"A Fitch afirmou o 'rating' de Moçambique em B, e removeu o país da Análise de 'Rating' Negativa [Rating Watch Negative - RWN, no original em inglês]; a Previsão de Evolução é Negativa", lê-se no comunicado hoje difundido pela agência de notação financeira.

A análise da Fitch é a primeira a ter em conta os termos da proposta de recompra de dívida da Empresa Moçambicana de Atum (Ematum), que foi apresentada na semana passada pelas autoridades moçambicanas, e que propunha uma extensão da maturidade dos títulos de dívida que fossem trocados por novos títulos, cuja taxa de juro anual passaria de 6,3% para 10,5% ao ano.

A proposta, que tem sido bem recebida pela imprensa financeira internacional e pelos maiores detentores de títulos de dívida da Ematum, convenceu também os analistas da Fitch, que assim optaram por manter o nível de 'rating' do país, que assim consegue evitar uma descida da avaliação do crédito soberano.

A Fitch manteve o 'rating' em 'B', abaixo da escala de investimento, e retirou-o da análise de crédito negativa, o que significa que não deverá mexer na avaliação do crédito soberano de Moçambique pelo menos até final de abril, embora o facto de ter colocado a Previsão de Evolução em Negativa significa que o mais provável é que nos próximos 12 a 18 meses haja uma descida do 'rating' se as condições económicas não se alterarem.

"A retirada do RWN surge na sequência do anúncio de 17 de março sobre os termos finais da troca de dívida para os detentores de títulos da Ematum", uma operação que, "segundo os critérios da Fitch, não constitui uma Troca de Dívida Problemática", acrescenta o comunicado.

No texto, explica-se que "apesar de haver uma redução potencial dos termos comparado com a proposta original, principalmente por causa da extensão das maturidades [de 2020 para 2023], a agência não considera que a troca foi necessária para evitar um incumprimento no pagamento".

Ambas as condições teriam de se aplicar para a Fitch considerar esta proposta como uma Troca Problemática, o que desencadearia automaticamente uma descida do 'rating' do país.

"Apesar de o perfil de crédito de Moçambique se ter enfraquecido ao longo do último ano, a Fitch acredita que o país teria a capacidade e a vontade para continuar a servir as responsabilidades da dívida da Ematum", explicam os analistas, que notam, ainda assim, que seria mais difícil para o país pagar os empréstimos devido à deterioração económica.

"Apesar de os custos da dívida terem duplicado em termos nominais desde o início dos pagamentos da Ematum em setembro do ano passado, Moçambique manteve o nível de pagamento da dívida relativamente baixo, refletindo a natureza altamente concessional [com taxas de juro mais baixas que o mercado] do volume de dívida, que representa 70% do total", diz a Fitch.

"Pelos nossos cálculos, o serviço da dívida pública total chegou a 2,6% do PIB em 2015, o que compara com a média de 5,3% para os países com um 'rating' B", afirmam os peritos da Fitch, notando ainda que o pagamento de juros vale apenas 4,8% das receitas em 2015, o que compara com 15,4% na Zâmbia e 30,6% no Gana.

O escândalo da Ematum envolve uma empresa atuneira detida por várias entidades públicas, incluindo a secreta moçambicana, que se endividou à custa da intervenção do Governo como avalista e à revelia das contas do Estado e dos financiadores externos.

Inicialmente tido como um negócio privado, através de empréstimos de centenas de milhões de dólares para a aquisição de uma frota pesqueira em França, foi recentemente assumido que a Ematum serviu também para a compra de equipamento militar e, por pressão dos países doadores, o negócio acabou por ser inscrito num orçamento retificativo no ano passado.

As contas da Ematum, nomeadamente a emissão de dívida de 850 milhões de dólares com garantia estatal, têm sido recorrentemente apresentadas pelas instituições financeiras internacionais como um exemplo negativo do estado das contas do país, nomeadamente em termos de transparência.

Moçambique é um dos países mais pobres do mundo e está com dificuldades de pagamento da sua dívida devido à descida do preço das matérias-primas e ao abrandamento da China, que originou uma significativa desvalorização do metical no ano passado, o que, por seu turno, encarece ainda mais os pagamentos dos empréstimos contraídos em dólares.