Encenado por Chela de Ferrari, que também assina a dramaturgia, o espetáculo apresenta-se no Teatro Nacional São João, no Porto, às 21:00 de sexta-feira e às 19:00 de sábado.
"O nosso 'Hamlet' é uma versão livre. É um tecido cosido entre a vida dos atores, os seus interesses e reinvindicações, perguntas e reflexões, com o texto de Shakespeare", diz a encenadora, em entrevista à Lusa.
Para "repotenciar o texto de Shakespeare, dar uma nova leitura" a uma das obras dramáticas mais célebres da História, a famosa pergunta "ser ou não ser", do solilóquio do protagonista homónimo do espetáculo, guia também a experiência do elenco.
Pelo caminho, foram encontrando "várias conexões" entre personagens e vivências pessoais, da relação amorosa entre Ofélia e Hamlet, "um amor sempre supervisionado pela família", e usaram de "muita liberdade" ao adaptar os acontecimentos, mesmo a narrativa.
"Usamos a obra com muita liberdade, o que nos serve para contar a história que nos interessa. São oito pessoas com síndrome de Down e muito a dizer. Então, as relações são várias durante este processo de mais de um ano de trabalho. Os atores tornaram-se especialistas em cada personagem, de acordo com a sua própria história", conta Chela de Ferrari.
Segundo a encenadora, todas as pessoas são Hamlet a cada dado momento do espetáculo, além das personagens que ocupam, como Octavio Bernaza, que "desde o início queria ser o vilão" Cláudio. Há também uma sequência criada especificamente para dar voz a três Ofélias que partilham "os seus sonhos".
"Hamlet", a tragédia do Príncipe da Dinamarca, é uma das mais influentes obras dramáticas e um dos textos mais representados de William Shakespeare, mostrando a sua luta para se vingar do tio, Cláudio, que lhe assassinou o pai para chegar ao trono e casar com a sua mãe.
Antes dos ensaios, a investigação acabou guiada por Jaime Cruz, um dos atores em palco que acabou por ser a semente do espetáculo.
"Jaime trabalhava no Teatro La Plaza, entregava as folhas de sala. O seu sonho era atuar naquele palco como ator. Eu tinha o desejo de fazer 'Hamlet', e não encontrava atores. Até que me encontro com esse sonho de Jaime. Vamos tomar um café e aí Jaime confronta-me com os meus preconceitos, a minha ignorância, quanto à sua condição, e também quanto à minha própria condição", revela a encenadora.
Este encontro acabou por dar o mote ao processo que levou à criação e produziu "um profundo desejo de intercâmbio" de experiências.
"Creio que o que vive o público é um espelho deste primeiro encontro. É um público que se confronta com os seus preconceitos, confronta com a sua ignorância, mas que sente um grande desejo de intercâmbio. Foi o que pude comprovar em cada apresentação que já fizemos", remata Chela de Ferrari.
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