovada em março de 2025 que reconhece e define a violência obstétrica em Portugal.
O diploma do CDS-PP, entregue no mês passado, visa revogar a lei 33/2025, publicada em 31 de março, que "promove os direitos na gravidez e no parto", e que foi aprovada em março passado com os votos contra do PSD, CDS-PP e a abstenção do Chega e da Iniciativa Liberal. Também o PSD quer que seja debatido a eliminação do conceito violência obstétrica desta mesma lei.
O projeto agora apresentado tem suscitado várias reações, com muitos a considerar que a proposta ignora as vozes das mulheres, protege práticas desumanas e perpetua a normalização do sofrimento. Já o CDS considera que a lei é vaga e pode levar a que o lado emocional e sentimental da mãe possa se sobrepor aos conhecimentos científicos e médicos, pondo vidas em risco.
Como tudo começou
No mês passado, o CDS-PP avançou com um projeto de lei que pretende revogar a lei 33/2025, em vigor desde 31 de março, por considerar que o conceito de violência obstétrica "não está alinhado com os padrões seguidos noutros países da União Europeia".
Seguiu-se, na sexta-feira passada, o PSD com um projeto de lei no mesmo sentido, entendendo que o conceito da atual lei é "excessivamente lato e indesejavelmente vago" e que a sua aplicação "poderia redundar na criação de um inaceitável estigma sobre médicos e profissionais de saúde, incentivando mesmo indesejáveis e perigosas práticas médicas defensivas".
A lei que agora se pretende alterar, que foi aprovada com os votos contra do PSD e do CDS-PP, escreve que se estabelece por violência obstétrica todos os atos físicos e verbais exercidos por profissionais de saúde que tenham como base um comportamento desumanizado, abuso de medicalização ou "patologização dos processos naturais, desrespeitando o regime de proteção", desde a preconceção até ao nascimento.
Esta lei permitiu, na mesma linha, a criação de um enquadramento legal para a episiotomia, uma incisão feita para facilitar o parto, promovendo a sua erradicação.
O que defendem CDS e PSD
Após o debate que a proposta do CDS suscitou, o partido manifestou, no início desta semana abertura para que não seja revogada toda a lei que promove os direitos da mulher na gravidez e no parto, desde que seja eliminado nessa legislação o conceito de violência obstétrica.
Para o deputado João Almeida "o erro fundamental" no processo legislativo sobre a lei dos direitos na gravidez e no partido, aprovada em março passado, foi "não ter ouvido todas as entidades", defendeu. Enquanto Paulo Núncio considera que “embora as preocupações com a gravidez relativas ao parto e à recuperação pós-parto sejam perfeitamente legítimas, [...] a atual lei é desproporcional, é desajustada da realidade e pode ter efeitos sociais perversos”.
Para do deputado centrista, “a atual lei pode pôr em risco a vida de crianças e de mães, ao sobrepor a validação emocional ao conhecimento médico e científico".
Já o PSD, considera que o conceito da atual lei é "excessivamente lato e indesejavelmente vago" e que a sua aplicação "poderia redundar na criação de um inaceitável estigma sobre médicos e profissionais de saúde, incentivando mesmo indesejáveis e perigosas práticas médicas defensivas".
Que dizem os partidos?
O Bloco de Esquerda, o grande responsável pela aprovação desta lei, pronunciou-se através de um vídeo nas redes socias sobre o seu desagrado pelo facto de o Governo ter estabelecido como sua “prioridade, mandar abaixo a lei da violência obstétrica que o Bloco conseguiu aprovar no final da legislatura passada”.
“Não vamos desistir de lutar pelos direitos das mulheres e das grávidas”, garante Joana Mortágua, lembrando ainda que a “episiotomia de rotina, cortes vaginais abusivos considerados violência pela OMS e pela a UE” são praticados em excesso em Portugal.
O PAN, que foi dos primeiros partidos a pronunciarem-se sobre esta situação, propôs o alargamento do conceito legal de violência obstétrica. Para Inês Sousa Real a lei deve passar a incluir a violência psicológica e emocional, a limitação do poder de escolha das mulheres e atos como a administração de fármacos sem consentimento informado.
O PAN pretende também que práticas como a "manobra de kristeller", a administração de fármacos sem informação consentida ou perdas de mobilidade e autonomia, como a "restrição ao leito", sejam incluídos na lista de atos suscetíveis de serem qualificados como violência obstétrica.
Associações criticam e já há petição
Entretanto, 23 associações assinaram um documento, onde consideram que a eliminação da lei, é um ato de “violência institucional” e significa que se está a "ignorar as vozes das mulheres, é proteger práticas desumanas, é perpetuar a normalização do sofrimento".
De acordo com este grupo de associações, da qual fazem parte o Observatório da Violência Obstétrica (OVO) e a União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), a integração do conceito de violência obstétrica foi o resultado de denúncias, estudos, relatórios e, sobretudo do testemunho corajoso de milhares de mulheres que foram silenciadas durante demasiado tempo".
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