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Argélia: Presidenciais de quinta-feira sob o espetro da abstenção maciça

A campanha eleitoral para as eleições presidenciais previstas para quinta-feira na Argélia, destinadas a designar um sucessor do ex-Presidente Abdelaziz Bouteflika, terminou no domingo após três semanas assinaladas pela rejeição maciça do escrutínio pela população.

Argélia: Presidenciais de quinta-feira sob o espetro da abstenção maciça
Notícias ao Minuto

09:16 - 10/12/19 por Lusa

Mundo Argélia

Perante o 'Hirak', o movimento de contestação que agita a Argélia desde 22 de fevereiro, os cinco candidatos tiveram uma grande dificuldade em divulgar a sua mensagem desde o início da campanha em 17 de novembro, tornando quase impossível designar o favorito de um escrutínio imposto pelos atuais dirigentes interinos e a hierarquia militar.

Ainda na sexta-feira, uma multidão compacta voltou a desfilar em Argel e por todo o país contra o poder e as presidenciais, sob a palavra de ordem "Não ao voto".

Na Argélia, o debate não se centrou nos eventuais favoritos à eleição, mas antes na fratura instalada sobre quem é a favor do escrutínio e quem é contra.

Após ter obtido em 02 de abril a demissão de Bouteflika, no poder há 20 anos e que tinha manifestando a intenção de se apresentar a um quinto mandato, o "Hirak" exige desde então o desmantelamento do "sistema", no poder desde a independência em 1962, e organismos de transição independentes que preparem os atos eleitorais.

O movimento popular, sem uma liderança específica, considera que estas eleições apenas pretendem a "regeneração" de um poder desacreditado e envelhecido, para garantir a sua permanência e manter os seus privilégios.

Ali Benflis, Abdelmajid Tebboune, Azzedine Mihoubi, Abdelaziz Belaid e Abdelkader Bengrina são os cinco candidatos que se apresentam à corrida presidencial.

Três deles ocuparam altas funções na Frente de Libertação Nacional (FLN), com dois a ocuparem o cargo de primeiro-ministro do Presidente deposto.

Com origem na Guerra da Independência contra o domínio colonial da França e partido único durante 25 anos, a FLN apoiou até ao limite um quinto mandato de Bouteflika, que se tornou no seu presidente de honra.

Os outros dois candidatos dirigem dois partidos que apoiaram Bouteflika durante a sua presidência, fornecendo assim todos os argumentos ao "Hirak" para contestar o que designa de "farsa eleitoral".

No seu último discurso, o general Ahmed Gaid Salah, chefe de Estado-Maior das Forças Armadas e que se tem revelado no "homem forte" do país magrebino desde a renúncia de Bouteflika, mostrou-se convicto que "o povo argelino (...) vai empenhar-se neste crucial desafio nacional através de uma participação massiva nas próximas presidenciais, com toda a liberdade e transparência".

Após Bouteflika ter anulado, pouco antes do seu afastamento, as presidenciais previstas para 18 de abril, o novo poder transitório marcou um escrutínio para 04 de julho mas que foi forçado a desconvocar devido à ausência de candidatos.

Agora, o poder optou por não recuar, pressionado pela alta hierarquia militar que pretende ultrapassar rapidamente a crise política e institucional.

No entanto, e com a aproximação do escrutínio, as posições extremaram-se e aumentaram os receios de radicalização nos dois campos.

Nos seus insistentes discursos, geralmente transmitidos em direto pela televisão nacional, o general Gaid Salah elevou o tom dirigido ao "Hirak", associando implicitamente os opositores a "traidores à pátria".

A estratégia do chefe de Estado-Maior, segundo observadores locais citados pela agência noticiosa France-Presse, pode aumentar o "risco de derrapagens" e de violências num contexto onde o poder procura "virar uma parte da população contra a outra", enquanto o "Hirak" sempre reivindicou o seu pacifismo e conseguiu respeitá-lo nas suas fileiras.

No entanto, e durante a campanha, os candidatos depararam-se com uma hostilidade que decerto já previam. Comícios boicotados, faixas eleitorais derrubadas, dificuldades de acesso, sempre com forte presença policial.

De acordo com as organizações de direitos humanos Amnistia Internacional (AI) e Human Rights Watch (HRW), a repressão "intensificou-se" com a aproximação do escrutínio, com "detenções arbitrárias" e a prisão de manifestantes, militantes e jornalistas.

Em salas pequenas e muitas vezes com pouca assistência, os candidatos tentaram em vão convencer do seu apoio ao 'Hirak' e prometendo que iriam aceder às suas reivindicações.

Os cinco concorrentes tentaram ainda persuadir a população a votar na quinta-feira, num país onde a abstenção, encarada como a única forma de contestar um regime anquilosado, foi muito expressiva nos últimos anos.

Na noite de sexta-feira, durante um inédito debate presidencial, os cinco candidatos esforçaram-se por defender os seus programas mas limitaram-se a generalidades e num formato muito controlado, sem verdadeiramente convencerem, ainda segundo analistas locais.

Dois dias depois, o Movimento da Sociedade para a Paz (MSP), o principal partido islamita da Argélia e que decidiu não apresentar candidato às presidenciais, anunciou que não vai apoiar nenhum dos cinco pretendentes.

Em paralelo, era lançada nas redes sociais um apelo à greve geral, mas que na segunda-feira apenas teve expressão significativa da Cabília, e região de maioria berbere da Argélia.

Nas legislativas de 2017, apenas 37% dos eleitores foram às urnas, enquanto a taxa de abstenção nas presidenciais de 2014 rondou os 50%, números provavelmente "empolados", segundo admitiram na ocasião diversos observadores. Agora, a indiferença parece ter cedido lugar à contestação ativa.

Segundo o presidente da Autoridade nacional independente das eleições (ANIE), Mohamed Charif as listas eleitorais incluem 24.474.161 eleitores, incluindo 914.308 inscritos no estrangeiro. Durante a campanha, não foi disponibilizada qualquer sondagem para avaliar a possível participação no escrutínio.

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