"Procurei com este livro ['A cultura na vida de todos os dias'], contribuir para a reflexão da cultura enquanto um dos elementos essenciais, ao lado da política, da economia, e da religião, na organização das sociedades, da vida pessoal e do modo como se olha para o mundo, mas também no modo como se opera no mundo", disse o autor à Lusa, reconhecendo que "esta maneira de olhar" "não tem sido valorizada, para, realmente, termos um mundo melhor".
Jorge Barreto Xavier descreve o livro como uma reunião de textos seus, escritos desde 2004, "sobre questões de reflexão na área da cultura e das artes", que esteve para publicar quando fez parte do Governo, tendo decidido esperar, porque seriam "avaliados no âmbito da função que exercia".
Barreto Xavier foi secretário de Estado da Cultura do XIX Governo Constitucional, liderado por Pedro Passos Coelho, de 2012 a 2015.
O ex-governante, atualmente professor universitário no ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa, considera que a cultura é um "elemento absolutamente decisivo a tomar em conta na organização da vida em sociedade", e "não pode ser a última das decisões, no âmbito das prioridades de dada comunidade, na política, na economia, na sociedade civil -- é um erro que sai muito caro".
"Facilmente, se olharmos à nossa volta, concluímos sobre o quanto têm de culturais muitos dos antagonismos ou das clivagens mais graves do nosso tempo", dentro da Europa e no resto do mundo, com os fundamentalismos "e no coração de algumas das mais graves crises humanitárias", explica.
Analisando o período democrático, pós-25 de Abril, afirmou que "se verifica, que, de facto, o amor à cultura foi proclamado sistematicamente por todos os governos, independentemente da sua cor política".
"Nas últimas décadas - e não é um problema português, é um problema global -, centrámos as nossas vidas no paradigma da economia, e parece que nos esquecemos de que a economia é um instrumento ao serviço do homem e não o contrário".
"O modo como olhamos para o mundo é que deve estruturar a forma como agimos, e não questões como a rácio entre a produtividade e o consumo ou o Produto Interno Bruto", que são muito importantes e indicadores relevantes, mas não "a única maneira de olhar para as coisas", disse, defendendo que se deve ter antecipadamente "uma ideia de um projeto de sociedade".
E "se não lutamos por essa ideia para lá de uma perspetiva meramente económica, as coisas vão correr mal, e estão a correr mal desde a década de 1960", sustentou.
Nos países da Europa, nos últimos 50 anos, "a distância entre ricos e pobres aumentou e não baixou, apesar de estarmos mais prósperos e isso tem a ver com a maneira como se olha para o mundo e não com a economia".
"O objetivo de uma sociedade justa precisa de uma maior presença da cultura na vida de todos os cidadãos. Este é um desafio paradoxal para o exercício do poder, mas um exercício necessário para o aprofundamento do humano", escreve na nota de abertura do livro, prefaciada pelo presidente do Centro Nacional de Cultura, Guilherme d'Oliveira Martins.
Os 28 textos que constituem a obra são agrupados em duas partes, a primeira, de 2004 a 2011, e, a segunda, durante o período em que Barreto Xavier foi membro do Governo.
"As artes e a cultura no fio da navalha", "A cultura, eixo estratégico", "Estado, artes e organizações não lucrativas", "O subsídio", "A cultura enquanto condição da liberdade" e "As indústrias criativas" são alguns textos da primeira parte do livro.
A segunda parte inclui, entre outros, os textos "Cultura em Portugal: o Estado, as empresas e a sociedade civil", "Identidades e diversidade nas sociedades multiculturais", "Oito séculos de língua portuguesa", "As indústrias culturais e criativas: suporte para o crescimento e emprego", "Direitos de autor na Internet", "A cópia privada", "O lugar da cultura -- a natureza e o humano".
A obra vai ser apresentada em Lisboa, a 06 de abril, no Grémio Literário, por Eduardo Lourenço e Guilherme d'Oliveira Martins.
Seguir-se-ão apresentações em Coimbra, a 07 de abril, no Círculo de Artes Plásticas, pelo ex-ministro da Justiça, Álvaro Laborinho Lúcio e o sociólogo Carlos Fortuna, e, a 08 de abril, na Livraria Lello, no Porto, pelo presidente da Câmara, Rui Moreira, e João Teixeira Lopes, da Universidade do Porto.