"O bipartidarismo vive para satisfazer os que se penduraram no sistema"

O líder do recém-criado Partido Liberal Social é o entrevistado desta quinta-feira do Vozes ao Minuto.

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© José Cardoso

Andrea Pinto
08/05/2025 09:18 ‧ há 4 horas por Andrea Pinto

Política

José Cardoso

Foi precisamente no dia 11 de março, dia da queda do Governo de Luís Montenegro, que o Partido Liberal Social foi oficialmente criado no nosso país.

 

Liderado por José Cardoso, antigo candidato à liderança da Iniciativa Liberal, o partido viu-se numa corrida contra o tempo para se preparar para as eleições legislativas, já este mês de maio.

Reconhecendo que o tempo tem sido pouco para criar grandes expetativas sobre os resultados das eleições, o líder do partido revela que o seu grande objetivo é "apresentar-se ao mundo" como uma solução governativa que faça frente ao bipartidarismo português.

Conheça na entrevista que se segue, o mais recente partido nacional e que vai a votos pela primeira vez a 18 de maio.

Queremos ser alternativa ao bipartidarismo

O Partido Liberal Social vai surgir pela primeira vez no boletim de voto dos portugueses nestas eleições legislativas. Intitulam-se como os ‘Agentes da Mudança’. O que ambicionam mudar no país?

Nós estivemos um ano a preparar o projeto para identificar o posicionamento liberal que fazia falta em Portugal. No Parlamento, existem quatro partidos socialistas e em todas as áreas ideológicas há diferentes tendências e nós trazemos aquela que é designada de liberalismo social.

A tendência liberal social, pragmática, é orientada muito mais para a governação. Se olharmos para o espetro político português, vemos que há um bipartidarismo que, após o 25 de Abril, talvez tenha sido importante para trazer estabilidade política, mas nos últimos 20 anos deixou de ser uma solução, de fazer inovação… E acho que é aí que podemos ocupar o nosso espaço. Um partido de governo, ou partido capaz de ser alternativa ao bipartidarismo, que é focado no cidadão.

O liberalismo é uma ideologia que põe a liberdade individual de cada pessoa à frente da pessoa coletiva. Social porque acreditamos que só há liberdade individual quando há igualdade de oportunidades. E depois, somos ecologistas porque daqui a 20/30 anos este será o grande tema da gestão, da gestão política, da economia. É esta oferta que fazemos, que achamos diferenciada.

O rosto de José Cardoso não é, porém, desconhecido dos portugueses dado que foi candidato à liderança da Iniciativa Liberal. De que forma é que este projeto se distingue daquele que tinha para a Iniciativa Liberal?

Distingue-se bastante. Nós queremos ser alternativa ao bipartidarismo e fomos procurar uma nuance de liberalismo - como há várias, tal como há várias do socialismo - que não existe ainda em Portugal.

Carlos Guimarães Pinto, que é o líder ideológico da Iniciativa Liberal, escreveu há dois ou três meses que a Iniciativa Liberal não era iniciativa social, e também temos o Luís Montenegro que diz várias vezes que não é liberal. Se um não é social e o outro não é liberal, então nos somos as duas coisas. Somos uma corrente liberal social como existe na Europa, basta olhar para os países mais desenvolvidos do mundo em que há partidos que representam esta ideologia, como a Holanda, Dinamarca, Suíça. Parece-me a mim que faz sentido ter uma solução que se aproxima dos países que nos servem de referência.

Em 2024 dizia não acreditar na queda do Governo e que o PLS iria a votos pela primeira vez nas eleições autárquicas. Um ano depois, aconteceu o contrário. Quais são as expetativas para um partido que acaba de ser criado e que está a preparar esta campanha em contrarrelógio?

Tem sido uma loucura porque, realmente, acho que não era só eu, nenhum português imaginava que o governo pudesse cair nestas condições. Estávamos preparados, efetivamente, para fazer o trabalho autárquico e tem sido difícil porque nós fomos reconhecidos como partido no dia 11 de março, precisamente no dia em que cai o Governo. Não sei se é um bom presságio ou não.

Temos trabalhado, efetivamente, em contrarrelógio e mesmo assim conseguimos fazer a inscrição em cinco círculos eleitorais. Vamos a votos em Lisboa, Porto, Setúbal, Europa e fora da Europa, o que representa mais de 80% da população portuguesa. O nosso programa eleitoral é composto por 12 paradigmas para mudar a sociedade portuguesa, na procura de um posicionamento liberal social. Vamos fazer uma campanha modesta mas determinada para explicar estas 12 ideias, na expetativa de que os portugueses nos fiquem a conhecer. Vamos a campanha para nos apresentar ao mundo.

