Contentores do lixo e pneus em chamas, disparos de gás lacrimogéneo, incluindo granadas, na tentativa de dispersar os manifestantes, que rapidamente se reagrupavam respondendo com o arremesso de pedras e outros objetos é um cenário que se repete em várias ruas, onde é visível a presença, também, de militares.
Um dos desses cenários é na praticamente intransitável avenida Eduardo Mondlane, no coração da capital moçambicana, com vários pneus em chamas, apesar do forte aparato policial no local e os constantes disparos de gás lacrimogéneo que ecoam pela cidade, juntamente com tiros para dispersar, enquanto moradores nas janelas batem panelas em protesto.
A avenida Julius Nyerere, outra artéria central de Maputo, encontrava-se, pelas 13:00 locais (11:00 em Lisboa), encerrada ao trânsito no troço junto à Presidência da República, com a forte presença de militares no local.
Nos bairros da cidade são visíveis grupos desorganizados de manifestantes e dezenas de garrafões de água espalhados pelas ruas, que estes usam para lavar a cara após o lançamento de gás lacrimogéneo.
Durante a manhã, duas lojas -- de mobiliário e de telecomunicações - do centro comercial da marca sul-africana de supermercados Shoprite, na avenida Acordos de Lusaka, também intransitável e envolta num espesso fumo negro, juntamente com a adjacente avenida Joaquim Chissano, foram saqueadas pela população, incluindo crianças, que levaram televisores, telemóveis, impressoras e até frigoríficos, grande parte destes refugiando-se na antiga Praça de Touros da cidade, ao lado, transformada há vários anos em local de habitação.
No local, conforme a Lusa presenciou, um forte contingente policial tentou travar as pilhagens, realizadas segundo os seguranças no local "por mais de 100 pessoas", e perseguiu os autores, tendo sido feitas várias detenções, ao mesmo tempo que era dado tiro pela policia e lançado gás lacrimogéneo no local, enquanto parte recuperavam material saqueado, por entre um chão repleto de caixas de telemóveis abertas, vazias.
Noutro ponto da cidade, depois das 09:00 locais, uma marcha com centenas de pessoas, identificadas como apoiantes do candidato presidencial Venâncio Mondlane - que não reconhece os resultados anunciados das eleições gerais de 09 de outubro -, que convocou estes protestos, empunhando cartazes e tarjas, saiu do bairro da Maxaquene, subúrbios de Maputo, e só foi travada pela polícia à entrada do centro da cidade com a intervenção, repetida, da polícia, que lançou consecutivamente gás lacrimogéneo para os afastar.
A cada intervenção policial, que tinha ainda cordões de segurança com equipas cinotécnicas e militares, para impedir o acesso ao centro, os manifestantes reorganizavam-se e voltavam a tentar progredir, repetindo-se tudo, com arremesso de pedras, ações que provocaram pelo menos um ferido entre a população.
"A polícia não nos vai parar hoje. E não vamos vandalizar nada. Estamos armados? Não estamos armados. Este país é o nosso", afirmava um dos manifestantes, confessando-se cansado de "50 anos de miséria".
"Estamos a perguntar qual é a avenida em que podemos marchar", retorquia, entre declarações aos jornalistas e à polícia, já depois de por dois momentos ter sido usado gás lacrimogéneo para os tentar desmobilizar, com dezenas de disparos.
Antes, cerca das 08:00 locais, noutra artéria de saída do bairro, junto à avenida Joaquim Chissano, a polícia conseguiu demover um pequeno grupo de menos duas dezenas de manifestantes que tentava iniciar a primeira marcha pela cidade.
"O vosso problema é que quando a gente conversa convosco, vocês querem lutar connosco, não é que nós queremos agora. Nós somos todos moçambicanos, estamos a lutar entre irmãos", afirmava o chefe da força policial no local, a apelar à calma e à desmobilização ao "conversar" com os manifestantes, enquanto um grupo da polícia já estava posicionado para travar a eventual progressão.
"O senhor tem altas condições, a população está a sofrer", retorquia, na mesma conversa, um dos manifestantes, antes de o grupo recuar, mesmo que por pouco tempo.
Durante a manhã foi percetível a intenção da polícia de manter os protestos e os manifestantes nos subúrbios, evitando a progressão para o centro, o que acabou por acontecer através de pequenos grupos.
Há relatos destes confrontos, além do centro da cidade, um pouco por todos os subúrbios de Maputo.
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