Diferenças entre Norte e Sul podem ser a 'melhor cola' do projeto europeu

As diferenças entre os países e os povos no interior da Europa podem ser a melhor cola para sustentar o projeto europeu, concordaram os participantes num painel sobre as divisões entre o norte e o sul.

Europa mapa

© ShutterStock

Lusa
07/10/2021 20:18 ‧ 07/10/2021 por Lusa

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"Há diferenças, sem dúvida. Mas somos muito semelhantes na forma como encaramos as diferenças", começou por dizer Mafalda Dâmaso, investigadora de Políticas Culturais no King's College de Londres, uma das participantes num debate hoje organizado pela Universidade Nova de Lisboa e pela Embaixada dos Países Baixos em Portugal, sobre a dicotomia norte/sul na União Europeia.

Matieu Segers, professor de História Europeia Contemporânea e de Integração Europeia na Universidade de Maastricht, concordou e acrescentou que essa postura de acolher as diferenças se salienta no "momento de grandes indecisões" que vivemos.

"Nestas alturas, as pessoas procuram certezas nas memórias coletivas", disse Segers, para explicar a importância da partilha de valores comuns no projeto que a Europa procura construir, agora a 27.

Para João Amaro de Matos, vice-reitor da Nova e professor de Finanças, "a dificuldade por vezes é conseguir que as pessoas consigam falar entre si", referindo o microcosmo da Universidade como exemplo desse género de obstáculos comunicacionais.

As diferenças, procurou explicar Amaro de Matos, resultam da construção de linhas imaginárias, que se produzem no xadrez das relações políticas entre povos e nações.

O vice-reitor da Nova lembrou que Portugal criou, juntamente com a Espanha, uma dessas linhas imaginárias, no século XV, com a assinatura do Tratado de Tordesilhas, "o que na altura levou o Rei de França a soltar uma gargalhada", ridicularizando o simbolismo desses traços invisíveis.

"A verdade é que as linhas imaginárias têm consequências políticas. Por exemplo, é por causa do Tratado de Tordesilhas que no Brasil se fala o português", concluiu Amaro de Matos.

A Europa é feita dessas linhas, mas também se tem afirmado pela forma como atenua fronteiras, em nome de um projeto comum, defendeu Ria Cats, correspondente em Bruxelas do Financieel Dagblad.

"Rapidamente se percebeu que, cada um dos países europeus, não poderia nunca combater a hegemonia da China. Esse esforço terá sempre de ser feito com Bruxelas", disse Ria Cats, referindo que essa polarização face a um inimigo externo acaba por sedimentar as ligações entre os países dentro do espaço comunitário.

Contudo, esse esforço comum é muitas vezes diminuído pelas agendas nacionais, acrescentou a jornalista, salientando as dificuldades que sentem os líderes europeus, que ao mesmo tempo são também políticos nos seus próprios países.

"Se Ursula von der Leyen quiser defender alguma ideia que não seja simpática para a Alemanha, ela será crucificada pelo seu eleitorado nacional", disse Cats, referindo-se aos potenciais dilemas da presidente da Comissão Europeia.

Também por isso, Mafalda Dâmaso defendeu neste painel que a escolha dos eurodeputados não deveria ser feita unicamente em listas nacionais, mas que seria preferível haver listas transnacionais, que permitissem que os eleitores escolhessem os seus representantes comunitários independentemente da sua nacionalidade.

Para a investigadora do King's College, essa opção daria maior liberdade de ação aos membros do Parlamento Europeu na defesa dos valores comuns da Europa, libertando-os das agendas políticas nacionais.

No final do debate, interpretando as ideias da discussão, Pedro Magalhães, cientista político do Instituto de Estudos Sociais da Universidade de Lisboa, lembrou que não há traços de personalidade associados ao clima (mais quente no sul, mais frio no norte) ou associados à distância face ao Equador, mas que há diferenças de perceção, que, muitas vezes, radicam em estereótipos distorcidos.

Pedro Magalhães recordou uma obra do filósofo francês Montesquieu, que atribuía traços de personalidade muito distintos aos europeus do norte (menos desconfiados, mais pragmáticos) e aos europeus do sul (mais preguiçosos, mais passivos), dizendo que essas ideias foram atravessando épocas e sedimentando estereótipos, mesmo que sem qualquer base de suporte científico, permanecendo até hoje e contaminando as discussões políticas.

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