Em relação a essas 12 ideias de que fala, consegue resumir-nos qual a posição do partido em relação aos principais sectores que preocupam a nossa sociedade atualmente? O que gostariam de mudar na Saúde, Habitação, Defesa…

Nós optamos por não fazer um programa setorial no sentido de falar de todas as áreas até porque temos um programa político, aprovado em convenção nacional, que fala de todas as áreas setoriais, e que expressa o nosso entendimento político. Assim, achámos que no programa eleitoral fazia mais sentido mostrar que mudanças paradigmáticas é que o país precisa. Foi assim que foi desenhado. Foram feitas cinco prioridades e, dentro dessas, há 12 ideias. As políticas públicas são uma dessas cinco prioridades.

[O programa] não incide diretamente sobre Energia, Educação ou Transportes, mas fala de mudança paradigmática, de como o Estado se relaciona com a sociedade e com os mercados, e no sentido de transformar o Estado em intervencionista, num Estado regulador e eficiente para dar energia, liberdade, para gerir com eficácia, eficiência, digitalizado, rápido. É esse o papel que deve caber ao Estado.Está na altura de fazer uma reformas significativas e não estar preocupado em satisfazer o público A, B ou C. Os partidos novos têm que ser reformistas e ser capazes de apresentar alguma coisa nova ou uma mudança, caso contrário estagnamos.Diria que este programa, e que o própria partido, visa captar um público mais jovem ou uma população mais adulta?

Não estamos muito preocupados com a faixa etária. Estamos muito contentes porque na adesão ao partido temos pessoas de várias idades, portanto ele representa um espetro da população portuguesa: não é muito jovem mas também não é de pessoas mais velhas. Está muito bem distribuído o que é muito importante e é feito numa ótica de apresentar o que temos de mudar.

Está na altura de fazer uma reformas significativas e não estar preocupado em satisfazer o público A, B ou C. Os partidos novos têm que ser reformistas e ser capazes de apresentar alguma coisa nova ou uma mudança, caso contrário estagnamos.

E com tão pouco tempo de preparação da campanha, quais as expetativas para os resultados no dia 18 de maio?

Um partido como o nosso, que tem 70 dias, não se foca nas expetativas mas na qualidade daquilo que está a fazer para que o maior número de pessoas que contactemos valorizem o que fizermos. Estamos muito mais focados nisso. Não podemos ter grandes expetativas pelo tempo que temos, em que muitas pessoas nem vão saber quem somos. Os partidos pequenos não têm direito a subvenção direta e também não têm direito a canais de comunicação. Logo, temos uma visibilidade inferior. Não podemos ter expetativas nenhumas e também estamos a jogar com tão pouco tempo em tudo que não temos tempo para pensar nisso. Estamos só focados em tentar fazer o que conseguirmos até ao dia 18. Logo veremos no dia.

O bipartidarismo vive, neste momento, em passo de sobrevivência e para satisfazer todos os que se penduraram no sistema que eles próprios criaram. Estão reféns disso e não vão reformar nem mudar nada. Fazem propaganda a explicar como tudo esta fantástico quando o país a cada ano que passa está mais pobre.Aquando da formação do partido, dizia que o seu objetivo era ter um partido com “pessoas dispostas a governar e não apenas a criticar”. A política portuguesa padece muito deste problema?

Padece imenso desse problema. O bipartidarismo vive, neste momento, em passo de sobrevivência e para satisfazer todos os que se penduraram no sistema que eles próprios criaram. Estão reféns disso e não vão reformar nem mudar nada. Fazem propaganda a explicar como tudo esta fantástico quando o país a cada ano que passa está mais pobre.

A geração do meu pai conseguiu acumular riqueza, a minha geração vive à conta da riqueza dos nossos pais, os nosso filhos emigraram e a pergunta é: e a próxima geração, como é?

Aquilo que acontece com o bipartidarismo é o que nos levou aqui nos últimos 30 anos. Os outros partidos preferem ser ideologicamente perfeitos ou serem partidos de protestos permanente, sempre a dizer a mesma coisa, a serem repetitivos. Falta aqui partidos de governo, partidos não de protesto mas pragmáticos, de gestão, que olham para a razão, para a eficiência, para os exemplos práticos.

Vou dar um exemplo concreto: a justiça não é de esquerda nem de direita. A justiça é a base de uma sociedade livre, faz parte da separação de poderes, e está uma desgraça total, o que leva ao descrédito das instituições, e é o que leva aos extremismos. Não era altura de, uma vez por todas, os partidos se tentarem, eventualmente até desistindo de outras coisas, de resolverem juntos os problemas da justiça a bem de todos os portugueses? Se os partidos não são capazes de se sentarem e resolverem os problemas em conjunto, é porque já não são solução.

