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Bienal de Veneza acolhe 90 pavilhões com foco na migração e descolonização

A Bienal de Veneza de Arte anunciou hoje que vai acolher projetos de 90 representações nacionais e obras de 332 artistas numa edição em que a migração e a descolonização são temas-chave, com foco nos criadores indígenas, 'queer' e 'outsider'.

Bienal de Veneza acolhe 90 pavilhões com foco na migração e descolonização
Notícias ao Minuto

23:55 - 31/01/24 por Lusa

Cultura Bienal de Veneza

O programa da 60.ª Exposição Internacional de Arte da Bienal de Veneza, em Itália - cujo tema geral é "Foreigners Everywhere" ("Estrangeiros em todo o lado", em tradução livre) -, que decorrerá entre 20 de abril e 24 de novembro de 2024, foi anunciado numa conferência de imprensa conjunta do presidente da bienal, Roberto Cicutto, e do curador designado pela organização, Adriano Pedrosa, diretor artístico do Museu de Arte de São Paulo (MASP).

"Como princípio orientador, a Bienal de Arte de 2024 privilegiou artistas que nunca participaram numa exposição internacional - embora alguns deles possam ter sido apresentados num Pavilhão Nacional, num evento colateral ou numa edição do século XX", indicou o brasileiro Adriano Pedrosa, o primeiro curador latino-americano deste evento internacional.

Além da representação de Portugal, com o projeto "Greenhouse", sobre os temas da identidade e cultura, das artistas Mónica de Miranda, Sónia Vaz Borges e Vânia Gala, do mundo lusófono estará presente, pela primeira vez, Timor-Leste, com o projeto da artista Maria Madeira "Kiss and don´t tell", com curadoria de Natalie King, sobre a história da luta das mulheres contra a ocupação indonésia.

O Brasil terá o seu pavilhão nacional com "Ka'a Pûera: Somos pássaros ambulantes", num projeto com curadoria de Arissana Pataxó, Denilson Baniwa e Gustavo Caboco Wapichana, com participação dos artistas Glicéria Tupinambá e da Comunidade Tupinambá de Serra do Padeiro e Olivença, provenientes da Bahia, Olinda Tupinambá e Ziel Karapotó.

Da programação da bienal de arte fazem parte as representações nacionais e uma exposição geral para a qual são selecionadas obras de artistas convidados. Este ano, na lista dos 332 selecionados surgem os artistas angolanos Kiluanji Kia Henda, nascido em 1979, Sandra Poulson, nascida em 1995, e os moçambicanos Malangatana (1936-2011) e Bertina Lopes (1924-2012).

Do Brasil, estarão representados na exposição geral artistas consagrados e outros menos conhecidos como Tarsila do Amaral (1886-1973), Candido Portinari (1903-1962), Djanira da Motta e Silva (1914-1979), Emiliano di Cavalcanti (1897-1976), Cícero Dias (1907-2003) e Dalton Paula, nascido em 1982.

O curador-geral indicou, na conferência de imprensa, que o foco principal desta edição serão "artistas que são eles próprios estrangeiros, imigrantes, expatriados, diaspóricos, emigrados, exilados ou refugiados - particularmente aqueles que se deslocaram entre o sul global e o norte global", sendo que "a migração e a descolonização serão temas-chave".

O tema "Estrangeiros em todo o lado", anunciado por Adriano Pedrosa em junho de 2023, já sublinhava que a edição de 2024 seria "uma celebração" do 'outsider', e também das expressões 'queer', "muitas vezes perseguidas ou proscritas", e artistas "à margem do mundo da arte", tal como os indígenas.

Na conferência de imprensa de hoje - a última do presidente Roberto Cicutto, após quatro anos de mandato - foi anunciado que a exposição geral estará dividida num Núcleo Contemporâneo e num Núcleo Histórico, e será dada especial atenção a projetos ao ar livre, nas zonas do Arsenale e Giardini, com um programa de performances que será criado para a abertura e encerramento da bienal.

O título da 60.ª Exposição Internacional da Bienal de Veneza é retirado de uma série de obras realizadas pelo coletivo Claire Fontaine, nascido em Paris e sediado em Palermo, desde 2004 - cujo trabalho foi exposto nas Galerias de Lisboa em 2019 - e que consistem em esculturas de néon em diferentes cores que reproduzem em várias línguas a frase "Estrangeiros em todo o lado".

A frase, por sua vez, tem origem no nome de um coletivo de Turim, Stranieri Ovunque, que lutou contra o racismo e a xenofobia em Itália, no início dos anos 2000, recordou Pedrosa, acrescentando que existem atualmente cerca de 53 línguas na série de esculturas em néon de Claire Fontaine, ocidentais e não-ocidentais, incluindo várias línguas indígenas, "algumas das quais estão, de facto, extintas".

Estas frases serão expostas na Bienal de Arte deste ano numa nova instalação de grande escala nos estaleiros navais de Gaggiandre, no Arsenale, para abordar "um mundo repleto de crises multifacetadas relativas à deslocação" de pessoas através de países, territórios e fronteiras, "refletindo os perigos e as armadilhas da língua, da tradução, da nacionalidade", e exprimindo "diferenças e disparidades condicionadas pela identidade, nacionalidade, raça, género, sexualidade, liberdade e riqueza".

O Núcleo Contemporâneo irá focar-se na produção de artistas 'queer', "muitas vezes perseguidos e excluídos", o artista 'outsider', "colocado nas margens do mundo da arte, muitos deles autodidatas ou da arte popular", e o artista indígena, "tratado como um estrangeiro na sua própria terra".

Sobre os artistas indígenas, destacou a "presença emblemática" de uma obra de grandes dimensões no Pavilhão Central do certame, onde o coletivo Mahku, do Brasil, irá pintar um mural na fachada do edifício, enquanto o coletivo Maataho, da Nova Zelândia, apresentará uma instalação em grande escala.

O curador-geral da Bienal de Veneza disse que, a nível pessoal, se sente implicado em muitos dos temas desta exposição: "Vivi no estrangeiro e tive a sorte de viajar muito durante a minha vida. No entanto, experimentei muitas vezes o tratamento reservado a um estrangeiro do Terceiro Mundo - embora nunca tenha sido um refugiado e, de facto, possua um dos passaportes mais bem classificados do sul global".

"Também me identifico como 'queer' - o primeiro curador abertamente ´queer´ na história da Bienal de Arte. Além disso, venho de um contexto no Brasil e na América Latina, onde o artista indígena e o artista popular desempenham papéis importantes. Embora tenham sido marginalizados na história da arte, recentemente passaram a receber mais atenção", avaliou.

Adriano Pedrosa recordou que "o Brasil também abriga muitas diásporas, uma terra de estrangeiros, por assim dizer: além dos portugueses que invadiram e colonizaram o país, o Brasil abriga as maiores diásporas africana, italiana, japonesa e libanesa, italiana, japonesa e libanesa do mundo".

Em resposta a questões formuladas na conferência de imprensa sobre os artistas selecionados, muitos deles nascidos antes e durante o século XX, o curador disse: "A maioria destes artistas são apresentados pela primeira vez no século XXI. É uma dívida que espero ser paga" na 60.ª Exposição Internacional de Arte da Bienal de Veneza.

Leia Também: Maria Madeira, a 1.ª artista timorense a participar na Bienal de Veneza

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