As sondagens para as presidenciais deste domingo dão a vitória, na primeira volta, ao candidato populista George Simion, líder da Aliança para a União dos Romenos (AUR, segundo maior partido), admirador do Presidente norte-americano, Donald Trump, com quem reclama ter uma linha direta.
Simion reúne o apoio da extrema-direita após o impedimento da candidatura de Calin Georgescu, vencedor da primeira volta realizada em novembro e anulada pelo Tribunal Constitucional por suspeita de interferência russa.
O favorito, segundo as sondagens, tem como ambição criar uma aliança de países MAGA no seio da União Europeia (UE), em homenagem ao slogan de Trump "Make America Great Again".
A Roménia tem um regime semipresidencialista, em que cabe ao chefe de Estado conduzir a política externa.
Para Oana Popescu-Zamfir, diretora do centro de reflexão GlobalFocus Center, sediado em Bucareste, a eleição deste domingo "pode alterar significativamente a posição pró-europeia" da Roménia, membro da UE desde 2007 e um importante aliado na NATO, dada a sua vizinhança da Ucrânia.
A antiga secretária de Estado dos Assuntos Europeus afirma que, neste escrutínio, está em causa um "grande confronto entre os que estão empenhados com a escolha pró-Ocidente e os que procuram transformar a Roménia ao estilo do [primeiro-ministro húngaro] Viktor Orbán ou Donald Trump".
"Receio que este possa ser o percurso do país se vencer alguém que não esteja totalmente comprometido com a agenda pró-europeia", comentou, num debate online promovido pelo conjunto de organizações European Contexts.
Por outro lado, Oana Popescu-Zamfir alerta para a influência de Moscovo.
"A lição para outros países, particularmente na Europa, é a rapidez como se pode deslizar de ser um dos países mais comprometidos com a pertença à UE e NATO, para ser hoje um país considerado internacionalmente como um regime híbrido e com uma democracia semifuncional", sustentou.
"Havia a ilusão de que éramos organicamente anti-Rússia e imunes à manipulação e propaganda russa devido à história atribulada entre os dois países", mas "atores domésticos" passam agora "narrativas anti-Ocidente, que agravam a falta de confiança entre cidadãos e as instituições do Estado, e que fomentam nacionalismos e sentimentos anti-Ucrânia", exemplificou.
A especialista explicou que, no caso da Roménia, a influência russa não funciona de forma tão visível como noutros países, como Moldova ou Sérvia, mas "é muito mais sob o radar".
Oana Popescu-Zamfir identifica uma "mistura tóxica" entre as pressões externas e o facto de uma grande parte da população estar desiludida com a falta de opções políticas, num cenário de grandes desigualdades sociais e de aumento do custo de vida.
"Quando aparece uma figura que personifica toda a nossa raiva e frustrações (...), o facto de nos sentirmos ouvidos leva ao voto de protesto", comentou, afirmando que políticos "populistas e oportunistas" identificaram agora "uma janela de oportunidade para forçar ideias nacionalistas".
A analista de geopolítica Antonia Colibasanu, do Instituto de Investigação sobre Política Externa (FPRI, na sigla em inglês), um grupo de reflexão com sede nos Estados Unidos, concorda que Moscovo "tem todo o interesse em fomentar a instabilidade política na Roménia", o que "perturbaria a capacidade do país para servir de centro logístico fiável e de aliado da Ucrânia".
A NATO mantém uma importante missão no flanco leste da Europa, integrada por militares portugueses, em Caracal, a cerca de 200 quilómetros de Bucareste.
"O apoio a um candidato que defenda um envolvimento reduzido ou nulo na ajuda à Ucrânia, que questione o compromisso da Roménia para com a NATO e a UE e que promova políticas isolacionistas alinha-se diretamente com os objetivos estratégicos russos", defendeu, num artigo de opinião.
Para Antonia Colibasanu, "a paisagem política da Roménia e as vulnerabilidades da sua sociedade criaram um terreno fértil para o extremismo e a propaganda russa".
A passagem de Calin Georgescu e da liberal Elena Lasconi à segunda volta, que se deveria ter realizado em dezembro, "reflete um forte sentimento antissistema, sinalizando a desconfiança generalizada do público em relação à política dominante e às instituições", considerou ainda Antonia Colibasanu.
O especialista em política romena Camil Calus, do Centro de Estudos Orientais, acredita que, independentemente do resultado final destas eleições, os acontecimentos dos últimos seis meses "terão consequências sistémicas e de grande alcance para a paisagem política da Roménia".
"A anulação das eleições presidenciais, seguida da exclusão de Georgescu da repetição do escrutínio - sem uma justificação convincente para qualquer uma das ações - veio corroer ainda mais os já baixos níveis de confiança do público nas autoridades e nas instituições do Estado", refletiu o perito, numa análise publicada na página oficial do instituto.
Estes desenvolvimentos, acrescentou, "aprofundaram o cansaço e a desilusão de longa data da população em relação ao poder político.
"Num futuro próximo, esta situação poderá conduzir a uma remodelação significativa das estruturas de poder da Roménia e, em última análise, contribuir para a retirada da atual elite dirigente do poder", concluiu.
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