"Braço-de-ferro" motivado por reforma judicial marca relação Roménia/UE
A Roménia, país que detém atualmente a presidência rotativa do Conselho da União Europeia e que ambiciona entrar no espaço europeu de livre circulação, enfrenta as eleições europeias sob fortes críticas de Bruxelas devido à reforma do sistema judicial.
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Mundo Europeias
Bucareste mantém um "braço-de-ferro" com Bruxelas devido à reforma judicial promovida pela coligação governamental liderada pelos socialistas do Partido Social-Democrata (PSD) romeno que motivou, entre 2017 e 2018, as maiores manifestações naquele país desde a queda do regime comunista de Nicolae Ceausescu, em 1989.
Apesar de alguns recuos, a coligação governamental de esquerda, liderada pela primeira-ministra, Viorica Dancila, manteve o propósito de avançar com reformas no setor da Justiça e, em abril passado, a chefe de governo anunciava a demissão do ministro da Justiça, acusado de bloquear um conjunto de emendas ao código penal que, segundo a oposição romena, iriam beneficiar responsáveis do partido no poder suspeitos de corrupção.
Um desses casos seria o próprio líder dos socialistas romenos, Liviu Dragnea (que muitos consideram o político mais poderoso do país), impedido de ser primeiro-ministro por ter sido condenado por fraude eleitoral, abuso de poder e investigado por corrupção.
O facto da Roménia deter, pela primeira vez desde a sua adesão à União Europeia (em 2007), a presidência rotativa do Conselho, não tem constrangido a Comissão Europeia (CE) de lançar duras críticas às autoridades romenas.
Foi isso que aconteceu nos últimos dias, com a CE a lançar novamente um sério aviso a Bucareste e ao governo social-democrata no poder: o país arrisca procedimentos e sanções se prosseguir com as reformas que ameaçam, segundo Bruxelas, a independência do sistema judicial e enfraquecem a luta anticorrupção.
"Os problemas que identificámos e as recomendações feitas para aliviar as preocupações não estão a ser levadas em conta", lamentou o vice-presidente da CE (e candidato dos Socialistas Europeus à presidência da CE), Frans Timmermans, numa carta enviada às autoridades romenas a 10 de maio.
A Comissão "não hesitará" em desencadear procedimentos de infração ao abrigo da legislação da UE, o que poderá levar a sanções financeiras, advertiu a missiva, que foi remetida no dia seguinte à cimeira europeia informal na localidade romena de Sibiu, realizada simbolicamente no Dia da Europa (09 de maio).
Timmermans mencionou mesmo a hipótese de acionar um procedimento que permita reagir aos "riscos sistémicos" naquele Estado-membro, nomeadamente quando existem suspeitas de desrespeito dos princípios do Estado de Direito, um dos valores base da União Europeia (UE).
Tal procedimento inclui várias etapas de diálogo com o país em questão, tendo como objetivo evitar a ativação do artigo 7.º do Tratado da UE, que prevê, como sanção máxima, a suspensão dos direitos de voto do Estado-membro em causa no Conselho Europeu.
Este procedimento, de caráter excecional, só foi lançado até agora contra a Polónia e a Hungria.
"Se as melhorias necessárias não forem feitas em breve ou se outras medidas negativas forem tomadas", frisou Frans Timmermans, "a Comissão acionará imediatamente o mecanismo do Estado de Direito".
Na missiva, o "número dois" da CE sublinhou ainda que algumas das reformas em curso poderão garantir a "impunidade" de responsáveis romenos condenados por corrupção.
Uma das muitas ações que causou preocupação em Bruxelas foi o afastamento da magistrada Laura Kovesi, reconhecida pelo trabalho desenvolvido no combate à corrupção (a Roménia continua a ser um dos países mais corruptos da UE, segundo o Índice de Perceção de Corrupção da Transparência Internacional) e a grande favorita para liderar a nova Procuradoria-Geral Europeia.
No início desta semana, o porta-voz do executivo comunitário, Margaritis Schinas, admitiu que a Roménia está cada vez mais perto de ver acionado um procedimento.
Perder a oportunidade de integrar num breve prazo o espaço europeu de livre circulação (espaço Schengen), meta que a Roménia tem procurado ativamente, poderá ser uma das consequências da ativação.
Outra ambição de Bucareste no projeto europeu é conseguir adotar a moeda única europeia (euro) até 2024.
O governo romeno "mina sistematicamente o Estado de Direito com o único objetivo de salvar os líderes políticos corruptos da prisão", declarou, na segunda-feira, um diplomata europeu, citado pelas agências internacionais.
"Se Bucareste continuar neste caminho perigoso, a participação no espaço Schengen continuará a ser uma utopia" e o pagamento de fundos europeus ao país será ameaçado, advertiu a mesma fonte.
Em abril passado, o Partido Socialista Europeu (PSE), principal grupo de centro-esquerda no Parlamento Europeu (PE), decidiu "congelar" as relações com PSD romeno até que a força política clarifique o seu compromisso com o Estado de Direito.
A cerca de duas semanas das eleições europeias, e com 32 mandatos de eurodeputados no PE em jogo, a mais recente sondagem divulgada antevê uma luta renhida entre o Partido Nacional Liberal -- PNL (centro-direita e principal força da oposição romena) e o PSD, com 26,1% e 26,4%, respetivamente.
Resultados que poderão garantir a eleição, para cada uma das forças políticas, de pelo menos 10 eurodeputados.
Para o PSD, este resultado irá representar uma derrota, uma vez que nas eleições europeias anteriores, em 2014, obteve 38% dos votos.
Já a força anticorrupção Aliança 2020 USR-PLUS (conservadores) poderá conseguir 20,1% dos votos, podendo ultrapassar a fasquia de sete representantes.
Ainda não é claro em que grupo parlamentar europeu estes representantes irão sentar-se, mas o líder da Aliança 2020 USR-PLUS, Dan Barna, descreveu a força política como próxima do movimento La Republique En Marche, do Presidente francês Emmanuel Macron, que recentemente apresentou uma aliança de partidos liberais da Europa.
O Pro-Romania, partido do ex-primeiro-ministro e antigo líder do PSD Victor Ponta (que também foi acusado de fraude, evasão fiscal e branqueamento de capitais em 2015) será a quarta força mais votada, com 8,5%, de acordo com as projeções.
A Roménia consta entre os seis países da UE que não têm nos seus sistemas políticos partidos de direita nacionalista ou extrema-direita.
Com cerca de 18,9 milhões de eleitores inscritos, a Roménia vota nas eleições europeias a 26 de maio.
Nas eleições de 2014, a taxa de participação na Roménia foi de 32,4%, abaixo da média comunitária (42,6%).
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