Quando digo que faltam partidos de governo é isto, partidos que resolvam problemas. Partidos que deixem de pensar nas suas ideologias para resolver os problemas. Há questões que são ideológicas mas muitos problemas não o são. São de gestão, de eficiência, de eficácia. É por isso que muitas vezes puxo esse problema de partidos de governo com pessoas dispostas a trabalhar.

Prevê que o bipartidarismo vá voltar a marcar estas eleições? Como é que se combate isso?

Com partidos que deem confiança às pessoas, porque as pessoas só vão abandonar o bipartidarismo quando houver partidos que demonstrem que estão à altura de governar, que são responsáveis, que estão dispostos a cometer erros, porque governar implica que às vezes as coisas corram bem e outras vezes corram mal. Os perfecionistas de ideologias que dizem que são perfeitos e que os outros estão todos errados, não querem governar porque a gente sabe que o são. Ninguém é perfeito. No fundo, estamos aqui a criar um partido de pessoas imperfeitas dispostas a governar. E estes partidos pequenos tem medo de perder as suas claques e cometer erros. Nós não. Não vale a pena acrescentar mais um partido, já existem 24, a dizer que é perfeito. 

Lamentavelmente, o bipartidarismo está outra vez no centro e a nossa voz não é forte mas começa aqui. Queremos ser um partido sério que quer governar.

Só no dia em que estes partidos do bipartidarismo tiverem de fazer governação com outros partidos mais pequenos é que as coisas vão começar a mudar. Só os partidos pequenos podem impor reformas.

E o país o que ganha com tantos partidos pequenos?

Havendo espaço para apresentar as suas ideias, não vejo nenhum problema. Se as pessoas não gostam deles, não votam neles. Não há problema nenhum. Os portugueses também não pagam as subvenções aos partidos portanto não há grande problema para o Estado. As ideias são minoritárias, mas amanhã são maioritárias. Se olharmos para outros países da Europa, muitos dos partidos do bipartidarismo, que também existiu por toda a Europa, neste momento desapareceram. Só Portugal e Espanha é que ainda têm este regime. Os outros países não. Nos outros países até é normal haver governos de três partidos em conjunto. Acho que o que vai acabar por acontecer em Portugal é isso. É uma mudança e só nesse dia em que estes partidos do bipartidarismo tiverem de fazer governação com outros partidos mais pequenos é que as coisas vão começar a mudar. Só os partidos pequenos podem impor reformas.

Olhando para o caso da Iniciativa Liberal, na altura em que se candidatou à liderança do partido, dizia que o objetivo era tornar a IL no 3.º grande partido português. Como analisa o percurso que o partido, agora liderado por Rui Rocha, tem vindo a fazer?

Prefiro não comentar porque não quero de nenhuma forma estar relacionado com o partido em que estive. Neste momento não me merece nenhum comentário.

Por fim, qual a posição do PLS em relação ao aumento de movimentos extremistas a que temos assistido?

Acho que as pessoas acabam por aderir a esse tipo de coisas por dois motivos. Primeiro, por perderem a esperança no sistema. É preciso que o sistema funcione para que as pessoas vejam um sistema democrático e optem pela tolerância. E depois há muita exploração através das redes sociais. Se olharmos, a grande maioria das pessoas não é extremista mas o que ocupa as televisões é o extremismo. Se fizermos uma sondagem, se calhar 80% das pessoas não dá para esse peditório, mas como tudo o que aparece na TV é este extremismo… É lamentável que se dê mais visibilidade ao extremismo do que à moderação, à tolerância. Mas as pessoas terão que aprender com isso. Há muitos interesses para explorar o extremismo nas pessoas.

Educação e literacia digital talvez seja a forma de as pessoa saberem distinguir o que é informação do que é propaganda. Talvez seja esse o caminha: muita educação. A educação para o digital é um caminho fundamental.

Nunca houve nenhum país que melhorasse pela aplicação de ideias extremistas, seja de esquerda ou direita ou de outra ideologia. É preciso apelar às pessoas que olhem para isto e lembrá-las que, independentemente desta instabilidade,  temos que nos manter dentro daquilo que são os novos valores democráticos, liberais, separação de poderes, com respeito pelas instituições, respeito pela justiça, e escolher os melhores deputados possíveis.

Não falamos de extremismo no nosso programa eleitoral porque também não queremos dar para esse peditório mas falamos de reforço da democracia que é o que é importante. Solidez da justiça e revisão do sistema eleitoral.

Leia Também: Recenseados em Portugal deslocados no estrangeiro votam a partir de hoje

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