Olhando para trás no tempo, António Calaim não tem dúvidas: "A sociedade portuguesa mudou muito, evoluiu, abriu-se e aceitar o diferente hoje é muito diferente do que era há 60 anos ou há 100 anos atrás, em que por vezes até existiram líderes que propagavam essa discriminação".
Mesmo assim, nalguns meios ainda se verifica que as comunidades evangélicas vivem muito centradas sobre si próprias, o que António Calaim diz que "tem a ver com a sociologia, (...) com as tradições, tem a ver com o sentido minoritário, sendo os evangélicos uma minoria, ainda que a principal minoria em Portugal".
Segundo um estudo do antropólogo Alfredo Teixeira e da socióloga Helena Vilaça, "em Lisboa, 05% da população identifica-se como evangélica".
"É uma realidade completamente diferente de uma aldeia ou de uma vila do interior. Mas, este sentido de minoria e de exclusão e de autoexclusão acontece", admite António Calaim, que, nascido em Vila Verde, uma aldeia no concelho de Sintra, era apontado na sua juventude como "o protestante".
Assim, entende que "é muito natural que, sociologicamente, haja uma tendência para as pessoas se refugiarem e se ligarem e viverem" no que se poderia chamar de "cápsula (...) redoma de vidro. Mas isso tem mudado muito".
E 500 anos após a Reforma Protestante, como está o caminho de aproximação à Igreja Católica? A esta pergunta, António Calaim dá uma resposta cautelosa: "Eu diria que o caminho de aproximação entre os cristãos, não só com a Igreja Católica, mas também com a Igreja Ortodoxa Oriental (...) não é fácil, mas tem de assentar na essência e a essência é a pessoa de Cristo e o seu ensino".
"Se nós nos preocuparmos com poder, com glória, com dinheiros ou com pequenas coisas que são as grandes coisas para o mundo das vaidades em que vivemos, nunca encontraremos a união. Nós acreditamos que há uma igreja de Cristo que é universal, onde há pessoas que se dizem ortodoxas, pessoas que se dizem católicas romanas, pessoas que se dizem protestantes, sejam elas anglicanas, luteranas ou presbiterianas ou outro nome qualquer", diz o presidente da Aliança Evangélica Portuguesa, sublinhando, no entanto, não acreditar na ideia de "uma igreja com um nome único, formal, organizacional".
Sobre a ação do Papa Francisco no sentido da unidade entre os cristãos, António Calaim acredita que "os seus anseios e motivos são absolutamente válidos e ele tem dado passos lindos nesta área", mas mostra-se convicto, também, que "muitas vezes o poder das cúrias, das organizações, é muito forte e tem tendência de não permitir que aquilo que existe possa realmente deixar de existir", quando se sabe que "tantas vezes são coisas menos boas".
Mas as diferenças não se encontram apenas entre evangélicos e católicos ou ortodoxos, para se verificarem, também, entre os próprios evangélicos.
A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), que está em Portugal há cerca de 30 anos, ou a Igreja Maná, com origem portuguesa, não integram a AEP e são olhadas com desconfiança por muitos dos evangélicos mais conservadores.
Para António Calaim, "sempre existem pessoas e grupos que (...) avançam por caminhos um pouco mais estranhos e exóticos e que nos parecem, mesmo teologicamente (...) enveredar por caminhos um pouco extemporâneos, um pouco estranhos".
"Se a própria comunidade olha para eles, para estas práticas - e eu estou a falar de práticas um pouco estranhas -, nós devemos ter algumas reservas, porque eu creio que o cristianismo e o evangelho devem ser vividos com tempero, com sal, com luz e não com radicalismos e com extremismos", sublinha o líder da Aliança Evangélica.
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